INC04 08 USO DA REABILITAÇÃO VIRTUAL PARA MELHORA DO USO DO MEMBRO SUPERIOR PARÉTICO EM HEMIPARÉTICOS CRÔNICOS

Renata Cristina Magalhães Lima[i]

Ana Paula Dias de Menezes[ii]

Maria Carolina Gomes Inácio[iii]

Silvia Moreira Amaral[iv]

 

RESUMO: O acidente vascular encefálico causa inúmeras deficiências na estrutura e função do corpo, dentre elas as relacionadas ao membro superior (MS) gerando limitações no alcance, manipulação, autocuidado e restrições nas participações sociais. O objetivo desse estudo foi avaliar os efeitos da reabilitação virtual sobre a funcionalidade do MS de hemiparéticos crônicos pela aplicação do Motor Activity Log – MAL, Wolf Motor Function Test – WMFT e pela Abilhand. Como desfechos secundários, avaliar os efeitos sobre a força muscular (Teste de Força Muscular Manual) e a amplitude de movimento (Goniômetro universal) do MS parético, e qualidade de vida avaliada pela Stroke Specific Quality of Life Scale– SSQOL-Brazil. Foi realizado um estudo de caso único do tipo ABA, com duas participantes que atenderam aos critérios de inclusão. Dados demográficos e clínicos, foram colhidos para caracterização da amostra. Os indivíduos foram avaliados por quatro vezes no baseline, imediatamente e decorridas quatro semanas após o término do treinamento. Foram quatro semanas de treinamento totalizando 12 sessões, com 60 minutos cada, de realidade virtual utilizando o vídeo game X-box360 Kinect. Em relação a MAL, o baseline se manteve constante para a participante 1 com pequena evolução no followup, enquanto a participante 2 demonstrou uma melhora do baseline que foi mantida no followup. Quanto a Abilhand, os dados mantiveram-se estáveis para ambas não havendo mudanças. No WMFT, a participante 1 obteve breve avanço associado à tarefa 7 (peso na caixa) e tarefa 14 (preensão). A participante 2 adquiriu um comportamento constante em relação às mesmas tarefas, enquanto os resultados relacionados aos aspectos qualitativos, mantiveram-se estáveis para ambas. Foi possível concluir que houve maior uso e atenção ao MSP contribuindo para a diminuição do desuso aprendido. Provavelmente, para maiores ganhos seja preciso um maior número de sessões e a associação desta abordagem com outras formas de intervenção. Reabilitação virtual contribuiu como facilitador em relação aos aspectos psicológicos, como autoestima e motivação, maior uso funcional do membro superior e melhor qualidade de vida.

PALAVRAS-CHAVE: Interface usuário-computador. Membro superior parético. Reabilitação.

ABSTRACT: Stroke causes numerous deficiencies in the body structure and function, including the upper limb-related (UL) generating limitations in reach, grasp, self-care and restrictions on social participation. The goal of this study was to evaluate the effects of virtual rehabilitation on chronic hemiparetic UL functionality with application of Motor Activity Log – MAL, Wolf Motor Function Test-WMFT and Abilhand. As secondary outcomes, it assessed the effects on muscular strength (Muscle strength test manual) and the range of motion (universal Goniometer) of hemiparetic UL, and quality of life assessed by Stroke Specific Quality of Life Scale-SSQOL-Brazil. A single case study of type ABA was done, with two participants who met the inclusion criteria. Demographic and clinical data were collected for sample characterization. The subjects were evaluated by four times in the baseline, during the training and immediately after the end of the training. There were four weeks of training with a total of 12 sessions, with 60 minutes each, using virtual-reality video game X-Box360 Kinect. About MAL, the baseline has remained constant to the participant 1 with small developments in the followup, while participant 2 demonstrated a better baseline that was kept in the followup. As for Abilhand, the data remained stable for both with no changes. In the participant 1 WMFT obtained brief advancement associated with the task 7 (weight in box) and task 14 (prehension). The participant 2 acquired a constant behavior in relation to the same tasks, while the results related to qualitative aspects, they remained stable for both. It was possible to conclude that there was greater use and attention to UL contributing to the fall in disuse learned. Probably to get greater gains it is required a greater number of sessions and the association of this approach to other forms of intervention. Virtual rehabilitation contributed as a facilitator in relation to psychological aspects, such as self-esteem and motivation, and for greater functional use of the UL and better quality of life.

KEY-WORDS: User-computer interface; Paretic upper lim; Rehabilitation.

  

INTRODUÇÃO

 O acidente vascular encefálico (AVE) resulta em inúmeras deficiências na estrutura e função do corpo, dentre elas estão às relacionadas ao membro superior contralateral à lesão encefálica. Essas deficiências acabam gerando limitações nas atividades e restrições nas participações. Em si tratando da funcionalidade do membro superior (MS) o impacto dessa condição torna-se ainda mais relevante, considerando a importância deste para a execução de atividades diárias como alcance, manipulação e autocuidado.

Dessa forma, representando um importante impacto na saúde pública brasileira devido sua alta prevalência e associação com elevados índices de mortalidade e incapacidade gerando consideráveis custos para o sistema de saúde, para o individuo e seus familiares. Além de ser considerado a maior causa de incapacidade crônica em países desenvolvidos e em desenvolvimento. (SALIBA et al, 2008)

Mais de 80% dos sobreviventes do AVE apresentam hemiparesia e em torno de 70% destes mantêm algum tipo de limitação, sendo uma das maiores queixas desses indivíduos a alteração da função do membro superior parético (MSP), devido à deficiência na destreza durante a execução de atividades de vida diária (AVD). Podendo assim, levar ao desuso aprendido, caracterizado pela diminuição da utilização do MSP, aumentando as deficiências e incapacidades.(SALIBA et al, 2008; MORAES et al, 2008)

Com intuito de reverter ou minimizar este quadro, o fisioterapeuta, como um dos profissionais da equipe de reabilitação multiprofissional, tem um papel importante na recuperação pós-AVE. Ao intervir nas características de estruturas e funções corporais comprometidas, modificação do ambiente e orientação ao paciente e seus familiares, tem sido possível promover um nível funcional adequado que garanta a independência dos hemiparéticos.

A reabilitação virtual é uma abordagem que utiliza-se da realidade virtual e tem sido considerada como um recurso inovador, contendo características motivacionais e atraentes. Capaz de impor certo desafio ao desempenho do participante e, assim, com possibilidade de constituir-se em mais um recurso para a reabilitação de pacientes com déficit na movimentação, como os hemiparéticos.

O objetivo desse estudo foi avaliar os efeitos da reabilitação virtual sobre a funcionalidade do MS de hemiparéticos crônicos.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

 

Delineamento do estudo

 Tratou-se de um estudo de caso do tipo ABA feito no laboratório de reabilitação virtual do Centro Universitário Newton Paiva, realizado com duas participantes hemiparéticas crônicas.

Critérios de inclusão e exclusão

 Para o estudo o participante deveria ser hemiparético devido ao AVE ocorrido há mais de seis meses do início de sua participação, apresentar deficiências e limitações no uso do MSP comprovados pelos testes aplicados na avaliação inicial. Além de não apresentar déficit cognitivo segundo aplicação do teste do Mini exame do Estado Mental (MEEM), um teste que consiste em 14 itens de funções cognitivas, utilizado na primeira avaliação para avaliar as perdas cognitivas e verificar se o indivíduo se enquadra nos critérios do estudo. Deveria também apresentar grau de força muscular igual ou maior a três avaliado pelo Teste de Força Muscular para a dos grupos musculares do MSP.

Foram excluídos aqueles que estavam ou que foram submetidos a tratamento fisioterápico 6meses anteriores a data de início da pesquisa, apresentassem déficits visuais ou auditivos que não podiam ser corrigidos e fossem praticantes de exercício físico regular. Também se apresentassem doenças descompensadas como hipertensão arterial e insuficiência cardíaca congestiva que consistissem em algum fator de risco para a prática de atividades físicas ou outras patologias em membros superiores que comprometessem a realização dos treinos, como: síndrome do impacto, epicondilite, síndrome do túnel do carpo, capsulite adesiva, síndrome do desfiladeiro torácico, luxações recorrentes da articulação do ombro, dentre outras.

  

Desfechos Primários

 As participantes foram avaliadas semanalmente no baseline(período A), protocolo de treinamento (período B) e followup(período B), cada um com quatro semanas de duração.

Como parte dos desfechos primários constaram dois questionários e um teste que realizados semanalmente. O primeiro questionário foi o Motor ActivityLog– MAL que avalia a habilidade motora do membro superior mais afetado no dia a dia do indivíduo e, assim, fornece informações sobre o desempenho e utilização espontânea do MS parético. Este é composto por 30 itens, compreende duas subescalas ordinais para a graduação das atividades, com seis pontos em cada uma relacionada à quantidade de uso e outra à qualidade, e foram aplicados sob a forma de entrevista com as participantes. A pontuação total foi obtida com o cálculo da média aritmética das escalas e a melhora em relação à qualidade e quantidade do uso do MS parético, é obtida através da maior pontuação nos resultados. (SALIBA, et al.2011)(SALIBA, et al., 2008)

O segundo questionário aplicado foi a Abilhand, uma medida de habilidade manual percebida pelo paciente composto por 23 atividades, em que é solicitado estimar a facilidade ou dificuldade ao desempenhar, sem nenhuma ajuda, cada atividade. Durante a avaliação uma escala de resposta de 3 níveis foi apresentada e pede-se ao participante que pontue a percepção conforme a escala de resposta como sendo impossível, difícil ou fácil. (BASÍLIO, 2015)

E, por último, o teste Wolf Motor Function Test – WMFT composto por 17 tarefas que foram realizadas de forma organizada, de proximal para distal e das habilidades amplas para as finas. Seu escore varia de zero a 85 pontos, sendo que uma maior pontuação permitiu avaliar a melhora da funcionalidade. (CAVACO e ALOUCHE, 2010)

Desfechos Secundários

 Fizeram parte dos desfechos secundários os testes que avaliam força muscular, amplitude de movimento e desempenho na realização dos itens do teste de Fulg Meyer, todos realizados nas avaliações A1, A4, B4 e A4.

A força muscular foi avaliada pelo Teste de Força Muscular Manual que consiste na aplicação de uma resistência externa pelo terapeuta, ou pela força da gravidade, pelo peso do membro que foi movido ou somente a observação da contração muscular do segmento avaliado (dependendo do grau de atividade muscular existente). Desta maneira, foi possível graduar a força muscular em cinco (normal), quatro (bom), três (regular), dois (fraco), um (esboço) ou zero (paralítico) dos seguintes principais grupos musculares dos membros superiores.

Ainda para avaliação da força muscular foi utilizado a Dinanometria de Preensão Manual, um recurso de fácil e rápida execução, que testou a força de preensão palmar dos membros superiores. (SOARES, et al., 2011)

O goniômetro universal foi utilizado para avaliação da amplitude de movimento de abdução, adução, flexão, extensão, rotação medial e lateral de ombro, flexão e extensão de cotovelo e punho e prono e supino de antebraço.

Outro teste aplicado, assim como os anteriores, padronizado e adaptado para a população brasileira, foi a Escala de Fulg-Meyer – EFM. Um instrumento designado especificamente como avaliativo da recuperação do paciente hemiplégico com foco nas deficiências de estrutura e função do corpo, podendo classificar o paciente como tendo um comprometimento severo, moderado ou leve dependendo do score obtido. Sendo que para esse estudo foram aplicados somente os itens relacionados ao membro superior. (CAVACO e ALOUCHE, 2010)

E, por último, a avaliação da qualidade de vida foi realizada pela aplicação do Stroke Specific Quality of Life Scale– SSQOL-Brazil, originalmente desenvolvido para medir a qualidade de vida de indivíduos com sequelas de AVE. Esse instrumento foi aplicado por meio de entrevista e utilizado a semana anterior como ponto de referência para as respostas. Contém 49 itens distribuídos em 12 domínios: energia, papel familiar, linguagem, mobilidade, humor, personalidade, autocuidado, papel social, raciocínio, função de membro superior, visão e trabalho/produtividade. A pontuação deste instrumento foi graduada em uma escala de um a cinco, dependendo da quantidade de ajuda e dificuldade que o participante necessitou ao realizar a tarefa especifica ou concordância com afirmação apresentada. Maiores pontuações resultaram em uma melhor qualidade de vida.(LIMA, et al, 2008)

 

Instrumento de Intervenção

Para a reabilitação virtual atualmente os instrumentos mais utilizados são os vídeo-gamesNintendo wii, X-boxKinect e Play Station Moveque possibilitam o jogo utilizando a realidade virtual, todos eles já utilizados como recurso terapêutico. Porém, ainda não há na literatura estudos de comparação entre eles e pouco há escrito sobre as diferenças entre si. O escolhido para ser utilizado neste estudo foi o X-box 360 kinectque capta a movimentação dos participantes por meio de um dispositivo em forma de sensor, sem a necessidade do uso do controle junto ao MS, possibilitando, dessa forma, maior liberdade de movimento ao jogador. (MEDEIROS et al., 2013)

Protocolo de treinamento

 Após a primeira avaliação as pacientes foram acompanhadas pela avaliação dos desfechos primários semana a semana no baseline, e aguardou-se quatro semanas para confirmar a estabilidade dos dados (A). Ao final deste período uma nova avaliação completa, dos desfechos primários e secundários, foi realizada. Na sequência o protocolo de treinamento foi iniciado, realizado durante um total de quatro semanas com três sessões semanais de 60 minutos cada, totalizando 12 sessões de reabilitação virtual (B).

Ao longo dos treinos as participantes foram avaliadas pelos desfechos primários semanalmente, com uma avaliação completa ao termino do protocolo de treinamento. Ambas as participantes foram acompanhadas pelos desfechos primários num follow-up de quatro semanas (A) e ao final das 12 semanas uma última avaliação completa foi realizada e as participantes foram liberadas da pesquisa.

Para este estudo os jogos utilizados foram o boliche e boxe, modalidades que simulavam atividades esportivas, e o “estoura bolhas”, que requeria a adoção de variados padrões de posturas dos MMSS, a fim de estourar bolhas espalhadas pelo ambiente virtual. Todos os jogos exigiam, então, movimentação predominantemente de ombro e cotovelo nos planos frontal e sagital, variando entre atividades uni manuais e bi manuais, sendo que nas manuais foi enfatizado à participante privilegiar o uso do membro parético.

Para a prática dos jogos foi associado o uso de recursos fisioterapêuticos como caneleiras para adição de sobrecarga ao membro superior e promoção de melhoras nos ganhos de força muscular, em uma das participantes que durante a avaliação apresentou grau 3 para a maioria dos grupos do membro superior testados, já esta apresentava tolerância para a sobrecarga imposta. Este recurso foi utilizado para fornecer maior resistência e auxiliar o ganho de força muscular.

A cada treino foram realizados três, quatro jogos, dependo da duração de cada um, com intervalos para descanso entre eles, alternando entre a prática assentada e em ortostatismo, conforme o nível de fadiga apresentada pela participante. Os treinos iniciavam com aferição dos dados vitais (pressão arterial e frequência cardíaca) seguidos da prática dos jogos escolhidos para o indivíduo e também finalizavam com a mensuração dos dados vitais para a encerramento da sessão.

Todos os treinos aconteceram na clínica escola do Centro Universitário Newton Paiva e foram acompanhados diretamente por um dos pesquisadores para evitar a ocorrência de quedas ou outras intercorrências passiveis de acontecer durante atividades físicas e, para a monitorização do esforço das participantes durante a atividade, por meio da observação do nível de sudorese, mímica facial e mudança dos padrões de movimentos. E foi função deste, também, incentivar e fornecer feedback sobre o desempenho da participante, afim de garantir certo nível de desafio durante a prática do jogo e assegurar o uso do vídeo game com o objetivo terapêutico e não como o de entretenimento.

RESULTADOS

 A amostra foi composta por duas participantes, selecionadas a partir dos prontuários da Clínica Escola do Centro universitário Newton Paiva. Ambas cumpriam os critérios de inclusão estabelecidos pelo estudo, e estando cientes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e esclarecido. Após esta etapa, foram submetidas a uma breve avaliação inicial contendo identificação e anamnese.

A participante 1, 70 anos, sexo feminino, casada, do lar, ensino fundamental incompleto, com diagnóstico de AVE isquêmico à esquerda, hemiparesia do lado dominante há 11 anos, sob tratamento medicamentoso com histórico de Câncer de mama e Hipertensão Arterial, como patologia associada. Participante 2, 56 anos, sexo feminino, casada, do lar, segundo grau completo, com diagnóstico de AVE isquêmico à direita e hemiparesia do lado dominante, há mais de dois anos, também em tratamento medicamentoso. Ambas as participantes tiveram comprometimento motor classificado como moderado pelo Fulg Meyer, sendo que a participante 1 atingiu um escore de 44/60 e a participante 2 atingiu 56/60.

Desfechos primários

 Em relação à participante 2 os desfechos da MAL demonstraram uma melhora do baseline para o momento intervenção e essa melhora foi mantida no followup. Quanto a participante 1 a baseline se manteve constante durante a intervenção com pequena evolução no followup, para o mesmo desfecho. Quanto aos resultados do Abilhand, estes mantiveram-se estáveis para ambas não havendo mudanças dignas de nota. No WMFT a participante 2 obteve um comportamento estável em relação ao aspecto qualitativo da capacidade de realização das tarefas e uma melhora na tarefa 7 (peso na caixa), com evolução dos resultados ainda no período de follow up.

Já a participante 1 adquiriu um breve avanço associado à tarefa peso na caixa e tarefa 14 (preensão), do WMFT. Houve aumento no tempo de execução deste teste, com apresentação de variações ao longo do estudo, enquanto o aspecto qualitativo, semelhante a outra participante, manteve-se estável.

Os dados individuais referentes aos resultados obtidos para os desfechos primários estão demonstrados nos gráficos 1 a 6.

Desfechos secundários

 Em relação aos desfechos secundários, a amplitude de movimento mensurada através da Goniômetria e a força muscular mensurada pelo Teste de Força Muscular se mantiveram sem variações importantes. Porém houve melhora na qualidade de vida avaliada pelo SSQOL, de 97 para 118 para a participante 1 e de 170 para 188 para a participante 2.

Segundo relatos subjetivos em relação a percepção de cada participante, ambas relataram melhora em relação à percepção de uso do membro superior parético, na realização de atividades da vida diária. O esposo da participante1, ainda relatou que a reabilitação virtual trouxe benefícios para a paciente em relação à autoestima, execução de atividades de vida diária (AVD) (passou a realizar algumas atividades com o MSP, como a alimentação), diminuiu a necessidade de ajuda durante a deambulação e a paciente passou a aderir, mais facilmente, o tratamento fisioterapêutico. Após terminado o protocolo de treinamento e as avaliações a participante foi liberada para a fisioterapia convencional e esta aceitou participar das sessões, sendo que antes relutava bastante quanto a esta possibilidade.

Ao longo da intervenção, a participante 1 compareceu à clínica relatando quedas recorrentes e apresentava um quadro crônico de linfedema no membro superior direito em decorrência de um Câncer de Mama, podendo ter sido este um dos fatores predisponentes que interferiram nos resultados da pesquisa.

Já a participante 2 relatou que o treinamento foi proveitoso, pois passou a dar mais atenção ao MSP, passando a utilizá-lo mais durante as AVD, principalmente na higiene pessoal, e com melhora do aprendizado motor.

DISCUSSÃO

 Nesse estudo, foi possível observar uma maior melhora nos aspectos relacionados ao desempenho funcional e auto percepção de funcionalidade do membro parético, com os desfechos apresentados pela MAL.

Porém os itens relacionados a capacidade funcional como as tarefas do WMFT, com avaliação feita em um ambiente padronizado, não apresentaram melhoras que fossem dignas de nota. Apresentando, ainda variações ao longo das avaliações, podendo estas ser justificadas por fatores de outras co-morbidades, como aumento no grau de linfedema e quedas ocorridas, em seu domicílio, com a primeira participante.

Quanto aos desfechos secundários ambas participantes apresentaram uma manutenção dos itens avaliados, sugerindo, assim, que talvez o período de quatro semanas tenha sido insuficiente para causar mudanças que pudessem ser quantificadas nos testes realizados.

Já em se tratando do desfecho secundário relacionado a qualidade de vida, avaliada pelo SSQOL, a melhora observada durante o período de treinamento e aumento no followup para a participante 1, pode ser que seja explicada pelos resultados tidos quanto a melhora da percepção da funcionalidade do membro parético e pela possibilidade de estar recebendo uma forma de atendimento lúdica e diferente da convencional.

Com o aumento do número de estudos com objetivo de avaliar os efeitos da reabilitação virtual, levantaram-se algumas teorias para justificar o uso dessa intervenção nos hemiparéticos devido ao AVE. E uma delas afirma que durante a prática dos jogos ocorre ativação de um sistema neuronal denominado neurônios-espelho, incluindo áreas do lobo frontal, parietal e temporal, quando o sujeito observa o movimento realizado por outra pessoa. (SAPOSNIK et al, 2010)(SCHIAVINATO et al, 2010)

A observação das imagens na tela do jogo possibilitaria a ativação desses neurônios e com isso uma simulação mental da ação visualizada, com a interpretação da intenção de quem a realizou e uma comparação com o feedback fornecido, tendo, assim parâmetros para correção do movimento na tentativa seguinte. A ativação desse sistema, por sua vez, pode induzir uma reorganização cortical e, assim, auxiliar na recuperação funcional. (BARATO et al, 2009)(LUCCA, 2009)

Na literatura estudos demonstram que os efeitos da RV, realizadas num ambiente padronizado possibilitam um melhor desempenho funcional que pode ser observado através da associação das aptidões pessoais dos participantes, da tarefa e do ambiente. Pois, o ambiente virtual requer que o participante tenha uma maior atenção aos estímulos vindos de todas as direções, permitindo que as habilidades executadas durante o treino possa melhorar a função diária na vida real e também as modificações ambientais virtuais no ambiente real. (KIZONY et al, 2004)

Apesar das evidências apontarem a RV como mais um recurso de bastante interesse na área da reabilitação, não se sabe se os movimentos envolvendo a capacidade funcional em ambientes de realidade virtual são realizados de uma maneira semelhante às feitas no mundo real. Os déficits de coordenação motora, o desuso do membro superior parético e a falta de motivação intrínseca são barreiras importantes que impedem a recuperação motora. Outro fator que interfere na capacidade funcional é que os participantes tendem a diminuir a velocidade dos movimentos durante a RV em relação ao ambiente físico. (VIAU et al, 2004).

Em relação as sessões com a RV, é importante destacar que ao longo destas as participantes eram encorajadas a realizar os movimentos prioritariamente com o membro parético. Porém, em virtude das deficiências apresentadas em amplitude de movimento e desempenho muscular, ambas apresentaram dificuldade em cumprir este comando.

Dessa forma, em alguns jogos, ou mesmo após várias tentativas sem sucesso o comando era alterado para que realizassem as tarefas com os dois membros simultaneamente, mesmo naqueles jogos que exigiam a movimentação de apenas um deles. Essa estratégia permitia que o sensor captasse a movimentação feita pela participante e fornecesse feedback suficiente para aumentar sua motivação e adesão para a continuidade dos jogos. Evitando, assim, o sentimento de frustração devido o não cumprimento da tarefa, gerado pela limitação do sensor em captar a movimentação do membro parético quando utilizado isoladamente.

Sobre essa questão, Whithall et al. (2000, apud, TEIXEIRA, 2008) demonstrou que na movimentação bi manual os membros superiores agem como uma unidade indicando uma interação coordenada no SNC. De tal maneira que quando ocorre ativação moderada em um membro há uma ação geral de transferência contralateral, com contrações musculares nos dois membros, mas com diferentes níveis de forças. Essas particularidades da conexão neurofisiológica no SNC possibilitam que a prática de movimentos bi manuais, alternados ou em sincronia, possa resultar em efeitos de facilitação para a movimentação. (TEIXEIRA, 2008)

Isto pôde ser observado durante os jogos, nesses momentos quando a participante era orientada a realizar as tarefas com os dois membros, ocorria uma melhora do desempenho, em comparação a quando o movimento era feito somente com o membro parético.

Ainda sobre a limitação do sensor em captar a movimentação do indivíduo em treino, durante o protocolo de treinamento deste estudo algumas vezes ainda foi preciso assistir à movimentação das participantes. O que garantia maiores chances de assimilação do que realmente precisava ser feito, auxiliando na aprendizagem motora, e, também, aumentava a possibilidade do sensor em captar a movimentação feita com maior potência.

Para o uso da RV na prática clínica alguns autores defendem esta abordagem em combinação com o tratamento convencional, apoiando-se em estudos que avaliaram o uso dessas duas abordagens em conjunto, na reabilitação do paciente hemiparético crônico. Como o estudo de Turola et al (2013), um ensaio clínico em que foi possível encontrar maiores resultados, na Fulg Meyer e na Medida de Independência Funcional, no grupo que que recebeu o tratamento convencional em combinação com a RV. (TUROLLA, et al. 2013)

Durante as sessões com a RV foi possível perceber a importância do feedback fornecido pelo terapeuta para garantir um nível de desafio adequado aos objetivos terapêutico. E quanto ao feedback oferecido pelo aparelho da realidade virtual é preciso que o terapeuta esteja atento as capacidades de captação deste de acordo com as deficiências de amplitude de movimento e desempenho muscular. Caso sejam incompatíveis, estratégias como o uso do membro não parético, movimentações assistidas ou simultâneas do terapeuta deverão ser utilizadas, para que haja a reconhecimento da movimentação e fornecimento de feedback de tarefa concluída. Contribuindo, assim, para aumento da adesão, satisfação e motivação do participante, itens de fundamental importância para o sucesso de um programa de reabilitação motora/funcional.

E sobre o papel do fisioterapeuta, este possui fundamental importância ao garantir um treino suficientemente capaz de desafiar o jogador dentro dos limites adequados de acordo com níveis de habilidade de cada jogador. Sendo importante, também, em garantir um ambiente seguro e motivador para execução do treino, dando ao participante suporte físico, na ocorrência de desequilíbrios, e motivacionais, caso o participante sinta-se desmotivado após várias tentativas sem sucesso.

Uma das limitações desse estudo foi o pequeno número de participantes, o que pode ter contribuído para a geração de limitados resultados. É possível que em uma amostra maior e com maiores déficits seja possível obter resultados mais relevante e de caráter quantitativo. Uma vez que neste estudo houve um predomínio das melhoras nos aspectos subjetivos e qualitativos.

CONCLUSÃO

 Segundo os resultados obtidos e por relatos das participantes e do cuidador, após protocolo de treinamento foi possível concluir que houve maior uso e atenção ao MSP contribuindo para a diminuição do desuso aprendido. Com melhora mais dos aspectos relacionados ao desempenho funcional, como aqueles avaliados pelo questionário MAL, em comparação aqueles relacionados à estrutura e função.

Possivelmente, para ganhos nesses aspectos seja preciso um maior número de sessões e a associação desta abordagem com outras formas de intervenção que possibilita um trabalho mais específico de força muscular e ganho de amplitude de movimento. O que pela movimentação variada exigida pelos jogos não foi suficiente para que houvesse uma influência nesses parâmetros. Sendo que a RV contribuiu mais como facilitador em relação aos aspectos psicológicos, como autoestima e motivação, maior uso funcional do membro superior e melhor qualidade de vida.

REFERÊNCIAS

 BARATO, et al.Plasticidade cortical e técnicas de fisioterapia neurológica na ótica da neuroimagem. Cortical plasticity and neurological physical therapy techniques in neuroimage optic. Rev Neurocienc, v. 17, n. 4, p. 342-8, 2009.

BASÍLIO, Marluci Lopes. Adaptação transcultural e propriedades de medida do Abilhand-Brasil: uma medida dehabilidade manual para indivíduos com hemiparesia.Dissertação (mestrado) – UFMG, 2015.

CAVACO, Natália Sperandio; ALOUCHE, Sandra Regina. Instrumentos de avaliação da função de membros superiores após acidente vascular encefálico: uma revisão sistemática. Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.17, n.2, p.178-83, Abr/jun. 2010.

KIZONY, Rachel; KATZ, Noomi; WEISS, Patrice L. Virtualreality based intervention in rehabilitation: relationship between motor and cognitive abilities and performance within virtual environments for patients with stroke. In:Proceedings of the 5th international conference on disability, virtual reality and associated technology. Oxford, UK. 2004.

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LUCCA, Lucia Francesca. Virtual reality and motor rehabilitation of the upper limb after stroke: a generation of progress?. J RehabilMed, v. 41, p. 1003-06, 2009.

MEDEIROS, etal.Os benefícios da inclusão da realidade virtual no tratamento fisioterapêutico de um paciente com traumatismo raquimedular: um estudo de caso.Boa Vista, n. 1, 2013.

MORAES,et al. A influência do fortalecimento muscular no desempenho motor do membro superior parético de indivíduos acometidos por Acidente Vascular Encefálico. ACTA FISIATR, v. 15, n. 4, p. 245-8, 2008.

SALIBA, et al. Propriedades psicométricas da motor Activity log: uma revisão sistemática da literatura.Fisioter. Mov., v. 21, n. 3, p. 59-67, Jul/set 2008.

SALIBA, et al. Adaptação transcultural e análise das propriedades psicométricas da versão brasileira do instrumento Motor Activity Log.Rev Panam Salud Publica, v. 30, n. 3, p. 262-71, 2011.

SAPOSNIK, et al. Effectiveness of Virtual Reality Using Wii Gaming Technology in Stroke Rehabilitation. A Pilot Randomized Clinical Trial and Proof of Principle. Stroke., v. 41, p. 1477-84, 2010; originallypublished online May 27, 2010;

SCHIAVINATO, et al. Influência do Wii Fit no equilíbrio de paciente com disfunção cerebelar: estudo de caso. J Health Sci Inst., v.28, n. 1, p. 50-2, 2010.

SOARES, et al. Dinamometria de preensão manual como parâmetro de avaliação funcional do membro superior de pacientes hemiparéticos por acidente vascular cerebral. Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.18, n.4, p.359-64, out/dez. 2011.

TEIXEIRA, Ilka Nicéia D’Aquino Oliveira. O envelhecimento cortical e a reorganização neural após o acidente vascular encefálico (AVE): implicações para a reabilitação. Ciência&SaúdeColetiva, v. 13, sup 2, p. 2171-2178, 2008.

TUROLLA, et al. Virtual reality for the rehabilitation of the upper limb motor function after stroke: a prospective controlled trial.Journal of Neuro Engineering and Rehabilitation, v. 10, p. 85, 2013.

VIAU, et al. Reaching in reality and virtual reality: a comparison of movement kinematics in healthy subjects and in adults with hemiparesis. J NeuroengineeringRehabil 2004; 1:. 11. Publicado on-line de 2004 dezembro de 14. doi: 10,1186 / 1743-0003-1-11.

  

ANEXOS

 

 INC 04 0801

INC 04 0802

 

NOTAS DE FIM

[i] Professora orientadora do Centro Universitário Newton Paiva. Email: renatalima.prof@newtonpaiva.br.

[ii] Graduandos do curso de fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva.

[iii] Graduandos do curso de fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva.

[iv] Graduandos do curso de fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva.