INC05 04 AVALIACÃO DE CONTAMINANTES MICROBIOLÓGICOS EM PRODUTOS COSMÉTICOS

Rafaela Santos de Araújo [1]

Cislene Rodrigues Pereira [2]

Cristiane Marinho da Silva Costa [3]

Indianara Paula Araújo [4]

Cristina Lopes Zanette Mendes [5]

Gisele Santos Gonçalves [6]

 

RESUMO: A qualidade microbiana é um dos requisitos indispensáveis de um produto cosmético. No Brasil, foi criada em 2000 a Resolução RDC n° 33, que aprova o regulamento técnico sobre Boas Práticas de Manipulação de produtos cosméticos. O controle da qualidade analisa todos os insumos que participam do processo produtivo e o produto acabado dos cosméticos. Nesse controle, são realizados testes físico-químicos e biológicos, como a contagem de microrganismos viáveis em produtos não estéreis. Assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade, no que se refere ao controle microbiológico de diferentes produtos cosméticos, visando à melhoria da qualidade e segurança no uso dos mesmos. A pesquisa de bactérias e fungos foi realizada através do método de contagem em placas pela técnica de semeadura em superfície, padronizado pela Farmacopeia Brasileira. O material submetido às analises microbiológicas constitui de produtos cosméticos novos, e após o uso por cerca de três meses, bem como outros com maior tempo de uso. Os cosméticos escolhidos foram aqueles considerados mais propícios ao crescimento de microrganismos, como os que utilizam água como principal veículo e os produtos utilizados na área dos olhos, devido ao maior risco ao usuário. Dessa forma, o material objeto desse estudo foi constituído por sombra, batom, base sólida e líquida. Dos produtos analisados, não foi observado nenhum crescimento microbiano significativo. O presente trabalho, como um estudo piloto, sugere o prosseguimento das análises, uma vez que o número amostral deve ser aumentado para avaliar a reprodutibilidade dos resultados e mais confiabilidades dos mesmos. A análise de uma amostragem maior poderá permitir ao profissional de estética, e mesmo ao consumidor leigo, uma melhor compreensão sobre a utilização dos produtos cosméticos mais propícios à contaminação microbiológica, bem como permitir o uso de forma mais adequada para cada maquiagem.

 

PALAVRAS – CHAVE: Controle Microbiológico. Produtos Cosméticos. Risco Biológico

 

ABSTRACT: Microbial quality is a fundamental requirement concerning cosmetic products. In the year of 2000, it was created in Brazil the Resolution RDC n ° 33, which approves the technical regulation of good practices of manipulation for cosmetic products. This quality control analyzes all inputs that participate in the production process and the cosmetics final products. In this control, physical-chemical and biological tests are performed, such as the counting of viable microorganisms in non-sterile products. Thus, the goal of this study is to evaluate the microbiological quality control of different cosmetic products, aiming to increase their quality and safety. The bacterial and fungi research was accomplished by the plaque counting method using the technique of surface sowing, standardized by the Brazilian Pharmacopoeia. Unopened cosmetic, cosmetics with three months of use and other cosmetics with more than three months of use formed the material submitted to microbiological analysis. The chosen cosmetics were those more favorable to microorganisms growth, such as those that use water as the main vehicle, and also products used in the eye area, due to the greater risk to the user. Thus, the material selected for the study comprised of eyeshadow, lipstick and solid and liquid foundation. No significant microbial growth was observed in the analyzed products. This pilot study suggests the continuation of analyzes, since the sample number should be increased to better evaluate the reproducibility and reliability of the results. An analysis of a larger sample can provide to the aesthetic professional and even to the consumer a better understanding of the use of the cosmetics more susceptible to microbiological contamination, as well as allow the use of more appropriate forms for each type of makeup.

 

KEYWORDS: Microbiological Control. Cosmetic Products. Biological risk

 

Introdução

Os cosméticos são produtos para uso externo, de origem sintética ou natural, destinados à proteção ou embelezamento das diferentes partes do corpo. Dentre esses produtos, encontram-se os destinados à maquiagem (BRASIL, 2010), como batons, sombras, máscaras para cílios, pós-faciais e outros (BENVENUTTI et al., 2016).

Conforme dados da Associação Brasileira das Indústrias de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC), a cada ano o setor de cosméticos tem registrado aumento significativo, a balança comercial dos produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, nos últimos dez anos, demonstrou um crescimento médio de 7,5% a.a. nas exportações e de 19,5% a.a. nas importações entre 2004 e 2014 (BENVENUTTI et al., 2016).

Para acompanhar esse crescimento, é necessário o emprego de normas de fabricação dos produtos cosméticos, no sentido de “organizar e seguir a produção dos mesmos de forma segura”, conforme estabelecido na RDC nº 48 de 25 de outubro de 2013, do Ministério da Saúde, a qual enfatiza a importância do cumprimento do Manual de Boas Práticas de Fabricação para produtos de Higiene Pessoal, Cosméticos e Perfumes. Para tal, é imprescindível assegurar a proteção microbiológica, e, assim, permitir que o produto esteja livre de microrganismos que possam causar danos à saúde humana, uma vez que isto é de amplo interesse dos consumidores e de órgãos fiscalizadores (SIQUEIRA, 2005; PINTO; KANEKO; PINTO, 2010).

Assim, a qualidade microbiológica dos produtos farmacêuticos é essencial para a segurança, eficácia e aceitabilidade dos mesmos e constitui um dos fatores fundamentais para a recuperação e preservação da saúde dos consumidores. A capacidade do microrganismo de provocar a deterioração dos produtos depende da sua habilidade em crescer e se multiplicar em meios contendo substâncias inibidoras do seu crescimento e a forma farmacêutica do produto pode ser determinante para favorecer o crescimento microbiano (RAMOS, 2010).

Os produtos cosméticos mais suscetíveis à contaminação são os que apresentam água em sua formulação como emulsões, géis, suspensões ou soluções. Ao lado da qualidade microbiana adequada para comercialização, o cosmético deve ser seguro ao consumidor, garantindo a manutenção dessa qualidade durante o uso, mediante a adição de conservantes eficazes em concentração adequada. Esse aspecto assume importância maior quando se trata de cosméticos de uso dérmico, já que estes passam um bom tempo em contato direto com a pele antes da remoção. Existe sempre o contato do produto com as mãos e a possibilidade de exposição do produto às repetidas contaminações durante o uso (OHARA et al., 1991). A utilização de sistemas conservantes adequados e validados, assim como o cumprimento das Boas Práticas de Fabricação são necessários para a conservação adequada das formulações (ANVISA 2004).

Outro fator importante, que deve ser levado em consideração, é o armazenamento dos produtos cosméticos, que deve ser em local arejado, evitando calor e umidade. O prazo de validade delimitado pelo fabricante deve ser respeitado. A variação de cor, textura e odor, que são perceptíveis, determinam que o produto perdeu sua estabilidade e consequentemente sua eficácia (ANVISA, 2004).

A contaminação derivada dos operadores também é significativa, devido à grande perda de escamas da pele (na ordem de 10 por minuto) que transportam contaminantes da microbiota normal como Staphylococcus aureus e, dependendo da higiene dos operadores, Salmonella e Escherichia coli. Outro tipo de contaminação, difícil de prever, é a contaminação pós-fabricação, ocasionada durante o uso ou estocagem do produto (PINTO et al., 2003). Se não forem tomadas as medidas cabíveis de biossegurança, os procedimentos que envolvem contato humano na área da beleza podem gerar fatores de risco biológico, que culminam com as chamadas infeções cruzadas. Estas se definem pela transmissão de doenças de uma pessoa para outra, através do contato direto ou por meio de objetos contaminados, podendo ocorrer entre o profissional e o cliente, como também entre os profissionais responsáveis pela conservação e limpeza de um estabelecimento de beleza (COVISA, 2006).

Os materiais envolvidos no processo da maquiagem necessitam de uma adequada limpeza e desinfecção. A limpeza é um processo no qual são removidas sujidades de superfícies ou objetos, enquanto a desinfecção reduz um grande número de microrganismos potencialmente patogênicos em objetos e superfícies, mas não destrói, necessariamente, vírus e esporos, sendo geralmente utilizados desinfetantes e antissépticos (ANVISA, 2004).

Diante dessa realidade, o presente trabalho tem por objetivo a avaliação da qualidade no que se refere ao controle microbiológico de diferentes produtos cosméticos e a conscientização do profissional e do público em geral sobre o problema relacionado à contaminação microbiológica que pode causar doenças devido ao uso dos produtos.

 

Material e métodos

A metodologia empregada nas análises microbiológicas visou à quantificação dos microrganismos nos diferentes produtos cosméticos.

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Seleção das amostras

O material submetido às analises microbiológicas constituiu de produtos cosméticos novos (a serem ainda utilizados), e produtos cosméticos após o uso por cerca de três meses, bem como outros com maior tempo de uso durante as aulas práticas do curso de Estética e Cosmética do Centro Universitário Newton Paiva – BH/MG. Foram escolhidos aqueles considerados mais propícios ao crescimento de microrganismos, como os que utilizam água como principal veículo e os produtos utilizados na área dos olhos, devido ao maior risco ao usuário. Assim, o material objeto deste estudo foi constituído por sombra, batom, base sólida e líquida adquiridos de diferentes indústrias cosméticas.

 

Preparo das amostras

Inicialmente a embalagem primária da maquiagem foi limpa externamente com algodão embebido em álcool 70º GL. Em seguida, foram utilizadas aproximadamente 5g das amostras, diluídas em 90 mL de tampão fosfato pH 7,2 estéril, acrescidas de polissorbato 80 (Tween® 80) para inativação do sistema conservante (FARMACOPEIA, 1988). No primeiro experimento, foi necessário o aquecimento do batom e das bases para terem uma melhor diluição.

A partir da dispersão obtida, que corresponde à diluição de 10-1, foram realizadas diluições decimais de 10-2 e 10-3, sendo utilizada como diluente a água destilada estéril. Em seguida, foi realizado, em duplicada, o plaqueamento para a contagem de contaminantes viáveis totais. As diluições foram semeadas conforme o método de semeadura em superfície utilizando a alça de Drigalski.

 

Contagem de microrganismos viáveis totais

A pesquisa de bactérias e fungos foi realizada através do método de contagem em placas pela técnica de semeadura em superfície. Para a pesquisa de bactérias foi utilizado ágar nutriente, incubando-se as amostras por 72 horas em temperatura de 35 ± 1°C, realizando-se leituras nos períodos de 24, 48 e 72 horas. Para a pesquisa de fungos e leveduras, as amostras foram semeadas em ágar Sabouraud-Dextrose (SBD) com posterior incubação em estufa durante 14 dias em temperatura de 25 ± 1ºC, com observações diárias (FARMACOPEIA, 1988).

Paralelamente, como controle de qualidade dos ensaios, foram incubadas placas contendo somente os meios de cultura (ágar nutriente e ágar Sabouraud) e placas contendo estes meios acrescidos do diluente.

 

Avaliação dos resultados

A contagem das colônias foi realizada visualmente, sem o auxílio de instrumentos. Foi calculada a média aritmética de cada diluição por grama (g) ou mililitros (mL) de produto a partir dos valores obtidos nas placas no último dia de análise. O número de colônias foi multiplicado pela diluição utilizada e expresso como Unidades Formadoras de Colônia (UFC/ g de produto).

 

Resultados e discussão

No presente estudo, foi adotado o polissorbado 80 (Tween® 80) como recurso para a neutralização do sistema conservante dos produtos cosméticos. Os produtos foram considerados próprios ou impróprios para consumo com base nas exigências da Resolução RDC n° 481 de 23 de setembro de 1999, na qual o limite permitido para produtos do Tipo I é 102 UFC/ g ou mL (limite máximo de 5 x 102 UFC/ g ou mL) (BRASIL, 1999).

Os resultados obtidos na análise inicial das quatro maquiagens podem ser conferidos na Tabela 1. Cabe ressaltar que durante o preparo das amostras de batom e base foi necessário o aquecimento para uma melhor diluição dos produtos na solução de tampão fosfato.

 

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Foi registrado o valor como sendo menor que uma vez a menor diluição utilizada no método de contagem em placa, ou seja, menor que 10 UFC, para todas as amostras que não apresentaram crescimento de colônias.
O batom, a sombra e a base líquida não apresentaram crescimento em nenhum meio de cultura de contagem (Nutriente e Sabouraud) após 72 horas de incubação. Contudo, para a base sólida foi observado o crescimento de cinco colônias na diluição de 10-3 na placa de ágar Sabouraud, sugerindo uma contaminação, uma vez que nas diluições anteriores não se observou nenhum crescimento.

A segunda parte do estudo constituiu da avaliação microbiológica de produtos cosméticos novos. Para a terceira etapa foram utilizados os mesmos produtos da segunda, após o uso por cerca de três meses nas aulas práticas de maquiagem do curso de Estética e Cosmética do Centro Universitário Newton Paiva – BH/MG. Os resultados da segunda e terceira etapas de análise podem ser conferidos na Tabela 2, não sendo novamente identificado nenhum crescimento significativo para os produtos utilizados.

 

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Em estudo realizado por Gomes e colaboradores, em 2015, dos resultados encontrados na pesquisa microbiológica em bases cosméticas faciais, das oito amostras analisadas, apenas uma comercializada em feiras livres, apresentou leveduras e fungos filamentosos acima do limite permitindo, sendo um total de 5,28 x 102 UFC/g, já em outros produtos comercializados por indústrias renomadas e bastante consumidas não houve nenhum crescimento microbiológico.

Entretanto, trabalho realizado por Tonin et al. (2007) com avaliação microbiológica de cosméticos (cremes O/A) manipulados em Farmácias do Planalto Médio, RS, das 10 amostras avaliadas, apenas duas não apresentaram crescimento microbiano sendo o alto índice de contaminação fúngica a causa de reprovação de 60% das amostras.

No geral, os resultados indicam um bom controle de qualidade microbiológico das indústrias, assegurando um menor risco ao consumidor. Assim, torna-se primordial que os profissionais de estética levem em consideração medidas de biossegurança para propiciar atendimento seguro, ou seja, utilizando materiais descartáveis ou devidamente descontaminados durante o uso dos produtos cosméticos em clientes diferentes.

 

Conclusão

Através dos resultados obtidos, verificou-se que não houve nenhum crescimento microbiológico significativo para os produtos cosméticos analisados. O presente trabalho, como um estudo piloto, sugere o prosseguimento das análises, uma vez que, o número amostral deve ser aumentado para avaliar a reprodutibilidade dos resultados e mais confiabilidades dos mesmos. A análise de uma amostragem maior poderá permitir ao profissional de estética, e mesmo ao consumidor leigo, uma melhor compreensão sobre a utilização dos produtos cosméticos mais propícios à contaminação microbiológica, bem como permitir o uso de forma mais adequada para cada maquiagem.
Contudo, os produtos cosméticos apresentam grande fluxo de uso, os profissionais têm contato direto com diversos clientes diariamente, assim o ambiente se torna propício à contaminação cruzada, caso não sejam seguidas de forma correta medidas de biossegurança, o que pode colocar em risco a saúde dos clientes. Outro ponto importante a ser considerado pelo consumidor no momento da compra dos produtos cosméticos é adquirir somente produtos cuja embalagem esteja intacta, limpa e com a validade estabelecida pelo produto.

 

Agradecimento

À técnica em química Cristina Lopes Zanette Mendes pela disponibilidade e contribuição durante todo o trabalho prático.

 

REFERÊNCIAS

ANVISA. Guia de Estabilidade de Produtos Cosméticos. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. 1. ed. Brasília: ANVISA, 2004. 52 p.

BENVENUTTI, A. de S.; VEIGA, A.; ROSSA, L. S.; MURAKAMI, F. S. Avaliação da qualidade microbiológica de maquiagens de uso coletivo. Cienc. Saúde UNIPAR, Umuarama, v. 20, n. 3, p, 159-163, dez. 2016.

BRASIL. Farmacopéia Brasileira 5ª ed., v.1, Brasília: 20, n. 3, p. 159-163, set./dez. 2016 163. 2010.

BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Parâmetros para Controle Microbiológico de Produtos de Higiene Pessoal, Cosméticos e Perfumes. Resolução RDC n° 481 de 23 de setembro de 1999.

COVISA. Coordenação de Vigilância em Saúde: Guia de Orientação para Estabelecimentos de Assistência à Saúde. São Paulo, 2006, 16p.

FARMACOPÉIA, Brasileira. 4. ed., São Paulo: Atheneu, 1988. pt.1.

OHARA, M.T.; FISCHER, D.C.H.; SAITO, T. Contaminação Microbiana em Condicionadores de Cabelo. Revista Brasileira de Farmácia e Bioquímica. 27(1), 1991.

PINTO, T.J.A.; KANEKO, T.M.; PINTO, A.F. Controle Biológico de Qualidade de Produtos Farmacêuticos, Correlatos e Cosméticos. São Paulo: Atheneu Editora, 2010. 780 p.

RAMOS, S. V. V. Validação da metodologia analítica aplicada ao controle da qualidade microbiológica de formas farmacêuticas líquidas e determinação da eficácia dos conservantes. Recife, 2010.

SIQUEIRA, VL. Cuidados microbiológicos em cosméticos e produtos de higiene pessoal. Informativo CRQ , 2005.

TONIN F. Z., BARELLI C., KNORST M. T. Avaliaçâo microbiológica de produtos cosméticos manipulados em farmácias do planalto médio, RS. Infarma, v.19, nº 5/8, 2007, 117-119p.

 

NOTAS

[1] Graduanda em Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva

 

[2] Graduanda em Estética e Cosmética do Centro Universitário Newton Paiva

 

[3] Enfermeira graduada pelo Centro Universitário Newton Paiva

 

[4] Professora do Centro Universitário Newton Paiva Técnica em Química

 

[5] Professora Orientadora do Centro Universitário Newton Paiva. E-mail: giselesantos@newtonpaiva.br