Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva

Bruno César Canola1

RESUMO: O presente artigo tem como principal objetivo discorrer sobre as incoerências e sobre a inaplicabilidade do Incidente de Uniformização n. 1.0704.09.136730-7/002, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que estabelece o imperativo de fixação da data do trânsito em julgado da nova sentença condenatória como marco inicial para concessão de novos benefícios da Execução Penal, após a decisão de soma/unificação de penas. Propõe-se, ao final, o afastamento do referido Incidente e a adoção, até o advento de uma mudança legislativa, do dispositivo criado pelos principais juízes com atuação na Execução Penal do Estado de Minas Gerais na Carta de Belo Horizonte, que prevê a adoção da data da última prisão como marco inicial, salvo marco temporal mais favorável ao apenado.

PALAVRAS-CHAVE: Execução Penal; Soma/Unificação; Marco Inicial; Incidente de Uniformização; Afastamento.

ABSTRACT: This paper has as main objective to discuss the inconsistencies and the inapplicability of Incident of Uniformity n. 1.0704.09.136730-7 / 002, from the Court of Justice of Minas Gerais, which established the imperative of fixing the date of the final and unappealable decision as a new starting point for granting new benefits on the Penal Execution, after the decision that sum/unifies the penalties. It is proposed, in the end, the remoteness of the incident and the adoption, until the advent of a legislative change, of the regulation created by the leading judges with expertise in Penal Execution of the State of Minas Gerais, called the Letter from Belo Horizonte, which establishes the adoption of the date of the last prison as the initial mark, unless there is a more favorable date to the convict.

KEYWORDS: Penal Execution; Sum/Unification; Initial Mark; Incident of Uniformity; Removal.

ÁREA DE INTERESSE: Direito Penal.

1. INTRODUÇÃO

Sobrevindo nova condenação no curso da Execução Penal, a pena da nova Guia de Execução deve ser somada/unificada ao restante do que está sendo cumprido, para a determinação do regime de cumprimento de pena, nos termos do parágrafo único do artigo 111 da Lei e Execuções Penais.

Ocorre que o referido dispositivo legal é omisso em relação a qual data deverá ser fixada como marco inicial para a concessão de novos benefícios.

Destarte, surgiu uma discussão acalorada na doutrina e na jurisprudência sobre qual deveria ser o marco inicial, especialmente com posicionamentos visando a adoção da data: do último recolhimento do sentenciado ao cárcere; da decisão de soma/unificação das penas; e do trânsito em julgado da nova condenação.

Nesse contexto, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais proferiu o Incidente de Uniformização n. 1.0704.09.136730-7/002, no qual estabeleceu a data do trânsito em julgado da nova sentença condenatória como marco inicial.

Entretanto, o Incidente de Uniformização não encontra respaldo na legislação e na realidade fática da Execução Penal.

2. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO

O Incidente de Uniformização proferido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em relação à fixação do marco inicial para análise dos futuros benefícios na decisão de Soma das Penas (n. 1.0704.09.136730-7/002), estabelece:

EMENTA: INCIDENTE DE UNIFORMIÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA – AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – UNIFICAÇÃO DE PENAS – MARCO INICIAL PARA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS DA EXECUÇÃO.

O marco inicial para a concessão de novos benefícios na execução penal, após a unificação das penas, será a data do trânsito em julgado da nova sentença condenatória, independente se o crime foi praticado antes ou após o início do cumprimento da pena.

Ocorre que o Incidente de Uniformização não uniformiza as decisões a serem proferidas.

Ou seja, o referido instrumento jurídico não tem a capacidade de realizar a função à que se dispõe.

Isso porque o Incidente simplesmente desconsidera a existência das Guias de Execução Provisórias, nas quais pode não haver trânsito em julgado, tanto para a acusação, como para a defesa.

A elaboração de Guia de Execução Provisória, quando for negado ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade da sentença condenatória, é determinação expressa do Conselho Nacional de Justiça (Resolução n. 113, do CNJ).

Assim, não é incomum que seja juntado aos autos Guia de Execução na qual não consta qualquer trânsito em julgado da nova condenação.

O Incidente de Uniformização não traz qualquer solução para estes casos, fazendo com que as decisões judiciais continuem a ser díspares.

Além disso, o referido Incidente de Uniformização desconsidera a existência de dois trânsitos em julgado distintos em toda condenação penal.

O trânsito em julgado para a acusação não se confunde com o trânsito em julgado para a defesa.

Diante da inexistência de recurso da acusação em face da sentença condenatória passa a existir uma imutabilidade dessa decisão em relação ao Ministério Público, e passa a vigorar o Princípio da non reformatio in pejus, que estabelece a proibição de alteração da decisão pelo órgão ad quem de modo a prejudicar o condenado.

Ou seja, a inexistência de recurso do Ministério Público resulta no trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação.

Já o trânsito em julgado para a defesa somente ocorrerá se não for apresentado recurso defensivo ou quando se esgotarem as possibilidades de recurso.

Deste modo, fica evidente que os trânsitos em julgado ocorrem em momentos distintos para a acusação e para a defesa, sendo certo que as Guias de Execução possuem campos específicos para o lançamento de cada uma das datas.

Nesse sentido, também não é incomum a juntada de Guia de Execução na qual houve somente um dos trânsitos em julgado (Ministério Público ou defesa).

Ocorre que o Incidente de Uniformização é omisso em relação a qual dos trânsitos em julgado deve ser utilizado como marco inicial para a contagem de novos benefícios na decisão de soma/unificação das penas (artigo 111, da Lei de Execuções Penais).

Nesse contexto, é simplesmente absurda a fixação da data do último trânsito em julgado como marco inicial.

No caso do último trânsito em julgado ser o da defesa, tal postura representa uma afronta direta ao Principio do Duplo Grau de Jurisdição, decorrente da garantia constitucional da ampla defesa, que proporciona a todos a possibilidade de reanálise de seu processo.

O princípio citado encontra seu fundamento constitucional do art. 5º, LV, da CF, e:

“Consiste em estabelecer a possibilidade de a sentença definitiva ser reapreciada por órgão de jurisdição, normalmente de hierarquia superior à daquele que a proferiu, o que se faz de ordinário pela interposição de recurso. Não é necessário que o segundo julgamento seja conferido a órgão diverso ou de categoria hierárquica superior a daquele que realizou o primeiro exame.” (NERY JUNIOR, Nelson. Princípios Fundamentais: Teoria Geral dos Recursos. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. P. 41).

Assim, ao exercer seu direito constitucional de recorrer da sentença condenatória proferida, o sentenciado estaria prejudicando em muito a sua Execução Penal.

Ou seja, tal previsão teria o condão perverso de dificultar o exercício regular de uma garantia constitucional.

Pior ainda é o caso em que o último trânsito em julgado é o da acusação.

Não parece aceitável que o marco inicial seja o trânsito para a acusação quando o condenado não recorreu da sentença condenatória.

Nesta situação, o sentenciado será extremamente prejudicado por algo que não deu causa, visto que não demonstrou o seu inconformismo diante da condenação.

Contudo, em face de sua omissão em relação ao qual dos trânsitos em julgado deve ser adotado como marco inicial, mais uma vez, o Incidente não consegue uniformizar as decisões a serem proferidas.

Por fim, o Incidente ainda é omisso na definição de qual seria a “nova sentença condenatória” visto que a última Guia de Execução juntada aos autos pode ter sido elaborada em razão da prática de um delito anterior ao início do processo executivo, inclusive com trânsito em julgado também anterior a um, ou a alguns, dos delitos já em execução.

Assim, apesar do Incidente estabelecer que deve ser adotada a data do trânsito em julgado da nova sentença condenatória, independente do delito juntado aos autos ter sido praticado antes ou depois do início do cumprimento da pena, com a ausência de previsão expressa sobre qual seria a nova sentença condenatória, surge a possibilidade do lançamento como marco inicial da data do trânsito em julgado de uma condenação já incluída na Execução Penal em andamento, simplesmente por ter ocorrido em data posterior ao trânsito em julgado do último delito juntado aos autos e, com isso, ser definida pelo juízo como a “nova sentença condenatória”.

Novamente, o sentenciado vai ser prejudicado por algo que não deu causa, visto que seu marco poderá ser postergado em razão da demora na elaboração da Guia de Execução.

Ou seja, mais uma vez, o Incidente não consegue uniformizar as decisões de soma/unificação das penas.

Pelo contrário, nestes casos, possibilita aos magistrados, com fundamento no próprio Incidente, a escolha aleatória da data mais prejudicial aos reeducandos, simplesmente desconsiderando que a decisão de soma das penas somente ocorreu em razão da juntada da nova/última Guia de Execução.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais adotou, na elaboração do Incidente de Uniformização, o posicionamento defendido pela maioria das decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça.

Entretanto, conforme demonstrado, o Incidente não tem amparo na realidade da Execução Penal.

O simples fato de existirem situações em que o Incidente não poderá ser aplicado (Guia de Execução sem trânsito em julgado) já demonstra, por si só, a sua ineficácia e inaplicabilidade.

Além disso, não há qualquer argumento jurídico para fundamentar a decisão proferida no Incidente de Uniformização.

O título executivo que fundamenta a existência da Execução Penal quando o sentenciado está preso não surge com o trânsito em julgado, mas sim com a sentença condenatória, conforme se comprova pela obrigação de expedição das Guias de Execução Provisórias (Resolução n. 113, do CNJ).

Ademais, com fundamento nas regras de detração e na existência das Execuções Provisórias, tem-se que o início do cumprimento da pena também não ocorre com o trânsito em julgado da condenação.

Ou seja, a partir da existência das Execuções Provisórias, o argumento para a fixação da data do trânsito em julgado como marco inicial nas decisões de soma das penas passou a ser exclusivamente extrajurídico.

Não se pretende adentrar na discussão acerca da necessidade, ou não, de endurecimento das leis penais e de Execução Penal.

Entretanto, o anseio de parcela da sociedade, de prolongamento do encarceramento dos condenados penalmente, não pode justificar a elaboração de uma decisão jurídica na qual não se vislumbra qualquer guarida legal.

Uma prova de todo o alegado é a realidade da Execução Penal na comarca de Ribeirão das Neves.

Antes do Incidente de Uniformização a magistrada titular da vara aplicava, como regra, a data da última prisão como marco inicial para análise dos benefícios futuros na decisão de soma das penas.

Após o advento do Incidente, a magistrada, apesar de ser signatária da Carta de Belo Horizonte, na qual os principais juízes da Execução Penal do Estado de Minas Gerais defendem a aplicação da data da última prisão como marco inicial, alterou a sua decisão.

Passou então a fixar como marco inicial a data do trânsito em julgado da última condenação para a acusação, visto que na grande maioria das vezes o Ministério Público não recorre das sentenças condenatórias proferidas.

Ocorre que a Vara de Execuções Penais de Ribeirão das Neves conta com a ajuda de magistrados auxiliares, sendo que um dos magistrados auxiliares não adota o posicionamento da magistrada titular.

Em suas decisões, o referido magistrado fixa como marco a data do último trânsito em julgado, prejudicando de maneira extrema os condenados que recorreram de suas sentenças condenatórias.

Assim, nem mesmo dentro de uma mesma Vara de Execuções Penais o Incidente de Uniformização consegue uniformizar as decisões.

Além disso, nas situações em que a data da última prisão é posterior à data do trânsito em julgado, os magistrados afastam a aplicação do Incidente e adotam como marco a data da última prisão, sob o argumento de que seria o marco mais adequado ao caso concreto, com fundamento nos princípios da proporcionalidade/razoabilidade.

Entretanto, o que não parece razoável é que o Incidente seja afastado nos casos em que a sua aplicação será mais benéfica ao sentenciado.

Tal conduta demonstra, apenas, o interesse em prolongar o encarceramento do reeducando.

E, com certeza, os princípios da proporcionalidade/razoabilidade não tem o condão de fundamentar decisões que prejudiquem os sentenciados.

Ante ao exposto, resta comprovada a inaplicabilidade do Incidente de Uniformização n. 1.0704.09.136730-7/002, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Vale destacar que o referido Incidente de Uniformização surgiu em razão da omissão da Lei de Execuções Penais e do Código Penal em relação ao marco a ser estipulado na decisão de soma/unificação das penas.

Contudo, conforme acima explicitado, o Incidente não tem aplicabilidade e nem coerência, além de não encontrar respaldo na legislação e na realidade da Execução Penal.

Diante de uma decisão de Soma/Unificação das Penas, o mais correto seria a adoção da data mais favorável ao sentenciado, analisando-se as características do caso concreto.

As regras de hermenêutica estabelecem que os princípios fundadores dos Direitos Fundamentais devem ser interpretados de maneira extensiva, sendo que todas as normas que visam limitar esses direitos devem ter aplicação restritiva.

Trata-se do princípio da interpretação “pro homine” dos Direitos Humanos, adotado tanto pela Organização dos Estados Americanos (OEA), no âmbito regional, como pela Organização das Nações Unidas (ONU), no âmbito global, e propagado a todos os Estados membros, dentre eles o Brasil.

O princípio da Interpretação “Pro Homine”, no âmbito regional, foi proveniente do artigo 29 do Pacto de San Jose de Costa Rica, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo 27, de 25.09.1992, e promulgada pelo Decreto 678 de 06.11.1992:

Art.29. CADH “Normas de Interpretação. Nenhuma disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido de:

  1. a) Permitir a qualquer dos Estados-partes, grupo ou indivíduo, suprimir o gozo e o exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista.
  2. b) Limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos em virtude de leis de qualquer dos Estados-partes ou em virtude de Convenções em que seja parte um dos referidos Estados.
  3. c) Excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo.
  4. d) Excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do homem e outros atos internacionais da mesma natureza”.

E, no âmbito global, do artigo 5º, do Pacto de Direitos Civis e Políticos de 1966:

Art. 5º. PIDCP “1. Nenhuma disposição do presente Pacto poderá ser interpretada no sentido de reconhecer a um Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de dedicar-se a quaisquer atividades ou de praticar quaisquer atos que tenham por objetivo destruir os direitos ou liberdades reconhecidos no presente Pacto ou impor-lhes limitações mais amplas do que aquelas nele previstas”.

Deste modo, com fundamento no princípio de interpretação “pro homine”, a norma a ser aplicada no caso concreto é a que mais amplia o gozo de um direito, uma liberdade ou uma garantia.

Conforme bem destacou Humberto Henderson:

“El principio pro homine tiene varias formas de aplicación, entre las que se destacan: En primer lugar, en los casos en los cuales está en juego la aplicación de varias normas relativas a derechos humanos, debe aplicarse aquella que contenga protecciones mejores o más favorables para el individuo. En segundo lugar, en casos en los cuales se está en presencia de una sucesión de normas, debe entenderse que la norma posterior no deroga la anterior si están consagra protecciones mejores o mayores que deben conservarse para las personas. En tercer lugar, cuando se trate de la aplicación de una norma, debe siempre interpretarse en la forma que mejor tutele a la persona”. (HENDERSON, Humberto, Los tratados internacionales de derechos humanos en el orden interno; la importancia del principio pro homine, Revista IIDH, Instituto Interamericano de Derechos Humanos, no. 39. San José, 2004, p.89).

A liberdade é uma garantia constitucional, devendo as normas vigentes serem interpretadas e aplicadas de maneira a ampliar a sua efetivação.

Deste feita, diante da inexistência de norma expressa acerca da data a ser considerada como marco na decisão de soma de penas, deve-se analisar o caso concreto e aplicar a interpretação que mais beneficie a pessoa privada de liberdade, com fincas de se buscar uma execução mais adequada, isonômica e humanitária, que se adeque às necessidades do condenado e às peculiaridades de seu caso, sob pena de inconcebível transgressão ao princípio constitucional da individualização da pena.

Nesse contexto, no caso de soma das penas em razão da juntada de Guia de Execução decorrente da prática de crime posterior ao início da Execução Penal, pelo qual o sentenciado permaneceu preso provisoriamente, o adequado seria a adoção da data da última prisão como marco inicial para análise dos benefícios futuros.

Isso porque, desde a última prisão o sentenciado encontra-se em efetivo cumprimento de pena, não podendo o período de prisão cautelar ser desconsiderado para fins de progressão de regime.

A legislação penal, com a alteração promovida pela Lei 12.736/2012, passou a estabelecer, no parágrafo 2º, do artigo 387, do Código de Processo Penal, que: “O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”.

Assim, não faz qualquer sentido que o tempo de prisão provisória seja computado como pena cumprida, em razão do instituto da detração, seja considerado para que o juízo da condenação estabeleça o regime inicial de cumprimento de pena, em razão de previsão expressa no art. 387, § 2º, do CPP, e seja simplesmente ignorado quando o juízo da Execução for proferir a decisão de Soma/Unificação das Penas.

Por óbvio, se o tempo da prisão preventiva é avaliado para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, ele também deverá ser utilizado como pena cumprida no regime mais gravoso, ou seja, como marco para análise dos benefícios futuros na decisão de soma/unificação das penas.

Todavia, no caso da Guia de Execução juntada aos autos ser por delito anterior à última condenação já em Execução Penal, estando o sentenciado preso, o correto seria a adoção da regra acima explicitada, de adoção da data mais benéfica ao apenado, analisando-se às peculiaridades do caso concreto.

Entretanto, sendo necessária a adoção de uma regra definida, visando a uniformização das decisões judiciais, o mais adequado seria fixação da data da formação do título executivo como marco, desde quando, com a expedição da Guia de Execução, surge a competência da Execução Penal.

Para averiguação da data de formação do título executivo deve-se analisar se o condenado respondeu solto, ou permaneceu preso durante o andamento do processo criminal que deu origem à Guia de Execução juntada aos autos.

Tendo respondido solto, a Guia de Execução somente será expedida após o trânsito em julgado final da condenação, com o cumprimento do Mandado de Prisão.

Agora, se o apenado permaneceu preso durante o processo, o título Executivo terá origem na sentença condenatória, com a expedição de Guia de Execução Provisória.

Assim, no primeiro caso, o marco será a data do trânsito em julgado, enquanto que no segundo caso, será a data da sentença condenatória.

Por fim, tendo sido juntada Guia de Execução por fato anterior à última condenação já em Execução Penal, estando o sentenciado solto, o apropriado é a adoção da data da última prisão como marco (cumprimento do mandado de prisão), desde quando teve início a Execução Penal da Guia de Execução juntada aos autos.

Ademais, não se pode admitir que existam situações em que o marco adotado seja a data do trânsito em julgado de uma Guia já em Execução, simplesmente por ser posterior à data do trânsito em julgado da “nova sentença condenatória” (última Guia de Execução juntada aos autos).

A Decisão de Soma/Unificação das Penas somente ocorre em razão da juntada de uma nova guia de Execução, não podendo ser permitida a escolha aleatória de um marco, para prejudicar o sentenciado.

Por fim, também não se pode admitir o afastamento do Incidente de Uniformização quando a sua aplicação for mais benéfica ao sentenciado, ainda mais com o argumento de que seria a decisão mais adequado ao caso concreto, com fundamento nos princípios da proporcionalidade/razoabilidade.

3. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, tem-se somente ocorrerá uma pacificação nas decisões quando houver uma alteração na legislação visando prever expressamente o marco a ser empregado na soma/unificação de penas.

Contudo, em face da complexidade de se adotar uma única data como marco inicial para averiguação dos benefícios futuros na decisão de soma/unificação das penas, propõe-se a utilização do texto produzido pelos magistrados com atuação na Execução Penal do Estado de Minas Gerais, quando da elaboração da Carta de Belo Horizonte (resultado do trabalho do grupo de juízes que participaram do Curso:

“Aspectos da Execução das Penas Privativas de Liberdade, Restritivas de Direitos e Medidas de Segurança”, promovido pelo Programa Novos Rumos do TJMG, em parceria com a Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes): Para efeito de soma ou unificação de penas, será observada, como marco para novos benefícios, a data da última prisão, salvo marco temporal mais favorável ao apenado”.

Apesar de alguns dos próprios signatários da Carta de Belo Horizonte não aplicarem a previsão supracitada em suas decisões, tem-se que o referido dispositivo contempla todas as situações da melhor maneira possível, estando em conformidade com as normas infraconstitucionais e com os princípios constitucionais norteadores da Execução Penal.

4 . REFERÊNCIAS 

– CARTA DE BELO HORIZONTE, obtida no endereço eletrônico: http://www.tjmg.jus.br/portal/imprensa/noticias/juizes-elaboram-carta-de-belo-horizonte.htm#.VCNJgCemWTo.

– HENDERSON, Humberto, Los tratados internacionales de derechos humanos en el orden interno; la importancia del principio pro homine, Revista IIDH, Instituto Interamericano de Derechos Humanos, no. 39. San José, 2004.

– NERY JUNIOR, Nelson. Princípios Fundamentais: Teoria Geral dos Recursos. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

– RESOLUÇÃO Nº 113, de 20 de abril de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), obtida no endereço eletrônico: http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/323-resolucoes/12231-resolucao-no-113-de-20-de-abril-de-2010.

NOTA DE FIM

1 Defensor Público do Estado de Minas Gerais; Mestre em Direito Obrigacional pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Franca – SP. Especialista em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Estado do Paraná; Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). E-mail: bruno.canola@defensoria.mg.gov.br