Luciano Guimarães França[1]
RESUMO: Este artigo tem como objetivo analisar a distribuição dos valores do ICMS para os municípios do Estado de Minas Gerais, com base na Lei Robin Hood. Tal lei tem como propósito a distribuição de tal recurso de uma maneira mais justa, igualitária e coesa, de acordo com alguns critérios específicos. O foco principal deste trabalho será analisar, especificamente, a distribuição do ICMS turístico, embasado na Lei supracitada. A lei existe e está em vigor desde o ano de 2010, e aqui será analisada sua eficácia e aplicabilidade.
Palavras-chave: ICMS. ICMS turístico. Lei Robin Hood. Incentivo fiscal. Distribuição de renda.
Área de Interesse: Direito Tributário
1 INTRODUÇÃO
Na organização de um país, pode ser verificada a importância dos municípios, tanto no que diz respeito à descentralização do poder estatal, quanto aos investimentos econômicos do país. Quando se trata do repasse do ICMS, este é definido pela Constituição de 88, mas cabe a cada Estado estipular a forma como será realizado esse repasse.
De acordo com o art. 158 da Constituição de 88:
Art. 158. Pertencem aos Municípios:
IV – vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. (BRASIL, 1988).
Considerando a extensão geográfica e grande diversidade do Estado de Minas Gerais, pode-se perceber que não poderia haver tal divisão de recursos de maneira igualitária entre os municípios, bem como não se poderia considerar pura e simplesmente a população como critério para tal divisão.
Assim, surgiu a Lei Robin Hood, como proposta de solução para a divisão de recursos de uma maneira mais justa e considerando critérios de suma importância. São, ao todo, dezoito critérios, definidos através da Lei Estadual nº 18.030, de 12 de janeiro de 2009, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 2010.
A Lei Hobin Hood e a repartição que é dada pela cota-parte do ICMS aos municípios, tem como objetivo primordial a descentralização das rendas, no intuito de obter cidades menos dependentes economicamente, proporcionando, dessa maneira, uma melhora na qualidade de vida de suas populações. Além de incentivar o aumento da arrecadação dos municípios e otimizar a aplicação de recursos em determinadas politicas sócias, dantes nem sempre focadas.
O presente trabalho tem como objetivo geral a análise da Lei Robin Hood, e como objetivos específicos identificar e criticar sua aplicabilidade e funcionalidade prática. Este estudo se justifica pela pouca discussão sobre o tema, que é de fundamental relevância para o aumento na receita dos municípios, bem como a otimização do turismo regionalizado no Estado de Minas Gerais. Foi utilizada a metodologia de pesquisa bibliográfica.
Segundo Marconi e Lakatos (1992),
[…] a pesquisa bibliográfica permite compreender que, se de um lado a resolução de um problema pode ser obtida através dela, por outro, tanto a pesquisa de laboratório quanto à de campo (documentação direta) exigem, como premissa, o levantamento do estudo da questão que se propõe a analisar e solucionar. A pesquisa bibliográfica pode, portanto, ser considerada também como o primeiro passo de toda pesquisa científica. (p. 44)
2 ICMS
Ao analisar a cobrança de impostos, pode-se perceber ao longo de toda a história que os impostos sempre existiram, eles apenas tiveram diversas nomenclaturas ao longo dos séculos.
Ao tratar especificamente do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), pode-se perceber que vem de longa data sua instituição, tanto dentro quanto fora do Brasil,
O tributo, como se conhece hoje, foi instituído na Grécia. Na Roma antiga já se cobravam impostos em virtude da importação de mercadorias e pelo consumo de qualquer bem. Com o passar do tempo, os tributos passaram a ser exigidos pelo Estado compulsoriamente como meio de manutenção de sua estrutura e visando prestar serviços de utilidade pública à população. (MASCARENHAS, 2004, p. 10).
No Brasil, por exemplo, a história do ICMS segue a seguinte ordem cronológica, mencionada por Flávio Diamante (2013):
Como impostos incidentes sobre vendas de mercadorias ao longo do século XX, se sucederam o IVM (Imposto sobre Vendas Mercantis de 1922 a 1936), o IVC (Imposto sobre Vendas e Consignações de 1936 a 1965), e o ICM (Imposto sobre Circulação de Mercadorias de 1965 a 1989). Na senda da TVA o ICM, lembrando a expansão do IVM para IVC, com a inclusão das consignações, encampou alguns serviços não listados para incidência municipal, tomando a forma atual de ICMS. (DIAMANTE, 2013).
O ICMS conhecido e em prática atualmente no Brasil, sofreu alterações através da Constituição de 88, dentre as quais, o percentual de repasse aos municípios passou de 20% para 25%, e aumentou sua incidência com a inclusão de cinco novos impostos únicos pertencentes à União, a saber: minerais, combustíveis e lubrificantes, energia elétrica, serviços de transporte e serviços de comunicação.
A competência de arrecadação e legislação não mudou, ou seja, continuou a cargo do Estado.
Porém, mesmo a cargo do Estado, necessário se fazia uma regulamentação, concedendo maior justiça e critérios mais clarividentes na divisão de tais recursos. Daí o surgimento da lei denominada Lei Robin Hood, com nome sugestivo, ela foi implementada através da Lei Estadual nº 18.030, conforme supracitado.
3 LEI ROBIN HOOD
De acordo com a Constituição de 88, o Estado tem direito a 25% dos recursos de ICMS, cabendo-lhe a melhor forma de divisão dos recursos.
A Lei Robin Hood, instituída em Minas Gerais desde o ano de 2009, com vigor a partir de 2010, determina a dinâmica de distribuição da cota-parte dos recursos de ICMS entre os municípios mineiros. Dinâmica esta que, segundo a Lei 18.030/09, se dará de acordo com dezoito critérios, quais sejam:
I – Valor Adicionado Fiscal – VAF -: valor apurado com base nos critérios para cálculo da parcela de que trata o inciso I do § 1º do art. 150 da Constituição do Estado;
II – área geográfica: relação percentual entre a área geográfica do Município e a área total do Estado, informadas pelo Instituto de Geociências Aplicadas – IGA -;
III – população: relação percentual entre a população residente no Município e a população total do Estado, medida segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE -;
IV – população dos cinqüenta Municípios mais populosos: relação percentual entre a população residente em cada um dos cinqüenta Municípios mais populosos do Estado e a população total desses Municípios, medida segundo dados do IBGE;
V – educação;
VI – produção de alimentos;
VII – patrimônio cultural: relação percentual entre o Índice de Patrimônio Cultural do Município e o somatório dos índices de todos os Municípios, fornecida pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico – IEPHA -, observado o disposto no Anexo II desta Lei;
VIII – meio ambiente;
IX – saúde;
X – receita própria: relação percentual entre a receita própria do Município, oriunda de tributos de sua competência, e as transferências de recursos federais e estaduais recebidas pelo Município, baseada em dados relativos ao segundo ano civil imediatamente anterior ao do cálculo, fornecidos pelo Tribunal de Contas do Estado;
XI – cota mínima: parcela a ser distribuída em igual valor para todos os Municípios;
XII – Municípios mineradores: percentagem média do Imposto Único sobre Minerais – IUM – recebido pelos Municípios mineradores em 1988, com base em índice elaborado pela Secretaria de Estado de Fazenda, demonstrando a efetiva participação de cada um na arrecadação do IUM naquele exercício;
XIII – recursos hídricos;
XIV – Municípios sede de estabelecimentos penitenciários;
XV – esportes;
XVI – turismo;
XVII – ICMS solidário;
XVIII – mínimo per capita. (MINAS GERAIS, 2009).
Os critérios supracitados visam dividir ordenadamente os 25% do montante arrecadado de ICMS pelo Estado, de acordo com a necessidade e demanda de cada setor dentro do município.
O foco de estudo deste artigo é a cota-parte definida no inciso XVI, turismo, denominada ICMS Turístico.
4 ICMS TURÍSTICO
A definição de uma cota-parte para o turismo, definida pela Lei Robin Hood motivou os municípios a desenvolverem mais e melhor seu potencial turístico, pois com isso cada município precisa se habilitar para receber tal cota, como define a lei em seu art. 9, § 1º:
§ 1º Para se habilitar à participação no critério “turismo”, o Município deverá:
I – participar do Programa de Regionalização do Turismo da SETUR;
II – elaborar uma política municipal de turismo;
III – constituir e manter em regular funcionamento o Conselho Municipal de Turismo e o Fundo Municipal de Turismo. (MINAS GERAIS, 2009).
Desta forma, os municípios sentem-se mais motivados a incentivar o turismo e aplicar os recursos de acordo com a política municipal apresentada.
Além disso, com a redistribuição da cota-parte do ICMS, municípios, muitas vezes, ricos em turismo, recebiam pouco por possuir uma população menor que outros municípios com população maior, mas sem nenhum atrativo turístico.
Conforme bem colocado por Rodrigo Moreira Magalhães (2008), antes da Lei 18.030,
[…] a maior parte dos repasses era revertida aos municípios mais desenvolvidos, que tinham uma atividade econômica mais intensa e, consequentemente, um VAF mais elevado. Com isso, o repasse do ICMS era mal distribuído, sendo, a maior parte, destinado a poucos municípios. (p. 25).
Com o critério turístico, que passou a destinar parte da verba do ICMS a partir de 2011, os municípios menos favorecidos foram os mais beneficiados, trazendo, assim, mais recursos, e com uma aplicação destes recursos já definida e mais direcionada, ou seja, os recursos podem ser aplicados em programas, ações e projetos direcionados para o desenvolvimento turístico dos municípios.
De acordo com a Secretaria de Estado de Turismo de Minas Gerais, houve um aumento de 88% (oitenta e oito por cento) no número de municípios habilitados para o recebimento da parcela do ICMS Turístico em 2013, se comparado com o ano imediatamente anterior:
O Governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Turismo, divulga, nesta quinta-feira (08/11), listagem referente aos municípios habilitados a receberem parcela do ICMS Turístico, com base na arrecadação estadual de 2013. Neste ano, 119 municípios estão habilitados a receber o repasse em 2013, no ano passado foram 63 cidades, o que demonstra um crescimento de mais de 88%. (MINAS GERAIS, 2012a).
Pode-se perceber, assim, o quanto esta parcela é relevante para o enriquecimento do turismo regionalizado dentro do Estado de Minas Gerais, e o quanto o Governo está empenhado em fazer com que a cada ano maior número de municípios receba o benefício,
De acordo com o secretário de Estado de Turismo, Agostinho Patrus Filho, Minas continua dando exemplo de descentralização de recursos e de execução de política pública na ponta. “Queremos dar oportunidade a todos os nossos municípios de se beneficiarem com o ICMS Turístico e fomentarem o desenvolvimento da atividade em suas regiões. Os municípios detêm o conhecimento de suas reais necessidades e sabem quais ações o benefício será melhor aplicado para o desenvolvimento do turismo”, afirma o Secretário. (MINAS GERAIS, 2012b).
Em números, o Turismo no Brasil representa, hoje, 3,6% (três vírgula seis por cento) do PIB Nacional, enquanto em países, em crise, como Portugal, o turismo representa 11% (onze por cento) do PIB, ou a Espanha, onde o PIB Turístico também representa o mesmo índice, ou seja, 11% (onze por cento). (GIRALDI, 2011).
Assim, pode-se perceber que, se o turismo pode ser a solução para resgatar a economia de um país, ele pode ser, também, a solução para um país otimizar suas receitas, atraindo cada vez mais turistas, o que seria possível através de mais investimentos no setor.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Lei Robin Hood é um grande passo para o incentivo turístico regionalizado em Minas Gerais, especialmente por ser o Estado pioneiro na inclusão do critério Turismo no ICMS (MINAS GERAIS, 2012a).
Devido ao seu teor mais justo e igualitário ao tratar a divisão do recurso objeto deste estudo, a Lei Robin Hood trouxe inovação e incentivou os pequenos, e menos favorecidos, municípios a buscarem mais recursos, atendendo aos critérios estabelecidos, ou seja, perceberam que só dependia deles.
Todas as vantagens trazidas pela lei são muito validas, no entanto, ainda há muito que percorrer para que o Turismo tenha, de fato, todo o seu potencial explorado não somente em Minas Gerais, mas no Brasil como um todo. O investimento turístico no Brasil ainda é baixo, se comparado a outros países com potencial turístico, às vezes nem tão forte quanto o Brasil, como pode ser observado no capitulo anterior.
Fica, então, a percepção de que a Lei Robin Hood foi o primeiro passo, mas não se deve cair no conforto da situação, pois se ainda há o que trabalhar e buscar, isto deve ser feito, para que a receita do país seja cada vez maior, pois com isso haverá geração de emprego e renda, e, consequentemente, uma melhora na qualidade de vida de cada morador, de cada município, independente do quantitativo populacional.
REFERÊNCIAS
ARANHA, Luiz Ricardo Gomes. Direito Tributário: apreendendo. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
DIAMANTE, Flávio. Impostos sobre vendas: o paradoxo das incidências. Revista Contábil & Empresarial Fiscolegis. Disponível em: <http://www.netlegis.com.br/indexRC.jsp?arquivo=detalhesArtigosPublicados.jsp&cod2=160>. Acesso em: 10 jun. 2013.
GIRALDI, Renata. Busca pelo turismo na Europa ameniza efeitos da crise econômica internacional, diz OMT. Agência Brasil. 25 out. 2011. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-10-25/busca-pelo-turismo-na-europa-ameniza-efeitos-da-crise-economica-internacional-diz-omt>. Acesso em: 05 jun. 2013.
LAKATOS, Maria Eva. MARCONI, Maria de Andrade. Metodologia do trabalho cientifico. 4. Ed. São Paulo: Atlas, 1992.
MAGALHÃES, Rodrigo Moreira. A importância da Lei Robin Hood para o desenvolvimento turístico dos municípios de Minas Gerais. 2008. 69f. (Conclusão de curso) – Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Geografia, Belo horizonte.
MASCARENHAS, Juliana de Freitas. O IRPJ e o planejamento tributário nas organizações: uma análise sobre os seus efeitos do diferencial competitivo. 2004. 53f. Monografia (Conclusão de curso) – Universidade Federal de Pernambuco, Departamento de Ciências Contábeis, Recife, Pernambuco. Disponível em: <http://www.ufpe.br/gepec/exemplos/04_monografia02(julianadefreitas_gepec).pdf>. Acesso em: 05 jun. 2013.
MINAS GERAIS. Lei nº 18.030, de 12 de janeiro de 2009.Dispõe sobre a distribuição da parcela da receita do produto da Arrecadação do ICMS pertencente aos municípios. Minas Gerais Diário do Executivo. 13 jan. 2009. p. 3, col. 1. Disponível em: <http://www.fazenda.mg.gov.br/empresas/legislacao_tributaria/leis/2009/l18030_2009.htm>. Acesso em: 07 jun. 2013.
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Turismo de Minas Gerais. ICMS Turístico beneficiará mais de cem municípios mineiros. 07 nov. 2012a. Disponível em: <http://www.turismo.mg.gov.br/noticias/1225-noticias>. Acesso em: 03 jun. 2013.
MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Turismo de Minas Gerais. ICMS Turístico beneficiará mais de cem municípios mineiros. 22 mar. 2012b. Disponível em: <http://www.turismo.mg.gov.br/noticias/1107-noticias>. Acesso em: 03 jun. 2013.
Teixeira. Alessandra Brandão. A tributação sobre o consumo de bens e serviços.Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 13.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
NOTAS DE FIM
[1]Graduando de bacharelado em Direito pelo 10º período do Centro Universitário Newton Paiva. Área de Interesse: Direito.
Endereço para correspondência: Rua Espírito Santo, 2.578, AP 301, Lourdes, Belo Horizonte, Minas Gerais, CEP: 30.160-032. E-mail: mukitod2@hotmail.com