INC02 03 Avaliação da eficácia da combinação da paromomicina tópica com o fexinidazol oral no tratamento da leishmaniose cutânea experimental causada por Leishmania (Viannia) braziliensis

Líndicy Leidicy Alves1
Suely Lima Dias1
Eliane de Morais Teixeira2
Ana Lúcia Teles Rabello2
Lucas Antônio Miranda Ferreira3
Marta Marques Gontijo de Aguiar4

RESUMO: A leishmaniose tegumentar constitui um grave problema de saúde pública no Brasil, podendo ser encontrada em praticamente todos os estados. O tratamento convencional para essa doença utiliza compostos antimoniais de administração parenteral, desenvolvidos há mais de 60 anos, esses apresentam elevada toxicidade e taxa de abandono do tratamento pelos pacientes. O programa de Pesquisa de Doenças Tropicais da Organização Mundial de Saúde tem recomendado o desenvolvimento de tratamentos alternativos. A paromomicina tópica e o fexinidazol oral têm sido investigados separadamente. A associação desses dois fármacos aparenta ser interessante para o tratamento da leishmaniose tegumentar causada por espécies que provocam infecções disseminadas, como as encontradas no Brasil. Esse estudo busca avaliar a eficácia da combinação da paromomicina tópica com o fexinidazol oral a partir da infecção experimental de hamsters com L. (V.) braziliensis. Para avaliar a eficácia foram utilizados como parâmetros, o acompanhamento do diâmetro da lesão e a determinação da carga parasitária na lesão e no baço. Os animais foram inoculados com uma suspensão de amastigotas e tiveram o desenvolvimento das lesões monitorado. Os animais foram separados em quatro grupos: controle (sem tratamento), combinação paromomicina tópica com fexinidazol oral, paromomicina tópica e fexinidazol oral. Os animais foram tratados durante vinte dias consecutivos, recebendo o gel de paromomicina tópica duas vezes ao dia e a suspensão de fexinidazol oral uma vez ao dia. O maior diâmetro da lesão dos animais foi monitorado a cada sete dias, três dias após o final do tratamento, os animais foram eutanasiados, a lesão e o baço removidos e processados para posterior análise pela técnica de qPCR. A combinação paromomicina tópica com fexinidazol oral foi capaz de reduzir o diâmetro da lesão em relação aos grupos controle e paromomicina tópica (p<0,05), levando a redução de 100% das lesões, enquanto os fármacos isolados: paromomicina ou fexinidazol levaram a reduções inferiores. Houve redução significativa da carga parasitária na lesão, quando comparado, o grupo tratado com a combinação em relação a todos os outros grupos (p<0,05). Quanto à carga parasitária no baço, houve diferença estatística significativa entre a combinação e o grupo controle (p<0,05). Os resultados mostram que a combinação paromomicina tópica com fexinidazol oral foi eficaz no tratamento da leishmaniose causada pela espécie L. (V.) braziliensis, sendo uma alternativa promissora para o tratamento da leishmaniose tegumentar causada por esta espécie.

Palavras-chave: Leishmaniose Cutânea. Fexinidazol. Paromomicina.

ABSTRACT: The tegumentary leishmaniasis is a serious public health problem in Brazil, can be found in virtually all states. Conventional treatment for this disease uses of antimony compounds parenteral administration, developed over 60 years, these have high toxicity and rate of noncompliance by patients. The Research of Tropical Diseases of the World Health Organization has recommended the development of alternative treatments. The topical paromomycin and oral fexinidazole have been investigated separately. The combination of these two drugs appears to be interesting for the treatment of cutaneous leishmaniasis caused by species that cause disseminated infections, such as those found in Brazil. This study aimed to evaluate the effectiveness of combination of topical paromomycin with oral fexinidazole from the experimental infection of hamsters with L. (V.) braziliensis. To assess efficacy were used as parameters, monitoring of the diameter of the lesion and determination of parasite load in spleen and lesions. The animals were inoculated with a suspension of amastigotes and the development of the lesions was monitored. The animals were separated into four groups: control (no treatment), combination topical paromomycin with oral fexinidazole, topical paromomycin and oral fexinidazole. The animals were treated for twenty days consecutive, receiving paromomycin topical gel twice daily and oral suspension fexinidazole once. The largest diameter of the lesions of the animals was monitored every seven days, three days after the end of treatment, animals were euthanized, the spleen and the lesions removed and processed for analysis by qPCR technique. The combination topical paromomycin with oral fexinidazole was able to reduce lesion size compared with control and topical paromomycin groups (p ​​<0.05), leading to 100% reduction in lesions, whereas drug isolates: paromomycin or fexinidazole led to smaller reductions. A significant reduction of the parasite load in the lesion compared, the group treated with the combination compared to all other groups (p < 0.05). In case of parasite load in spleen, the significant difference was only observed in combination compared to the control group (p<0,05). The results show that the topical combination paromomycin with fexinidazole was effective in the treatment of leishmaniasis caused by species L. (V.) braziliensis, a promising alternative for the treatment of cutaneous leishmaniasis caused by this species.

 

Key-words: Cutaneous leishmaniasis. Fexinidazole. Paromomycin.

 

INTRODUÇÃO

As leishmanioses constituem um grupo de doenças causadas por várias espécies de protozoários do gênero Leishmania. Estas são clinicamente divididas em leishmaniose visceral (LV) e leishmaniose tegumentar (LT), a qual inclui as formas cutâneas (LC), mucosa e muco-cutânea (DESJEUX, 2004). Mundialmente distribuídas, as leishmanioses estão presentes em 88 países em quatro continentes e compreendem uma das seis endemias mundiais prioritárias da Organização Mundial da Saúde. Mais de 90% dos casos de LT ocorrem no Irã, Afeganistão, Síria, Arábia Saudita, Brasil e Peru. (WHO, 2013)

A LT nas Américas é causada principalmente pelas espécies L. (V.) braziliensis, L. (L.) amazonensis e L. (V.) guyanensis que produzem a forma clínica mais frequente, a LC, caracterizada por lesões cutâneas em áreas expostas do corpo tais como face, braços e pernas. Além disso, a infecção causada por espécies do sub-gênero Viannia pode evoluir para envolvimento da mucosa (LM). (MINODIER & PAROLA, 2007)

Os compostos antimoniais pentavalentes (Sbv), estibogluconato de sódio (PentostamTM) e antimoniato de meglumina (Glucantime®) vêm sendo utilizados como fármacos de primeira escolha para o tratamento das leishmanioses (FRÉZARD & DEMICHELI, 2010), embora evidências recentes demonstrem uma eficácia variável, dependendo das espécies, região geográfica, presença de cepas resistentes e esquema terapêutico (ROMERO et al., 2001; CROFT & COOMBS, 2003).

Assim, os fármacos, atualmente considerados como primeira escolha, estão longe de ser satisfatórios. As dificuldades relacionadas a aplicações injetáveis em seguimentos populacionais de baixo nível sócio-econômico e acesso restrito aos serviços de saúde constituem as principais causas de não adesão ao tratamento. Como fármacos alternativos estão disponíveis a anfotericina B e as pentamidinas, também de administração parenteral e alta toxicidade (AMATO et al, 2007).

A prática de combinação de fármacos é bastante usual e pode contribuir para aumentar a eficácia do tratamento e evitar o surgimento de resistência. No caso das interações medicamentosas para as doenças infecto-parasitárias, essa prática é empregada com sucesso para o tratamento de malária, tuberculose, AIDS, entre outras (GRIENSVEN, et al., 2010). Para as leishmanioses, estudos experimentais, in vivo, realizados com L. (L.) major e L. (L.) amazonensis têm demonstrado uma maior eficácia da combinação de fármacos e sugerido esta estratégia para a terapêutica clínica dessas doenças (AGUIAR et. al., 2009; AGUIAR et al., 2010).

A combinação de fármacos a partir de diferentes classes químicas pode reduzir a duração do tratamento ou doses totais, resultando em menos efeitos tóxicos e também reduzir o custo global direta e indiretamente (GRIENSVEN et. al., 2010). Isto é particularmente relevante para o tratamento da LC se considerada a possibilidade de que um dos fármacos possa ser administrado diretamente sobre a lesão, minimizando as reações adversas sistêmicas.

A paromomicina (PA), um antibiótico aminoglicosídeo, é o fármaco mais investigado para o tratamento tópico da LC. Estudos têm demonstrado que um gel tópico de PA foi efetivo no tratamento de camundongos infectados com L. (L.) major e L. (L.) amazonensis, assim como em hamsters infectados com L. (V.) braziliensis (GONÇALVES et. Al., 2005; MUSSI et. al., 2007). A associação do gel PA tópico com um fármaco de administração oral, a miltefosina, foi investigada experimentalmente e mostrou-se eficaz em reduzir tamanho de lesão e carga parasitária sistêmica de animais infectados com L. (L.) amazonensis e L. (L.) major (AGUIAR et al., 2009; AGUIAR et al., 2010).

O fexinidazol (Fex) é um antimicrobiano originalmente desenvolvido na década de 1980, pela Hoechst, apresentando atividade contra tripanosomas. Atualmente, o fexinidazol encontra-se em estudo clínico fase I, sendo previsto início da fase II para o tratamento da doença do sono na África (MASER et al., 2012).

Avaliação prévia in vitro do fexinidazol mostrou que seus metabólitos sulfóxido de fexinidazol e sulfonato de fexinidazol foram mais ativos em macrófagos murinos infectados com L. donovani. O estudo in vivo mostrou a atividade deste fármaco em camundongos infectados com L. donovani e tratados por cinco dias consecutivos por via oral.

Nesse estudo, a dose de 200mg/Kg/dia levou a uma redução de 98,4% carga parasitária no fígado (WYLLIE et al., 2012). O resultado desse estudo demonstrou o potencial do fexinidazol no tratamento da leishmaniose como fármaco para uso oral. Estudos prévios in vitro realizados no Laboratório de Pesquisas Clínicas do Centro de Pesquisas René Rachou tem demonstrado a atividade do fexinidazol contra as espécies de importância médica no Brasil (L. (L.) amazonensis, L. (V.) braziliensis e L. (L.) infantum chagasi – dados não publicados).

O conjunto destes resultados mostra que a PA tópica e fexinidazol oral apresentam eficácia, assim a combinação entre os dois fármacos poderia ser uma alternativa interessante para o tratamento da LC. Dessa forma, o objetivo desse trabalho é avaliar a eficácia da paromomicina (PA) tópica (gel) em associação com a fexinidazol oral em hamsters experimentalmente infectados com L. (V.) braziliensis através do acompanhando do tamanho da lesão em função do tempo e da determinação da carga parasitária na lesão e no baço através da técnica de qPCR.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Parasitas: L. (V.) braziliensis (MHOM/BR/75/M2903).

Animais: Hamsters (Mesocricetus auratus) machos pesando aproximadamente 100 g provenientes do Biotério do Centro de Pesquisas René Rachou – Fiocruz.

Meios de Cultura: meio Schneider (Sigma Chemical Co, St Louis, MO, USA), Soro fetal bovino (Gibco, Alemanha), solução contendo 100 UI penicilina potássica e 10 mg/ mL de sulfato de estreptomicina (Merck, Alemanha).

Fármacos e medicamento: Sulfato de Paromomicina 757 mg/mg (Antibióticos, Itália), Fexinidazol (Cetipharm), Glucantime® (Antimoniato de meglumina 300 mg/mL – Sanofi Aventis).

Reagentes: hidroxietilcelulose, propilenoglicol, metilparabeno, bissulfito de sódio, polissorbato 80

Infecção dos animais

Hamsters (Mesocricetus auratus) machos, pesando aproximadamente 100g foram tricotomizados na base da cauda e anestesiados (xilazina/ketamina). Estes animais foram inoculados por via subcutânea com uma suspensão de amastigotas (1×106/100mL) de L (V.) braziliensis recentemente isoladas. O desenvolvimento das lesões foi monitorado semanalmente com auxílio de paquímetro digital (Digimess-Brasil).

Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética no uso de animais (FIOCRUZ), protocolo número P- 36/2012 -2.

Preparo das formulações

Preparo do gel PA

Para o preparo do gel hidrofílico de PA, o metilparabeno (0,2%) foi solubilizado em propilenoglicol (10%) e em seguida esta solução foi adicionada à água destilada. A mistura foi aquecida a 70oC e, em seguida, o bissulfito de sódio (0,1%) e a hidroxietilcelulose (1,5%) foram adicionados. A mistura foi mantida sob agitação constante até formação do gel e completa dispersão do polímero. A PA (10%), previamente solubilizada em parte da água, foi adicionada após o resfriamento do gel, aos poucos sob agitação constante, até obtenção de uma preparação límpida (AGUIAR et al., 2010).

Preparo da suspensão oral de Fex

Para o preparo da suspensão do Fex (16 %), este foi pesado em tubo de 50mL. No mesmo tubo foi pesado o polissorbato 80 (1,5%). Foram adicionadas esferas de vidro no tubo e realizada homogeneização em vortex (Genie 2, EUA). Em seguida, o volume foi completado com água purificada e novamente homogeneizado em vortex. A suspensão foi mantida sob refrigeração por 7 dias.

Tratamentos

Após o desenvolvimento das lesões homogêneas (diâmetro médio das lesões em torno de 9mm), os animais foram divididos em quatro grupos (Controle, Fex + PA, PA e Fex) com quatro animais cada (n=4). Os tratamentos foram realizados por 20 dias consecutivos, sendo o gel de PA 10% administrado via tópica: duas vezes ao dia através de pipeta Eppendorff® (0,1 mL) tanto nos animais do grupo PA, quanto nos animais do grupo Fex + PA (AGUIAR et al., 2010). A suspensão de Fex 200mg/Kg/dia administrada via oral: uma vez ao dia através de gavagem (0,2 mL) tanto nos animais do grupo Fex, quanto nos animais do grupo Fex + PA, e o grupo controle não recebeu tratamento. A dose de Fex foi previamente determinada em estudos experimentais de dose resposta realizados no Laboratório de Pesquisas Clinicas do Centro de Pesquisas René Rachou – Fiocruz (dados não publicados).

Avaliação da eficácia dos tratamentos

Tamanho da lesão

Durante o tratamento o maior diâmetro das lesões foi monitorado por meio de medidas semanais com o paquímetro digital (Digimess/Brasil).

Avaliação da carga parasitaria

Os animais foram sacrificados em câmara de gás carbônico (CO2) três dias após o término do tratamento e, em seguida, a lesão e o baço foram removidos para determinação da carga parasitária. A lesão e o baço foram pesados, triturados (Ultra-turrax, IKA) em meio Schneider contendo 20% de soro fetal bovino e 10 mL/mL de solução contendo 100 UI penicilina potássica e 10 mg/mL de sulfato de estreptomicina.

Em seguida, a lesão e o baço foram centrifugados a 50g por dois minutos para sedimentação (IEC, Centra® GP8R). Os sobrenadantes foram separados e novamente centrifugados: a lesão a 1700g por 15 minutos e o baço a 1620g por 2 minutos (IEC, Centra® GP8R). Cada pellet foi ressuspendido em 1mL de meio de Schneider contendo 20% de soro fetal bovino e 10 mL/mL de solução contendo 100UI penicilina potássica e 10 mg/mL de sulfato de estreptomicina (AGUIAR et. aL; 2009).

Em seguida, o material foi congelado (-20º C) para posterior análise por técnica qPCR. A técnica de qPCR foi realizada através da extração do DNA total utilizando o kit QIAampÒ Mini (Qiagen – Alemanha). Para o ensaio de qPCR, foi utilizado como DNA alvo a pequena subunidade do gene RNA ribossomal (SSU rRNA). O ensaio qPCR Leishmania TaqMan 1X consistiu na amplificação dos primers LEIS.U1 0,3mM (5′-AAGTGCTTTCCCATCGCAACT-3′) e LEIS.L1 0,3mM (5′-GACGCACTAAACCCCCTCCAA-3′), desenhados para amplificar um fragmento de 67 pb e a sonda fluorogenic LEIS.P1 0,25mM (FAM-CGGTTCGGTGTGTGGCGCC TAMRA 5′-3′) (GOMES et al., 2012). O limiar de detecção e de linha de base foram determinados automaticamente usando o StepOne Software™ v2.1. A análise da curva Melt foi realizada por uma temperatura inicial de 95°C por 15 segundos, seguido de 60°C por minuto e aquecimento contínuo de 0,3°C/segundo a 95°C. A temperatura de fusão dos amplicons foi automaticamente determinada pela análise do software. As amostras de amplificação foram realizadas em duplicata em uma placa de 96 poços.

Cada placa possuiu um controle negativo que consiste na mistura da reação com água em vez de DNA amostral (GIULIETTI et al., 2001; RAMA et al., 2006). Diluições seriadas de plasmídeos recombinantes foram empregados para o ensaio, 160 cópias do gene SSU rRNA de Leishmania representaram uma única célula do parasito. A quantificação da carga parasitária foi determinada após a normalização dos dados (OVERBERGH et al., 1999, GOMES et al., 2012).

As reações foram padronizadas utilizando a curva padrão plasmidial de L. (V.) braziliensis e, como branco, foi utilizado uma amostra de pele e baço de um hamster saudável (REIMÃO et al.; 2011).

Análise estatística

A análise estatística foi realizada utilizando o programa Prism 4.0. Os dados obtidos para carga parasitária, na lesão e no baço, foram transformados em log +1 e submetidos ao teste de normalidade Kolmogovov-Smirnov (KS). Estes dados foram avaliados por análise de variância (ANOVA), e em caso de diferença estatística, os resultados foram submetidos ao teste de Tukey. Os diâmetros médios das lesões foram submetidos ao teste de normalidade Kolmogovov-Smirnov (KS). As diferenças observadas foram consideradas significativas quando o valor de p foi menor que 0,05.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Alternativas terapêuticas para o tratamento tópico ou oral das leishmanioses têm sido investigadas por oferecer vantagens em relação ao tratamento convencional. A associação de fármacos também é uma alternativa interessante, pois pode promover: aumento da atividade, prevenção do aparecimento de resistência e administração de doses menores, com consequente diminuição da toxicidade e dos custos (SEIFERT & CROFT, 2006).

Esse último fator é relevante no tratamento da leishmaniose cutânea, já que um dos fármacos pode ser administrado diretamente sobre a lesão, minimizando as reações adversas sistêmicas. A PA (gel) vem sendo amplamente pesquisada no tratamento da leishmaniose cutânea, estudos mostraram alta efetividade da nova formulação hidrofílica de PA a 10% contra diferentes espécies de leishmanias causadoras de LC (GONÇALVES et al., 2005; MUSSI et al., 2007), sendo sua eficácia foi maior do que o antimônio em camundongos infectados com L. (L.) amazonensis (GONÇALVES et al., 2005).

O fexinidazol tem se mostrado eficaz contra a doença do sono (MASER et al., 2012) e no tratamento via oral da leishmaniose experimental causada por L. donovani (WYLLIE, et al., 2012). Assim, a combinação entre os dois fármacos pode ser uma alternativa interessante para o tratamento da LC.

Para avaliar a eficácia da combinação do Fex oral com a PA tópica foram utilizados como parâmetros a medida do maior diâmetro da lesão (em mm) e a determinação da carga parasitária (mg/tecido ou órgão) na lesão e no baço.

A Figura 1 apresenta o diâmetro médio da lesão a partir do início do tratamento, em função do tempo. Do início até sete dias de tratamento não houve diferença estatística significativa no tamanho da lesão entre todos os grupos avaliados (Controle, combinação Fex + PA, PA e Fex) (p>0,05).

02 INC03_FIGURA01

Redução estatística significativa, no tamanho da lesão foi observada a partir do décimo quarto dia, após o início do tratamento, somente para o grupo de animais tratados com a combinação Fex + PA, quando comparado ao grupo controle (sem tratamento) (p<0,05) (FIG 1). No dia da eutanásia, a diferença estatística entre a combinação (Fex + PA) e o controle se manteve significativa (p<0,05) e a combinação apresentou redução estatística significativa também em relação ao grupo PA isolada. A combinação se mostrou tão eficaz quanto ao Fex isolado (p>0,05) na redução da lesão neste tempo (FIG 1). Entretanto, quando observada a redução percentual do diâmetro da lesão, no dia da eutanásia em relação ao tempo inicial do tratamento (Tabela 1), pode ser observado, que o Fex levou a uma pequena redução, enquanto a combinação (Fex + PA) levou a 100% de redução, com cicatrização completa da lesão em todos os animais.

 

02 INC03_tabela01

Um baixo percentual de redução da lesão nos animais tratados somente com PA tópica ou com o Fex oral pôde ser observada. A doença se mostra mais agressiva em animais infectados com amastigotas, quando comparada com aqueles infectados com promastigotas, e os resultados da terapia podem ser marcadamente influenciados por isso (GARNIER et al., 2007). No entanto, mesmo nesta condição a combinação Fex + PA mostrou-se eficaz, mostrando uma interação positiva na associação destes fármacos.

Quando avaliado o parâmetro carga parasitária na lesão, os animais infectados experimentalmente tratados com combinação Fex + PA apresentaram uma redução significativa, quando comparados àqueles tratados com regimes monoterápicos e ao controle (p<0,05) (FIG 2).

O presente estudo foi realizado em hamsters infectados por L. (V.) braziliensis, um dos agentes etiológicos da CL do Novo Mundo. No Novo Mundo, a CL pode ser associada com a disseminação de parasitas, uma situação que normalmente requer tratamento sistêmico (SCHRIEFER et al., 2008). A eficácia sistêmica da combinação Fex + PA também foi avaliada, através da determinação da carga parasitária no baço, foi possível verificar redução significativa quando comparado a combinação Fex + PA com o grupo controle (p<0,05) (FIG 3).

CONCLUSÃO

O tratamento convencional das leishmanioses apresenta alguns fatores que favorecem a não adesão, como o fato de os fármacos apresentarem alta toxicidade e aplicações injetáveis, além do acesso restrito da população de menor nível sócio-econômico aos serviços de saúde (AMATO et al., 2007). Diante dessa realidade, a associação de fármacos de uso oral ou tópico se torna interessante, contribuindo para o aumento da adesão ao tratamento, redução da resistência e toxicidade elevando, assim, a eficácia do tratamento (GRIENSVEN et al., 2010).

Em resumo, nossos dados mostraram que a combinação Fex oral + PA tópica proporciona uma maior eficácia no tratamento, por sua vez, apresenta uma atividade significativamente maior do que a observada para os regimes mononterápicos em Hamsters infectados por L. (V.) braziliensis, um dos principais agentes etiológicos da LC do Novo Mundo. Estes resultados sugerem que a combinação Fex oral + PA tópica representa uma alternativa promissora no tratamento da LC.

 

REFERÊNCIAS

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WHO – Disponível em: <www.who.int/neglected_diseases/diseases/en/> Acesso em: 28 jan. 2013.

NOTAS

1 Bolsistas de Iniciação Científica do Centro Universitário Newton Paiva.
2Pesquisadoras colaboradoras da pesquisa do Centro de Pesquisa René Rachou – Fiocruz.
3 Professor colaborador da pesquisa, docente da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
4Professora orientadora da pesquisa, docente do Centro Universitário Newton Paiva.