Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva

Cláudio Jannotti da Rocha1
Mirella Karen de Carvalho Bifano Muniz2
 

RESUMO: O presente artigo analisa as transformações estruturais nas relações de emprego durante a pós-modernidade, principalmente pelo processo da globalização, terceira revolução industrial, mudança do sistema taylorista/fordista para o toyotista de produção e a internacionalização do mercado produtivo, que modificou parcialmente o trabalho assalariado tradicional, prestado no centro das atividades do empregador, através dos avanços do desenvolvimento tecnológico, para a residência do empregado ou em qualquer outro local a sua escolha, ensejando assim o intitulado teletrabalho. Essa nova modalidade não descaracteriza a relação de emprego e nem impede o exercício do poder empregatício, bem como a subordinação e o controle de jornada, ocasionando assim o recebimento dos consectários direitos trabalhistas. 

PALAVRAS-CHAVE: Direito do Trabalho – Teletrabalho – Subordinação – Poder Empregatício – Jornada de trabalho. 

SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. A figura do teletrabalho; 3. A Lei 12.551/2011 e a alteração do artigo 6º da CLT; 4. A configuração da relação de emprego e o teletrabalho: subordinação e poder empregatício; 5. O teletrabalho e o controle de jornada; 6. Considerações Finais; Referências. 

ÁREA DE INTERESSE: Direito do Trabalho

 

1. INTRODUÇÃO

A partir da segunda metade do século XX, inicia-se a dita pós-modernidade (termo ainda não uníssono, tendo em vista, por exemplo, que o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, prefere usar a expressão modernidade líquida, enquanto o filósofo francês Gilles Lipovetsky menciona o termo hiper-modernidade), iniciou um processo cultural, científico e técnico sem precedentes na humanidade. O mundo passou a acompanhar mudanças e incertezas, nada sutis, na economia e política neoliberais, além do progresso tecnológico da informação e comunicação, de clara repercussão global, cujos tentáculos também se imiscuíram nas relações trabalhistas.

Com a modernização das relações de trabalho decorrente do contínuo e acelerado avanço das tecnologias (terceira revolução industrial, denominada de robótica), uma nova modalidade de trabalho emergiu no mundo jurídico: o teletrabalho.

Nessa toada, em razão da complexidade organizacional de uma algumas empresas, concomitantemente à inserção de novas tecnologias nas atividades laborativas, tal como a rede mundial de computadores, fez-se necessário o distanciamento do local da prestação dos serviços pelo empregado, daquela do estabelecimento físico do empregador; não significando, todavia, o afastamento do controle e comando próprios do poder diretivo. Em outras palavras, o trabalho material encontra-se fisicamente cada vez mais distante do trabalho imaterial, porém a subordinação e controle estão mais incisivos e eficazes, através dos meios telemáticos e informatizados.

Destarte, o presente artigo analisa esta nova modalidade empregatícia e sua inserção na ordem jurídica pátria, com o advento da Lei nº12.551/2011 que alterou a redação do art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho.

 

2. A FIGURA DO TELETRABALHO

Na acepção etimológica, o vocábulo teletrabalho constitui um neologismo por duas palavras: tele, de origem grega, que significa “longe, ao longe, ou longe de” e trabalho, originada do latim tripalium, que é uma espécie de instrumento de tortura ou canga (peça de madeira que prende os bois pelo pescoço e os liga ao carro ou ao arado) que pesava sobre os animais (CUNHA, 1982, p. 760).

No mercado produtivo, o teletrabalho constitui modalidade de trabalho viabilizada pela tecnologia da informação e da comunicação, importando não apenas em supressão de barreiras geográficas, mas também otimizando o relacionamento entre empregado e empregador, além de diminuir os custos da produção, uma vez que, de regra, é desenvolvido fora da estrutura física tradicional do tomador do serviço.

O teletrabalho pode ser considerado como a prestação de serviços a qualquer título, desde que seja à distância, ou externado, com a utilização dos instrumentos de informática ou telemática, em favor de outrem.

Importante destacar, que tanto a doutrina como a jurisprudência evitam conceituar o teletrabalho de forma incisiva e fechada, tendo em vista que esta modalidade de trabalho abrange qualquer tipo de trabalho realizado a fora da empresa, através dos instrumentos de informática ou telemáticos.

Na análise de Alice Monteiro de Barros, o teletrabalho é considerado como modalidade especial de trabalho a distância. Destaca a autora que constitui novo tipo de trabalho descentralizado, realizado no domicílio do trabalhador ou em centros satélites fora do estabelecimento patronal, mas em contato com ele ou em outro local, de uso público. Acrescenta:

Aliás, essa nova forma de trabalhar poderá ser também transregional, transnacional e transcontinental. Esse tipo de trabalho permite até mesmo a atividade em movimento. Ele é executado por pessoas com média ou alta qualificação, as quais se utilizam da informática ou da telecomunicação no exercício das atividades (BARROS, 2009, p. 327).     

No entendimento de Rodrigues Pinto:

Seu melhor conceito é o de uma atividade de produção ou de serviço que permite o contato a distância entre o apropriador e o prestador da energia pessoal. Desse modo, o comando, a execução e a entrega do resultado se completarão mediante o uso da tecnologia da informação, sobretudo a telecomunicação e a informática, substitutivas da relação humana direta (RODRIGUES PINTO, 2007, p. 133). 

De acordo com Solange Ines Biesdorf, o teletrabalho pode assumir as seguintes feições, de acordo com o critério locativo:

a) teletrabalho em domicílio: quando realizado no próprio domicílio do trabalhador, podendo ser assim considerado, nesta modalidade, outro local, como um ambiente familiar que não constitua o seu domicílio efetivo.

b) teletrabalho em telecentros: quando os trabalhadores compartilham estruturas físicas tecnicamente preparadas para a realização do teletrabalho, fora da sede da empresa, podendo ser utilizados, inclusive, por trabalhadores de empresas diversas.

c) teletrabalho móvel: também denominado nômade ou itinerante, caracteriza-se pela indeterminação do posto de trabalho, podendo ser realizado em qualquer lugar, mediante a disponibilidade de equipamento de mídia eletrônica, como os telefones celulares, que permitem a transmissão de dados e de imagens em alta velocidade. Segundo Fincato, pode-se afirmar ser esta “a máxima expressão do teletrabalho, aquela em que um sujeito trabalha onde quer ou precisa” (BIESDORF, 2011, p. 25). 

Pode-se afirmar que o trabalho à distância é o gênero. Entre suas espécies há o trabalho em domicílio e o teletrabalho. O trabalho em domicílio pode ser feito por meio de teletrabalho, conforme retratado acima.

Destarte, todo trabalho é considerado trabalho à distância, mas nem todo trabalho à distância pode ser considerado teletrabalho. O trabalho a domicílio também é um trabalho à distância, mas pode usar tecnologia ou não.

                 

3. A LEI 12.551/2011 E A ALTERAÇÃO DO ARTIGO 6º DA CLT

Inquestionavelmente que a informática alterou significativamente o mundo em muitos aspectos, dentre eles e especificamente para este artigo, destacam-se as modificações ocorridas no mundo do trabalho.

O uso dos meios telemáticos e informatizados no mercado produtivo, ao mesmo tempo que extirparam algumas profissões, criaram outras, como o teletrabalho que surgiu da utilização destas novas tecnologias. Esta alteração possui tamanha importância que a Organização Internacional do Trabalho, passou a tratar deste tema através da Convenção nº 177.

Tendo em vista que o teletrabalho é fruto das transformações iniciadas no século XX, até o ano de 2011, no Brasil, o assunto ainda não tinha sido objeto do Poder Legislativo, que até então era silente quanto a esta matéria. Mesmo diante desta lacuna legislativa, a questão da existência ou não do vínculo empregatício chegou aos Tribunais Regionais do Trabalho ao longo de todo território nacional, sendo que o pensamento predominante (senão uníssono), era no sentido de considerar possível a existência do vínculo empregatício no teletrabalho. Especificamente quanto ao posicionamento do Egrégio Tribunal Regional da 3ª Região:

RELAÇÃO DE EMPREGO. A prestação de serviços na residência do empregado não constitui empecilho ao reconhecimento da relação de emprego, quando presentes os pressupostos exigidos pelo artigo 3º da CLT, visto que a hipótese apenas evidencia trabalho em domicílio. Aliás, considerando que a empresa forneceu equipamentos para o desenvolvimento da atividade, como linha telefônica, computador, impressora e móveis, considero caracterizada hipótese de teletrabalho, visto que o ajuste envolvia execução de atividade especializada com o auxílio da informática e da telecomunicação” (TRT – 3ª R – RO 977/2009-129-03-00.7 – Rel. Jesse Claudio Franco de Alencar – DJe 26/11/2009 – p. 97). 

No mesmo sentido, entendia o Colendo Tribunal Superior do Trabalho:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. HOME OFFICE: ENQUADRAMENTO E EFEITOS JURÍDICOS. OUTROS TEMAS: SUBSTITUIÇÃO. ACÚMULO DE FUNÇÕES. HORAS EXTRAS. ADICIONAL NOTURNO. HORAS DE SOBREAVISO. FÉRIAS INTERROMPIDAS. DECISÃO DENEGATÓRIA. MANUTENÇÃO. O teletrabalho e o trabalho em domicílio (home office) tornaram-se frequentes nas últimas décadas em face da invenção, aperfeiçoamento e generalização de novos meios comunicacionais, ao lado do advento de novas fórmulas organizacionais e gerenciais de empresas e instituições. Isso não elimina, porém, necessariamente, a presença de subordinação na correspondente relação socioeconômica e jurídica entre o trabalhador e seu tomador de serviços, desde que ultrapassado o conceito tradicional desse elemento integrante da relação empregatícia em favor de sua dimensão objetiva ou, até mesmo, em favor do conceito de subordinação estrutural. Dentro deste novo, moderno e atualizado enfoque da subordinação, os trabalhadores em domicílio, mesmo enquadrando-se no parâmetro do home office, podem, sim, ser tidos como subordinados e, desse modo, efetivos empregados. Não obstante, não se pode negar que, de maneira geral, em princípio, tais trabalhadores enquadram-se no tipo jurídico excetivo do art. 62 da CLT, realizando o parâmetro das jornadas não controladas de que fala a ordem jurídica trabalhista (art. 62, I, CLT). Por outro lado, a possibilidade de indenização empresarial pelos gastos pessoais e residenciais efetivados pelo empregado no exercício de suas funções empregatícias no interior de seu home office supõe a precisa comprovação da existência de despesas adicionais realizadas em estrito benefício do cumprimento do contrato, não sendo bastante, em princípio, regra geral, a evidência de certa mistura, concorrência, concomitância e paralelismo entre atos, circunstâncias e despesas, uma vez que tais peculiaridades são inerentes e inevitáveis ao labor em domicílio e ao teletrabalho. Finalmente, havendo pagamento pelo empregador ao obreiro de valores realmente dirigidos a subsidiar despesas com telefonemas, gastos com informática e similares, no contexto efetivo do home office, não têm tais pagamentos natureza salarial, mas meramente instrumental e indenizatória. Na mesma linha, o fornecimento pelo empregador, plenamente ou de modo parcial, de equipamentos para a consecução do home office obreiro (telefones, microcomputadores e seus implementos, etc.) não caracteriza, regra geral, em princípio, salário in natura, em face de seus preponderantes objetivos e sentido instrumentais. Agravo de instrumento desprovido” (TST − 6ª T − AIRR 62141-19.2003.5.10.0011 − Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado – DJ 16/4/2010). 

Dada a ausência de normatividade acerca do tema e os constantes conflitos submetidos à apreciação da Justiça do Trabalho, em 2011 passou a vigorar a Lei 12.551, dando nova redação ao artigo 6◦ da CLT:

Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. 

A Lei nº 12.551/2011 surgiu para regulamentar o uso de novas tecnologias nas relações de emprego, sobretudo no que atine à supervisão do trabalho, que ganhou novas perspectivas na contemporaneidade. Foi essa, inclusive, a justificativa utilizada pelo deputado Eduardo Valverde, autor do Projeto de Lei nº 3129/2004, que deu origem a norma em comento, veja-se:

A revolução tecnológica e as transformações do mundo do trabalho exigem permanentes transformações da ordem jurídica com o intuito de apreender a realidade mutável. O tradicional comando direto entre o empregador ou seu preposto e o empregado, hoje cede lugar, ao comando à distância, mediante o uso de meios telemáticos, em que o empregado sequer sabe quem é o emissor da ordem de comando e controle. O Tele-Trabalho é realidade para muitos trabalhadores, sem que a distância e o desconhecimento do emissor da ordem de comando e supervisão, retire ou diminua a subordinação jurídica da relação de trabalho. 

A norma em comento amplia o espectro de normatividade do art. 6º da CLT, equiparando os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão aos meios pessoais e diretos; configurando aqueles como forma de subordinação.

A nova redação do caput do artigo 6º da CLT estabeleceu que não há distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o realizado no domicílio do empregado ou a distância. De fato, essa alteração não pode ser considerada como uma inovação no meio jurídico trabalhista, afinal, conforme visto acima, a posição da jurisprudência era pela possibilidade da existência do vínculo empregatício no teletrabalho, tendo em vista que a presença física do trabalhador no estabelecimento do empregador jamais foi um dos requisitos necessários à caracterização da relação empregatícia. Tanto é assim, que já era possível, pela antiga redação, o reconhecimento do vínculo empregatício em favor daqueles que prestam serviços em domicílio, desde que presentes os pressupostos que caracterizam a relação de emprego, embora acrescentando na nova redação a expressão “trabalho realizado a distancia”.

Urge salientar que a Lei nº 12.551/2011, inclusive efetiva a própria carga teleológica da Consolidação das Leis do Trabalho, que é justamente abarcar o maior número de trabalhadores possível, para assim ofertar aos seus jurisdicionados o manto protetivo do Direito do Trabalho (com os consectários direitos trabalhistas), bem como, arrecadar para o erário público grande quantidade de numerário e assim ajudar no financiamento da Seguridade Social. E assim, todos saem ganhando, o trabalhador, a Administração Pública e a sociedade em geral. Pode-se perceber que esta norma, demonstra o caráter expansionista do ramo justratrabalhista, no Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, tratar-se-á em seguida dos elementos necessários para a configuração da relação de emprego com o teletrabalhador.

 

4. A CONFIGURAÇÃO DA RELAÇÃO DE EMPREGO E O TELETRABALHO: SUBORDINAÇÃO E PODER EMPREGATÍCIO.

Dentre as diversas formas de prestação de trabalho (transformação da natureza de forma voluntária e consciente), desponta a relação de emprego como a espécie com maior potencial de conferir direitos e garantias trabalhistas, inclusão social, melhoria da condição socioeconômica do trabalhador e distribuição de renda. Assim, o empregado possui um rol de direitos maior quando comparado a outras categorias de trabalhadores (trabalhador autônomo, eventual, doméstico, entre outros), capazes de fomentar a cidadania através do trabalho realizado.

      Na lição de Maurício Godinho Delgado (2013, p. 281), “o fenômeno sócio-jurídico da relação de emprego deriva da conjugação de certos elementos inarredáveis (elementos fático-jurídicos), sem os quais não se configura a mencionada relação”.

Da combinação dos artigos 2º e 3º da CLT são retirados os 5 elementos caracterizadores da relação de emprego: prestação de trabalho por pessoa física; prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; de modo não eventual; com onerosidade e sob subordinação ao tomador de serviços.

A prestação de serviços que o Direito do Trabalho toma em consideração é aquela pactuada por uma pessoa física. Os bens jurídicos tutelados pelo Direito do Trabalho (vida, saúde, integridade moral, bem-estar, lazer, segurança) importam à pessoa física, não podendo ser usufruídos por pessoas jurídicas. Assim, a figura do trabalhador há de ser, sempre, uma pessoa natural.

A pessoalidade significa que o é aquela pessoa física escolhida quem deve executar o serviço contratado porque o contrato de trabalho é intransmissível. Assim, o empregado não pode, quando bem entender, mandar o amigo, o vizinho no seu lugar para trabalhar.

A não-eventualidade é caracterizada na medida em que, para que haja relação empregatícia é necessário que o trabalho prestado tenha caráter de permanência, não se qualificando como trabalho esporádico.

No que diz respeito à onerosidade, a relação empregatícia é uma relação de essencial fundo econômico. Desse modo, a força de trabalho colocada à disposição do empregador deve corresponder uma contrapartida econômica em benefício obreiro, consubstanciada no conjunto salarial.

Por fim, a subordinação é o elemento que ganha maior proeminência na conformação do tipo legal da relação empregatícia, considerada como a pedra de toque, elemento fundante, diferenciador. A subordinação é o elemento principal de diferenciação entre a relação de emprego e o trabalho autônomo.

Nesse sentido, jurisprudência do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região:

 EMENTA: CONTRATO DE EMPREGO – TRABALHO AUTÔNOMO – O trabalho do homem livre acompanhou o movimento pendular da economia, segundo a tendência de cada época – liberal ou intervencionista. O trabalho subordinado e o trabalho autônomo foram, durante séculos, os pontos extremos de uma mesma linha, na qual se inseriram obrigatoriamente os diversos fatores da produção, inclusive o custo da mão-de-obra. Durante cerca de cinquenta anos viu-se, no Brasil, por força da CLT, a progressiva aglutinação jurídica em torno do trabalho subordinado, fruto até de uma exigência do sistema fordista da produção. Nos últimos anos, contudo, tem-se presenciado um forte movimento em sentido inverso, em decorrência das substanciais mudanças na forma de prestação de serviços – teletrabalho, microinformática, robotização, trabalho a domicílio – sem que se atente para o determinismo do art. 3o. da CLT. Neste contexto, se o trabalho não eventual é prestado com pessoalidade, por pessoa física, com onerosidade, resta ao intérprete examinar a subordinação. Esta, cada vez mais, vem se diluindo diante da quebra da estrutura hierárquica da empresa fordista e suas características deslocaram-se da esfera subjetiva para a esfera objetiva, sem se falar que a desprestigiada dependência econômica volta a ganhar importância. Preenchidos estes pressupostos, o contrato de emprego se assume por inteiro. (TRT da 3.ª Região; Processo: RO – 9336/04; Data de Publicação: 07/08/2004; Órgão Julgador: Quarta Turma; Relator: Luiz Otavio Linhares Renault; Revisor: Fernando Luiz G.Rios Neto). 

No que tange à subordinação, Maurício Godinho Delgado aduz com brilhantismo que:

Subordinação deriva de sub (baixo) e ordinare (ordenar), traduzindo a noção etimológica de estado de dependência ou obediência em relação a uma hierarquia de posição ou de valores. Nessa mesma linha etimológica, transparece na subordinação uma ideia básica de “submetimento, sujeição, ao poder de outros, às ordens de terceiros, uma posição de dependência”.

A subordinação corresponde ao polo antiético e combinado do poder de direção existente no contexto da relação de emprego. Consiste, assim, na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado compromete-se a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços. Traduz-se, em suma, na “situação em que se encontra o trabalhador, decorrente da limitação contratual da autonomia de sua vontade, para o fim de transferir ao empregador o poder de direção sobre a atividade que desempenhará” (DELGADO, 2013, p. 293). 

Pela visão clássica do conteúdo da subordinação, o empregado deve prestar serviços ao empregador sob o rígido poder de direção deste. Assim, a subordinação se caracteriza com a presença constante e forte de ordens específicas e diretas  do empregador ou de seus prepostos, com fiscalização assídua destes, podendo o empregado eventualmente sofrer punição disciplinar.

Vólia Bomfim Cassar assinala bem que:

A subordinação está sempre presente na relação de emprego, algumas vezes mais intensa; outras de modo menos intenso. Quanto mais o empregado sobe na escala hierárquica da empresa, ou quanto mais técnico ou intelectual o trabalho, normalmente a subordinação fica mais tênue, frágil. Contrariamente, quando o empregado exerce uma função subalterna, de baixa hierarquia na empresa ou quando é revertido do cargo de confiança para a função efetiva, a subordinação se intensifica.

O trabalho externo pode tornar a subordinação menos intensa, pois o empregado fica longe dos olhos do patrão, salvo quando o trabalhador é controlado ou fiscalizado por telefone, rádio, pela internet ou por qualquer meio telemático ou informatizado (CASSAR, 2012, p. 267). 

Partindo da insuficiência do conceito clássico de subordinação, no sentido de albergar as novas formas de relação de emprego, surgiram novos conceitos acerca do instituto, como a estrutural, a integrativa e a reticular. Especificamente quanto a estrutural, desenvolvida por Maurício Godinho Delgado, informa-se:

Se expressa pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento. Nesta dimensão da subordinação, não importa que o trabalhador se harmonize (ou não) aos objetivos do empreendimento, nem que receba ordens diretas das específicas chefias deste: o fundamental é que esteja estruturalmente vinculado à dinâmica operativa da atividade do tomador de serviços (DELGADO, 2013, p. 296).

Quanto a subordinação integrativa, criada por Lorena Vasconcelos Porto:

A subordinação, em sua dimensão integrativa, faz-se presente quando a prestação de trabalho integra as atividades exercidas pelo empregador e o trabalhador não possui uma organização empresarial própria, não assume verdadeiramente os riscos de predas ou de ganhos e não é o proprietários dos frutos de seu trabalho, que pertencem, originariamente, a organização produtiva alheia para a qual presta sua atividade (PORTO, 2009, p. 253). 

Percebe-se, portanto, que o instituto da subordinação está intimamente ligado ao poder diretivo do empregador sobre seu empreendimento e, em sua forma mais tradicional, se dá por ordens e fiscalização diretas do empregador e/ou seus prepostos sobre a atividade desenvolvida pelo empregado.

O poder diretivo é o poder de dirigir a organização da estrutura e do espaço interno da empresa, bem como o processo de trabalho, pelo qual o empregador comanda a energia de trabalho do empregado no sentido que melhor lhe aproveite. É em razão deste poder diretivo se concentrar na figura do empregador que há, na relação de emprego, a característica da alteridade, ou seja, a assunção de todos os riscos e proveitos do empreendimento pelo empregador.

Os limites basilares do poder diretivo fundam-se especialmente no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, aliado aos objetivos fundamentais da República, relativamente à construção de uma sociedade livre, justa e solidária e à promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, sexo, idade ou quaisquer outras formas de discriminação.

Trazendo esses conceitos para o teletrabalho, à bem da verdade, o empregador não renuncia o controle sobre as atividades do teletrabalhador, apenas o realiza pelos meios informatizados e/ou telemáticos ou até mesmo através dos resultados produzidos por este. Salienta-se ainda que atualmente com as recentes invenções o empregador possui pleno (ou o devido) controle sobre o empregado que encontra-se a distância, sabendo inclusive quando este esta trabalhando ou não.

Alice Monteiro de Barros pondera que:

No trabalho a distância, do qual o teletrabalho é modalidade, o controle alusivo ao poder de direção poderá se apresentar com maior ou menor intensidade, tomando a subordinação jurídica a denominação de telessubordinação, que poderá manifestar-se durante a execução do trabalho ou, mais comumente, em função do seu resultado. Afirma-se, até mesmo, que o controle da atividade é substituído pelo controle do resultado (BARROS, 2009, p. 331).

Continua a doutrinadora, com a precisão de sempre:

Se o trabalhador se encontra, por exemplo, em conexão direta e permanente, por meio do computador, com o centro de dados da empresa, o empregador poderá fornecer instruções, controlar a execução de trabalho e comprovar a qualidade e a quantidade de tarefas de forma instantânea, como se o empregado estivesse no estabelecimento do empregador. A internet permite, inclusive, aferir o tempo de conexão do terminal do empregado, bem como quando foi acessado pela última vez o teclado. Esse controle revela, sem dúvida, a subordinação jurídica, que poderá estar presente ainda quando a execução do serviço seja desconectada (off line). Tudo irá depender da análise do programa de informática utilizado (BARROS, 2009, p. 331). 

Portanto, com a nova redação do art. 6º da CLT, o requisito da subordinação jurídica, que era pessoal e direta, para o necessário reconhecimento da relação de emprego, foi equiparado pelo legislador, aos meios telemáticos e informatizados de comando, caracterizando a proeminência do poder diretivo.

Márcio Túlio Viana ressalta que:

Nos dias atuais, mesmo o teletrabalho, que parece desconectar o empregado das ordens diretas do empregador, não o impede de sofrer cobranças constantes, através da própria máquina. Na verdade, a volta ao lar que hoje se ensaia não significa menos tempo na empresa, mas – ao contrário – a empresa chegando ao lar (VIANA, 2000, p. 176). 

Uma questão de extrema importância que envolve o teletrabalho é justamente sua ambiguidade, afinal, ao mesmo tempo que pode ser benéfico para o empregado laborar em sua residência (ou em outro local, fora da empresa), pode ser ruim tendo em vista que o trabalho acaba adentrando no lar do trabalhador, podendo chegar ao ponto deste não mais saber se esta trabalhando ou comendo, se esta trabalhando ou descansando, se esta trabalhando ou relacionando com seus familiares, e assim a vida pessoal e profissional estariam misturadas.

Outra questão de crucial importância corresponde aos custos que o teletrabalho oferta ao empregado, tendo em vista que na hipótese do trabalho em domicílio, a conta de luz, ferramentas de trabalho (como computador, impressora, papel e instrumentos afins), devem ser arcados pelo empregador, pois seria incompreensível que tais prejuízos fossem arcados pelo trabalhador, que é a parte hipossuficiente da relação, além dos alteridade ser exclusiva do tomador.

Não importa se o teletrabalho é desenvolvido no próprio domicílio do empregado, em escritório ou até mesmo em qualquer lugar onde esteja o prestador desenvolvendo o seu trabalho de forma remota. Se há remessa ou aproveitamento de dados ou ações concretas geradas pelo prestador de serviços à distância, conversíveis em elementos de produção de interesse patronal, dentro da dinâmica estrutural do tomador, mesmo que tenham origem em ordem remota emanada do tomador de serviços, a situação se equipara agora, para fins de caracterização do elemento subordinação jurídica, ínsita à relação de emprego, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

O poder diretivo e a subordinação não desaparecem no teletrabalho, apenas mudam de forma, para atender aos parâmetros estabelecidos e à operacionalização técnica da prestação de serviços. Altera-se a forma, mas a essência continua a mesma, podendo inclusive estarem mais incisivas e camufladas, até porque quanto maior a liberdade, maior também a responsabilidade.

     

5. O TELETRABALHO E O CONTROLE DE JORNADA

Importante ressaltar que o fato de a lei reconhecer a existência de subordinação jurídica nas modalidades de relação de trabalho apontadas, não significa que, no tocante aos temas trabalhistas que envolvem a duração do trabalho e seus limites, o trabalho realizado à distância deverá ter idênticas consequências jurídicas que o trabalho realizado no âmbito do empregador, sob a sua efetiva supervisão, vigilância e controle direto de cumprimento de carga horária.

Por isso, uma questão que até a presente data é motivo de debate quanto ao teletrabalho diz respeito ao controle da jornada e corolário lógico, as horas extras (se os trabalhadores possuem este direito ou não).

De um modo geral, os teletrabalhadores possuem os mesmos direitos dos demais trabalhadores, porém, dada a peculiaridade de suas atividades, em regra, não estão sujeitos a controle de jornada, daí não fazendo jus as horas extras, na forma do art. 62, I da CLT, que dispõe:

Art. 62 – Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados.

Lado outro, caso o trabalhador tenha a sua jornada controlada pelo empregador, fará jus a percepção das horas extras. É justamente o que também entende Vólia Bomfim Cassar:

Há forte presunção de que teletrabalhador não é fiscalizado e, por isso, está incluído na exceção prevista no art. 62, I, da CLT. Se, todavia, o empregado de fato for monitorado por webcâmera, intranet, intercomunicador, telefone, número mínimo de tarefas diárias etc., terá direito ao Capítulo “Da duração do Trabalho”, pois seu trabalho é controlado. Aliás, o parágrafo único do art. 6º da CLT é claro no sentido de que “Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio” (CASSAR, 2012, p. 712). 

Nesse mesmo sentido, aduz Maurício Godinho Delgado:

Claro que a operação de enquadramento dos fatos à regra jurídica não deve ser artificial e desproporcional, sob pena de conspirar contra seu próprio sucesso e validade. Desse modo, a circunstância de a lei permitir o enquadramento no pressuposto da subordinação dessas situações novas de prestação de serviços em home-offices e também em dinâmicas de teletrabalho, autorizando o reconhecimento do vínculo de emprego (se presentes os demais elementos fático-jurídicos dessa relação tipificada, é claro), isso não confere automático fôlego para se concluir pelo império de minucioso sistema de controle de horários durante a prestação laborativa. Nessa medida, o notável avanço trazido pela nova redação do art. 6º e parágrafo único da CLT, viabilizando a renovação e expansionismo da relação de emprego, talvez não seja capaz de produzir significativas repercussões no plano da jornada de trabalho. O alargamento do conceito de subordinação não importa, necessariamente, desse modo, no mesmo alargamento da concepção de jornadas controladas. Trata-se de conceitos e extensões distintos, de maneira geral (DELGADO, 2013, p. 921).

É perfeitamente viável aplicar ao teletrabalhador as normas sobre jornada de trabalho, quando estiver em conexão permanente com a empresa que lhe controla a atividade e o tempo de trabalho. Afinal, esta é a regra, ao passo que o art. 62, I, da CLT, é a exceção. Não há incompatibilidade entre o teletrabalho e a jornada extraordinária.

Também não se pode concluir que o disposto no novo artigo 6º da CLT representaria a caracterização automática do regime de sobreaviso, sujeitando o empregador ao pagamento de horas de sobreaviso ao empregado, apenas porque este trabalha em regime de trabalho à domicílio, tendo em vista que são institutos distintos.

No que se refere ao regime de sobreaviso, a alteração trazida pela Lei nº 12.551/2011, de certa forma pressionou o Colendo Tribunal Superior do Trabalho a rever a Súmula nº 428 que trazia o entendimento de que o sobreaviso somente estaria caracterizado se o empregado permanecesse em casa, aguardando ligação do empregador. Ou seja, apenas se houvesse efetivo tolhimento da liberdade de locomoção do obreiro é que este faria jus às horas de sobreaviso.

Entretanto, com o advento da Lei nº 12.551/2011, o C.TST reviu o posicionamento até então adotado, passando a conceber a possibilidade de o uso de telefone celular ou equivalente poder representar sobreaviso, desde que revelado o efetivo controle patronal sobre o trabalhador, como ocorre, por exemplo, nas hipóteses de escalas plantão.

A nova redação da Súmula nº 428 do C. TST passou a vigorar com a seguinte redação:

SOBREAVISO APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 244, § 2º DA CLT

I – O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso.

II – Considera-se em sobreaviso o empregado que, à distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o período de descanso. 

Assim, constatando-se, no caso concreto, o chamado “estado de disponibilidade” atrelado ao uso de meios eletrônicos de controle à distância, como é o caso do bip e do aparelho celular, o C. TST passa a admitir a caracterização do regime de sobreaviso, ainda que não haja limitação da liberdade de locomoção do empregado.

A Súmula nº 428 vem sendo devidamente efetivada, tanto pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho, como pelos Egrégios Tribunais do Trabalho, conforme se verifica:

RECURSO DE REVISTA. HORAS DE SOBREAVISO. No caso, de acordo com as premissas estabelecidas pelo Tribunal Regional, ficou evidenciado que o autor, nas horas destinadas ao seu descanso, esteve escalado em regime de plantão para ser acionado, via telefone celular, em situações de emergência na empresa. O acórdão regional consignou inclusive a ocorrência de efetivo trabalho em domingos e feriados. Tal circunstância demonstra a existência de controle do empregador sobre o empregado, tolhendo-lhe a liberdade de locomoção, exigindo a sua permanência em um raio determinado de ação que lhe permita o deslocamento em tempo hábil, de forma a atender ao chamado patronal. Esse estado de expectativa constante, além de prejudicar a liberdade de ir e vir do empregado não permite o real e necessário descanso que o período de ausência de labor deveria proporcionar, gerando o direito às horas de sobreaviso, a teor do item II da Súmula 428do TST. Recurso de revista conhecido e provido. (Processo: RR – 1888-44.2011.5.09.0195 Data de Julgamento: 13/11/2013, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/11/2013).  

E também:

HORAS DE SOBREAVISO – USO DE CELULAR- SÚMULA Nº 428, ITEM II, DO TST. O empregado que fica aguardando ordens à distância, em regime de plantão ou equivalente, durante o período de descanso e submetido ao controle patronal por intermédio de instrumentos telemáticos e à distância, tem jus às horas de sobreaviso. Inteligência da Súmula nº 428, item II. (Processo: RR – 1157-48.2010.5.09.0562 Data de Julgamento: 06/11/2013, Relator Desembargador Convocado: João Pedro Silvestrin, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 08/11/2013).  

Ainda:

EMENTA: SOBREAVISO. CARACTERIZAÇÃO. Está em regime de sobreaviso, o empregado que, em período de descanso, for compelido a aguardar o chamado do empregador por celular para trabalhar a qualquer momento. Pela nova redação da Sumula nº 428, não é mais necessário que o empregado permaneça em casa para que se caracterize o sobreaviso, basta a configuração do “estado de disponibilidade” em regime de plantão, para que este adquira o direito ao benefício. (TRT da 3.ª Região; Processo: 00329-2011-028-03-00-0 RO; Data de Publicação: 19/12/2012; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Convocada Olivia Figueiredo Pinto Coelho; Revisor: Convocado Ricardo Marcelo Silva; Divulgação: 18/12/2012. DEJT. Página 161) 

Por conseguinte, em que pese a evolução tecnológica tenha permitido que  o contato entre empregado e empregador, ocorresse a distância, não impossibilitou que o labor viesse a ser supervisionado, pelo contrário, os novos meios de comunicação permitem que a fiscalização seja realizada, inclusive de forma mais precisa e eficaz (e as vezes disfarçadas a olhos nu), o que não pode ser desprezado pelos operadores do Direito do Trabalho.

Assim, considerando que o trabalho realizado fora do estabelecimento empresário é hoje uma realidade no meio laboral, é certo que a legislação e a jurisprudência devem acompanhar essa evolução, inserindo-a na realidade das relações de trabalho, sendo bons exemplos dessa conscientização o advento da Lei nº 12.551/2011 e a revisão da Súmula nº 428 do TST, sempre caminhando no sentido de ofertar ao trabalhador brasileira a devida proteção, que é a espinha dorsal do Direito do Trabalho.

 

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma das grandes marcas do mundo moderno é, sem dúvida, a constante evolução tecnológica, que vem provocando, dia após dia, a relativização das distâncias, possibilitando um fluxo e transição cada vez maior de informações e pessoas, sem que seja necessário qualquer tipo de deslocamento físico. Os espaços geográficos encontram-se cada vez menores e mais próximos, as barreiras quase que inexistem (basta olhar os blocos econômicos) e o tempo mais curto e veloz.

Considerando a gênese legislativa que levou à alteração do artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho, conclui-se que a intenção do legislador foi o de incluir, expressamente, o trabalho realizado à distância dentre as situações equiparáveis ao do tradicional emprego (arts. 2º e 3º, da CLT).

 Além da subordinação, a existência de contato físico entre empregado e empregador não é mais necessária para viabilizar a fiscalização da prestação de serviços e do cumprimento de horários, porquanto a realidade atual permite que os sujeitos da relação empregatícia sequer se encontrem e, mesmo assim, seja exercida efetiva supervisão acerca do desenvolvimento do trabalho, caracterizando, assim, o poder diretivo.

A par destas informações, cabe ressaltar que a alteração em comento teve um caráter nitidamente ampliativo, aumentando o espectro protetivo do Direito do Trabalho. Metaforicamente, pode-se comparar esta situação com uma colcha de retalhos, que vai sendo formada, através da junção de novos pedaços para assim ter sua dimensão estendida, podendo proteger cada vez mais pessoas. Enquanto que a linha seria a norma, os trabalhadores corresponderiam aos panos que unem-se uns aos outros através da costura, e juntos (costura-pano; norma-trabalhador) formam uma única coisa: a colcha de retalhos, que juridicamente seria o Direito do Trabalho, instrumento de inclusão social, melhoria da condição socioeconômica dos trabalhadores e distribuição de riqueza.

A Lei nº 12.551/2011 tratou de reconhecer as mudanças ocorridas no mundo pós-moderno e assim ofertou aos jurisdicionados brasileiros, que na hipótese de teletrabalho, preenchidos os todos os requisitos (elementos fático-jurídicos) da relação de emprego, através do uso de instrumentos telemáticos ou informáticos, deve ser declarado, reconhecido o vínculo empregatício.

Muito embora a norma ut supra, represente um avanço legislativo, algumas questões estão longe de ser resolvidas, como por exemplo, a questão do acidente de trabalho ou doenças ocupacionais. Exercido o trabalho à distância, como se certificar se o trabalhador está utilizando a postura adequada ou respeitando os intervalos intra e interjornada? Essas são apenas algumas das questões que ainda permanecem sem resposta e que, ao que tudo indica, serão respondidas pelo Poder Judiciário ao longo do tempo, à medida que as demandas lhe forem apresentadas, devendo ser consolidada através da respectiva jurisprudência (Orientação Jurisprudencial e Súmula do Colendo Tribunal Superior do Trabalho).

Portanto, percebe-se que o grande feito da Lei 12.551/11 foi reconhecer, legalmente, a existência da subordinação em uma nova modalidade de prestação de serviços, qual seja o trabalho a distância, garantindo, aos trabalhadores inseridos neste contexto, a proteção integral trabalhista, na conformidade do que já pugnavam tanto a doutrina como a jurisprudência, navegando na direção protetiva e humanística que deve ser o ponto basilar do Direito do Trabalho. 

 

REFERÊNCIAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5ª ed. São Paulo: LTr, 2009. 

BIESDORF, Solange Inês; SANTIAGO, Suely. Reflexões Contemporâneas de Direito do Trabalho. Curitiba: Rosea Nigra, 2011. 

BRASIL. Lei n.12.551, de 15 dez. 2011. Altera o art. 6° da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943, para equiparar os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos. Diário Oficial da União, Brasília, 16 dez. 2011. 

CASSAR, Volia Bomfim. Direito do Trabalho. 6ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. 

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. 

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 12. ed. São Paulo: LTr, 2013. 

FABIANO, Isabela Márcia de Alcântara. Súmula 428 do TST: sobreaviso, tecnologia e saúde do trabalhador. In: VIANA, Márcio Túlio et al (Org.). O que há de novo em direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2012. p. 241-245. 

KOURY, Luiz Ronan Neves; ALMEIDA, Cleber Lúcio de; CANTELLI, Paula Oliveira (Coords.). Estudos de Direito do Trabalho e de Direito Processual do Trabalho. Belo Horizonte: RTM, 2012. 

PORTO. Lorena Vasconcelos. A subordinação no contrato de trabalho: uma releitura necessária. São Paulo: LTr, 2009. 

RENAULT, Luiz Otávio Linhares. Parassubordinação: para quê? In: RENAULT, Luiz Otávio Linhares; CANTELLI, Paula Oliveira; PORTO, Lorena Vasconcelos; NIGRI, Fernanda (Coords.). Parassubordinação. São Paulo: LTr, 2011, p. 33-49. 

RODRIGUES PINTO, José Augusto. Tratado de direito material do trabalho. São Paulo: LTr, 2007.

SILVA, Antônio Álvares. Na Vanguarda do Direito do Trabalho. Belo Horizonte: RTM, 2012. 

VALVERDE, Eduardo. Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 3.129, de 2004. Altera o art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, para equiparar os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios de telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=F0293D74F1C94359B51A9856C5B4C4B3.node1?codteor=201909&filename=PL+3129/2004 >. Acesso em: 25 nov. 2013. 

VIANA, Márcio Túlio. A proteção social do trabalhador no mundo globalizado: o direito do trabalho no limiar do século XXI. Revista da Faculdade Mineira de Direito, Belo Horizonte, v. 3, n. 5 e 6, 1° e 2° sem. 2000. 

 

NOTAS DE FIM

1 Doutorando e Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/MG; especialista em Direito do Trabalho pela Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte/MG; graduado em Direito pela Universidade Vila Velha/ES; Professor; Membro do Instituto de Ciências Jurídicas e Sociais e Advogado. Bolsista CAPES. 

2 Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/MG; especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes; Professora do Centro Universitários Newton Paiva; Professora da Faculdade de Pedro Leopoldo; Professora da Pós-Graduação da PUC-Minas e do Pitágoras; Analista Judiciário do TRT-3ª Região.