Douglas Santiago Diniz[1]
RESUMO: O presente trabalho tem por escopo analisar a atribuição de poderes investigatórios ao Ministério Público à luz da Constituição Federal. Em sede objetivo geral, buscou-se evidenciar a plausibilidade da corrente doutrinária que acompanhada de considerável parcela da jurisprudência nacional, sustenta a legitimidade do parquet para conduzir investigações preliminares nas quais se apuram a prática de infrações penais, tendo em vista a posição de destaque da Instituição no ordenamento jurídico e a fragilidade dos argumentos daqueles que divergem deste posicionamento. Na elaboração do trabalho utilizou-se da pesquisa bibliográfica, analisando a posição da doutrina e jurisprudência nacional, bem como o tratamento do tema no direito comparado. Em conclusão, atestou-se que o Ministério Público possui plena legitimidade para empreender investigações criminais per si, não havendo exclusividade das polícias judiciárias no desempenho de tal atribuição, dado o caráter axiológico que enfeixa o sistema normativo brasileiro e a necessidade de universalização da segurança pública, especialmente em um momento tão delicado, quando o País experimenta umas das maiores crises na segurança pública.
PALAVRAS-CHAVE: Ministério Público; investigação criminal; Polícia Judiciária; segurança pública; PEC n. 37.
ÁREA DE INTERESSE: Direito Penal. Direito Processual Penal.
1 INTRODUÇÃO
Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil, aos cinco dias do mês de outubro de 1988, sagra-se o processo de redemocratização do Estado brasileiro que se arrastava por um longo período.
Nessa perspectiva, o Ministério Público experimenta o ápice de seu crescimento. O parquet adquire relevo na ordem constitucional, consagrando-se como instituição essencial à função jurisdicional, gozando de liberdade, autonomia e independência funcional, além de incumbir-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A Carta de 1988 então dispensa especial tratamento ao Ministério Público, erigindo-o como instrumento de defesa social, conferindo-lhe funções, garantias e prerrogativas que possibilitam a seus membros atuar de forma desinteressada e desvinculada dos Poderes do Estado. Dentre estas funções encontra-se a titularidade da ação penal pública, por meio da qual o Estado postula em juízo o exercício de seu direito punitivo.
Entretanto, a deflagração da ação penal somente se justifica quando presentes elementos suficientes acerca da materialidade e autoria de um ilícito penal. Estas informações serão angariadas em procedimento administrativo, denominado inquérito policial pelo Código de Processo Penal. É nesse momento que são reunidos os elementos de prova nos quais se estribará a ação penal pública. Deste modo, discute-se tanto na doutrina pátria como na jurisprudência a quem incumbe tal tarefa.
Alguns afirmam que se trata de função privativa das polícias judiciárias. Alegam que o artigo 144 da Constituição Federal atribuiu às polícias judiciárias exclusividade na apuração da ocorrência e autoria de crimes e contravenções penais, relegando ao Ministério Público a titularidade da ação penal a ser intentada com base nos elementos de prova ali coligidos.
Outros defendem que a Carta Magna em momento algum conferiu exclusividade às polícias judiciárias na promoção de investigações criminais. Argumentam que a própria Constituição Federal guarnece a instituição de diversos mecanismos relacionados à atividade investigatória, motivo pelo qual acaba por lhe conferir, implicitamente, o poder para promover investigações criminais.
Destarte, o presente trabalho se propõe a analisar o real alcance das atribuições conferidas ao parquet pela Constituição Federal de 1988, especialmente sua legitimidade para conduzir inquéritos policiais.
2 MINISTÉRIO PÚBLICO
Antes de ser abordado o problema-núcleo do presente trabalho, afigura-se inevitável traçar algumas considerações acerca das modificações ocorridas na estrutura e nas funções desempenhadas pelos membros do Ministério Público.
A origem do Ministério Público é tema controvertido (MAZZILLI, 1989, p. 2), alguns a identificando há mais de quatro mil anos no Egito, outros na Antiguidade clássica ou mesmo na Idade Média. Contudo, usualmente a doutrina aponta o direito francês como berço do Ministério Público, destacando a Ordenança de 25 de março de 1302, do Rei Felipe IV, por meio da qual o monarca “impôs aos seus procuradores, antes de tudo, prestassem o mesmo juramento dos juízes, vedando-lhes patrocinarem outros que não o rei” (MAZZILLI, 1989, p. 3). Inclusive, a própria expressão parquet, há muito difundida no direito pátrio, advém da tradição francesa (TOURINHO FILHO, 2012, p. 397).
Contudo, irrelevante a discussão à vista do que se propõe o trabalho. Inegável é o fato de que a instituição passou por notáveis alterações, tanto em sua estrutura como no seu ofício (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1037). A própria expressão Ministério Público não mais exprime a acepção que lhe era conferida séculos atrás. Como observa Hugo Nigro Mazzilli (1989, p. 4), se, remotamente, referia-se àqueles que, de algum modo, exerciam uma função pública, hodiernamente identifica uma instituição independente, com posição constitucional de destaque, dotada de instrumentos e garantias contra eventuais ingerências dos Poderes do Estado, o que assegura aos seus membros a necessária liberdade e independência para o desempenho dos respectivos ofícios.
No Brasil, os primeiros traços do Ministério Público provêm do direito lusitano (MAZZILLI, 1989, p. 5), embora àquela época não fosse possível idealizar uma instituição consolidada. O processo de estruturação do parquet somente teve início com o advento do Império, notadamente com a promulgação do Código de Processo Penal, de 1932 (MORAES, 2009, p. 597-601), que, de forma incipiente, previu a forma de nomeação e as principais atribuições dos promotores públicos, que basicamente consistiam no exercício da acusação perante os juízos criminais.
Quanto à sua inserção no texto constitucional, foi a Carta de 1934 a primeira a institucionalizá-lo, inserindo-o em capítulo dissociado dos demais órgãos estatais; as que a antecederam (Constituição do Império, de 1824, e Constituição da República, de 1981) sequer continha semelhante disposição, fazendo referências esparsas à figura do procurador-geral da República.
Com o advento da ditadura do Estado Novo, em 1973, e a outorga da nova Carta por Getúlio Vargas, de cunho eminentemente autoritário, o Ministério Público é inserido no título concernente ao Poder Judiciário e são suprimidas diversas prerrogativas até então obtidas. Apenas com restabelecimento da democracia, em 1946, é que a Instituição torna a adquirir relevo no cenário nacional, com consideráveis avanços no que se refere à sua estruturação. Em 1964, rompe-se novamente a estabilidade do sistema, vindo a ser implanto o regime militar, e, em 1967, é promulgada nova Carta Política. Outra vez o Ministério Público é inserido no capítulo que se refere ao Poder Judiciário. Em seguida, com novo golpe e a promulgação da Emenda à Constituição n. 1, de 17 de outubro de 1969[2], o Ministério Público é deslocado para o capítulo destinado ao Poder Executivo.
Com efeito, é com o advento da Constituição democrática de 1988 que o Ministério Público experimenta o ápice de seu crescimento. É nesse momento que se erige à condição de instituição essencial à função jurisdicional do Estado, dispondo de liberdade, autonomia e independência funcional, além de incumbir-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (Artigo 127, caput). Logo, é inserido em capítulo diverso dos demais Poderes estatais, denominado “Das funções essenciais à Justiça”.
Não obstante a técnica legislativa empregada, a doutrina ainda digladia sobre a natureza jurídica do Ministério Público, de órgão vinculado ao Poder Legislativo – pois atua como fiscal da lei; ao Poder Judiciário – pois atua perante este; ao Executivo – por desempenhar função administrativa; ou se na condição de quarto Poder do Estado (MAZZILLI, 1989, p. 43).
Desde logo, registre-se que nenhuma das teses apontadas se sustentam. Ruy Rosado de Aguiar Júnior, antes mesmo da promulgação da atual Carta já lecionava que o Ministério Público constitui órgão constitucional autônomo, cujo conceito vem expresso no próprio texto constitucional, que lhe determina a natureza jurídica de instituição permanente e essencial à Justiça do Estado (AGUIAR JÚNIOR, 1971).
Não se trata também de um quarto Poder, como defendido por alguns (CARVALHO, 2009, p. 1359). Embora o Ministério Público esteja inserto no Título concernente à “Organização dos Poderes”, inclusive em capítulo distinto do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judiciário, sem se mencionar a ampliação do rol de suas funções, o objetivo da técnica legislativa não foi outro senão o de resguardar o parquet das ingerências destes Poderes, para que seus membros pudessem desempenhar suas atribuições com ampla independência. De outro modo, haveria “que se admitir, por via de conseqüência, um Quinto e Sexto Poderes, constituídos pela Defensoria e Advocacia Públicas, a que se atribuem prerrogativas semelhantes, previstas no mesmo espaço sistematizado na Lex Mater” (LOPES, 2013).
Em decorrência do posicionamento constitucional destacado da instituição, o constituinte, atento às possíveis investidas dos demais órgãos estatais, previu princípios institucionais que são inerentes ao próprio ofício do Ministério Público. São eles, pois, a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (CF. Artigo 127, §1º).
O primeiro consiste na existência de um só Ministério Público, à submissão de seus membros a uma só direção de um só procurador-geral. Contudo, só se verifica esta unidade dentro de cada Ministério Público. Por exemplo, inexiste unidade entre o Ministério Público Federal e os dos Estados. O segundo decorre da própria unidade do parquet. Por ele, seus membros podem substituir-se uns pelos outros em um mesmo processo, observadas as normas legais, sem que haja qualquer irregularidade no feito, pois estes agem em nome da instituição, e não em nome daquele que ocupa o cargo público. Finalmente, a independência funcional, ou autonomia funcional, corresponde à liberdade dos seus membros ao exercerem seus misteres, não estando sujeitos “às ordens de quem quer que seja somente devendo prestar contas de seus atos à Constituição, às leis e à sua consciência” (MORAES, 2009). Portanto, não há hierarquia funcional entre os membros do parquet, como ocorre no direito francês, mas apenas em hierarquia administrativa (BULOS, 2010, p. 1369).
Demais, releva notar que esta independência não culmina no reconhecimento de poderes ilimitados aos membros do Ministério Público (MAZZILLI, 1995). Embora gozem de independência no exercício de suas atribuições funcionais, isto não significa que não estejam sujeitos a poderes de disciplina, direção e fiscalização nas suas condutas administrativas (TOURINHO FILHO, 2012, p. 404).
Ao lado dos princípios institucionais, foram previstas garantias e vedações aos membros do Ministério Público (Artigo 128, §5º, I e II). Por caracterizarem, na verdade, espécies de garantias funcionais de liberdade e de imparcialidade (BULOS, 2010, p. 1832), estas disposições – garantias e vedações – inserem-se dentre as cláusula pétreas (MORAES, 2009, p. 629).
A Constituição Federal de 1988 enumerou ainda as funções institucionais do Ministério Público, cujo rol foi consideravelmente ampliado (Artigo 129). Não obstante, impende assinalar que as atividades expressas na Carta Magna não esgotam as funções a serem exercidas pelos membros do parquet. Trata-se de rol exemplificativo. Tanto que o próprio artigo 129, XI, da Constituição Federal prescreve que compete ao Ministério Público “exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade”. Corrobora a afirmação, inclusive, a ampliação deste rol através da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei n. 8.625/93) e da Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar n. 75/93).
Dito isso, passa-se à questão da investigação criminal.
3 INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
O direito surge como instrumento de controle social (MONTORO, 2005, p.105). É, pois, fenômeno da vida, e, tal como, resulta das atividades desempenhadas em sociedade, e não da exclusiva vontade do homem (VIEIRA, 1988). Por meio dele condiciona-se o comportamento daqueles que vivem em sociedade, impondo-lhes um dever de ação ou de abstenção (REALE, 2002, p. 59). Visa, portanto, concretizar o ideal de bem comum, por meio da formulação de regras gerais e abstratas denominadas normas jurídicas.
Ocorre que, não raras vezes, as normas jurídicas são descumpridas. Desta forma, faz-se necessária a intervenção do Estado a fim de restabelecer a paz social até então predominante, infligindo ao transgressor as sanções previstas na legislação, sob pena de se tornarem inócuos os preceitos expressos nos enunciados normativos (MIRABETE, 2002, p. 23).
Em um primeiro momento, as sanções a serem impostas consistem no ressarcimento dos danos e dos prejuízos sofridos por uma parte em razão da conduta proibida realizada pela outra. Não obstante, em determinadas situações, estas sanções se mostram insuficientes para que seja restabelecida a ordem, exigindo-se reprimendas mais severas (MIRABETE, 2002, p. 23). Fala-se, então, em tutela penal, cuja finalidade consiste na preservação dos bens e interesses mais relevantes da sociedade (GRECO, 2011, p. 2). Para mais, reporta-se ao que se denominou direito de punir (jus puniendi), conceituado como o poder-dever que toca ao Estado para fazer valer a legislação penal, aplicando uma pena àquele que pratica uma ação ou omissão descrita na norma penal, e que, conforme Fernando da Costa Tourinho Filho, se manifesta sob duas formas: in abstracto e in concreto.
[…] o jus puniendi existe in abstracto e in concrecto. Com efeito, quando o Estado, por meio do Poder Legislativo, elabora as leis penais, cominando sanções àqueles que vierem a transgredir o mandamento proibitivo que se contém na norma penal, surge para ele o jus puniendi num plano abstrato e, para o particular, surge o dever de abster-se de realizar a conduta punível. Todavia, no instante em que alguém realiza a conduta proibida pela norma penal, aquele jus puniendi desce do plano abstrato para o concreto, pois, já agora, o Estado tem o dever de inflingir a pena ao autor da conduta proibida. Surge, assim, com a prática da infração penal, a “pretensão punitiva”. (TOURINHO FILHO, 2012, p. 46-47)
A aplicação da pena deverá ocorrer por intermédio de um processo judicial, ou seja, no âmbito do processo penal. Sem embargo, não parece razoável que o Estado postule em juízo a aplicação da pena sem a presença de elementos mínimos que comprovem a autoria da conduta criminosa por aquele que se vê processado. Em consequência, cumpre ao ente estatal diligenciar a fim de reunir estas informações.
A esta atividade se atribui a denominação de persecução penal (persecutio criminis), que comporta duas fases distintas e bem delineadas: a fase de investigações preliminares e a fase processual (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 71).
O presente trabalho restringir-se-á à primeira fase, denominada também de fase pré-processual, na qual são reunidos os elementos de convicção que irão embasar eventual ação penal.
3.1 A inconveniência da nomenclatura
O Código de Processo Penal brasileiro designou inquérito policial à fase de investigações preliminares, não o definindo de forma expressa, limitando-se a fazer referências esparsas ao instituto. Desta forma, incumbiu à doutrina tal tarefa, conceituando-o por intermédio de uma análise sistêmica dos dispositivos correlatos, nos seguintes termos (LOPES JR., 2001, p. 29).
Guilherme de Souza Nucci o conceitua nos seguintes termos:
O inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de caráter administrativo, conduzido pela polícia judiciária e voltado à colheita preliminar de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria. Seu objetivo precípuo é a formação da convicção do representante do Ministério Público, mas também a colheita de provas urgentes, que podem desaparecer, após o cometimento do crime. Não podemos olvidar, ainda, que o inquérito serve à composição das indispensáveis provas pré-constituídas que servem de base à vítima, em determinados casos, para a propositura da ação penal privada […]. (NUCCI, 2012, p. 151).
Não se desconhece a clareza do conceito, que abarca os elementos necessários à compreensão da atividade desempenhada nesta fase. Todavia, não parece adequada sua designação por meio do epíteto inquérito policial. Tal nomenclatura ignora a própria natureza e finalidade da atividade de investigação, resumindo-se a indicar um dos vários órgãos competentes para a apuração de infrações penais (LOPES JR., 2001, p. 29). À vista disso, mais prudente designar-se investigação preliminar criminal.
O primeiro termo – investigação – provém do latim investigatio, que significa entrar, penetrar, alcançar. Faz referência ao ato de alcançar algo, conhecê-lo em sua essência. A ele deve-se acrescentar outro vocábulo – preliminar – para deixar indene de dúvidas a distinção entre a investigação levada a cabo na fase pré-processual da instrução que também é realizada na fase processual, além, é claro, do seu caráter prévio.
Portanto, ao longo deste trabalho será empregado o vocábulo investigação preliminar criminal em oposição à nomenclatura adotada pelo Código de Processo Penal.
No que se refere à natureza jurídica da atividade, seu caráter é eminentemente administrativo. Não se trata, portanto, de processo, mas procedimento administrativo informativo (MIRABETE, 2002, p. 77). Rege-se, inclusive, pelas normas aplicáveis aos atos administrativos em geral.
A doutrina enumera ainda uma série de características que diferenciam a investigação preliminar criminal do processo penal, embora ambos estejam insertos no conceito de persecução penal, senão vejamos.
Trata-se de procedimento escrito, cujos elementos de prova devem ser reduzidos a termo, assinado pela autoridade policial, não se concebendo investigação verbal (CAPEZ, 2012, p. 117). Demais, é inquisitivo, não comportando ampla dilação probatória por parte do indiciado.
Essa noção decorre do próprio sistema inquisitivo, de origem romana, na qual não há a presença do contraditório (MIRABETE, 2002, p. 40). Esta tendência foi acolhida de forma moderada no direito pátrio (TOURINHO FILHO, 2012, p. 79), posto que os atos praticados ao longo da investigação se concentram, em tese, nas mãos de uma única autoridade – autoridade policial (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 34).
É, ainda, sigiloso na medida em que não se submete à publicidade dos atos oficiais, em oposição ao que determina o artigo 5º, XXXIII, da Constituição Federal. E não poderia ser diferente, em razão da necessidade de que não sejam opostos empecilhos à investigação em curso, dificultando ou inviabilizando a produção de provas (MIRABETE, 2002, p. 78). Contrariamente, o indiciando, tendo conhecimento de que a autoridade policial pretende, por exemplo, inquirir determinada testemunha, poderia passar a ameaçá-la, forçando-a a faltar com a verdade quando do seu depoimento.
É oficioso porquanto sua instauração, em determinados casos, independe de provocação e oficial vez que outorgado a órgão oficial do Estado.
Por fim, constitui procedimento indisponível: é dizer, sendo a persecução penal de ordem pública, iniciada a investigação, não pode o delegado de polícia dela dispor, devendo concluí-la (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 77).
3.2 Competência
É nesse momento que surge a controvérsia objeto do presente trabalho. A quem compete dirigir as investigações iniciadas para a elucidação de ilícitos penais?
Na doutrina prevalece o entendimento segundo o qual a tarefa, em regra, compete às polícias judiciárias. Argumentam os defensores desta tendência que a própria nomenclatura empregada pelo Código de Processo Penal, no caput artigo 4º, já indica o órgão competente para tanto.
Entretanto, esquecem-se os autores da exceção à regra contida no caput do artigo 4º do Código de Processo Penal. No seu parágrafo único, o próprio artigo 4º determinar que a regra geral não afasta a competência de outras autoridades administrativas realizarem investigações, desde que tal função seja cometida por lei.
Além disso, desprezam os vários outros argumentos que demonstram o equívoco daquela afirmação, a seguir analisados.
4 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
A controvérsia sobre a qual se debruça a pesquisa recentemente adquiriu destaque no cenário nacional, notadamente em decorrência da apresentação da Proposta de Emenda à Constituição n. 37, de 08 de junho de 2011, de autoria do deputado federal Lourival Mendes, vulgarmente denominada “PEC da impunidade”, através da qual se pretende conferir privatividade às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal na condução de investigações criminais.
A referida Proposta de Emenda à Constituição acrescenta o §10 ao artigo 144 da Constituição Federal[3].
Acentuou a polêmica o fato de a proposta obter a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e em uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados, somado às diversas manifestações de outros setores, como o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil e a Associação Nacional dos Procuradores da República.
A despeito do recente engajamento destes setores, a controvérsia há muito bate à porta do Poder Judiciário. Inclusive o Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o tema em diversas oportunidades, ora pela legitimidade do parquet em conduzir investigações criminais (HC n. 91.661/PE), ora por sua ilegitimidade (HC n. 81.326-7/DF).
Diante desse panorama passa-se à análise dos argumentos daqueles que defendem a legitimidade do Ministério Público para promover, por si só, investigações preliminares criminais, sem se afastar das razões daqueles que negam qualquer forma de poder investigatório ao parquet.
4.1 O poder de investigação conferido pela Constituição Federal de 1988
Como exposto nos capítulos anteriores, incumbe ao parquet zelar pelos bens jurídicos mais relevantes para a sociedade, motivo pelo qual o constituinte originário conferiu a seus membros garantias funcionais de liberdade e de imparcialidade, além de destacar os princípios intrínsecos à instituição, donde se conclui que o Ministério Público ostenta posição de destaque na atualidade.
Nessa senda, negar poderes investigatórios a uma instituição dessa natureza constituiria demasiado contrassenso, sobretudo quando o País experimenta uma das maiores crises na segurança pública, sendo correntes as notícias de insuficiência dos órgãos responsáveis pela defesa social.
Entretanto, alguns reforçam a tese de que é vedado ao Ministério Público presidir investigações criminais, e fazem-no com fundamento no artigo 144 da Carta Magna, que assim dispõe:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I – polícia federal;
II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal;
IV – polícias civis;
V – polícias militares e corpos de bombeiros militares. (BRASIL, 1988)
Deveras uma análise apriorística da norma em exame poderia conduzir o intérprete à conclusão de que a segurança pública é atividade monopolizada pelo Estado a ser exercida tão somente pelos órgãos ali enumerados. E é justamente este o argumento de que se valem aqueles que refutam a existência de poderes investigatórios por parte do órgão do Ministério Público:
Porém, afigura-se frágil este argumento, notadamente diante das especificidades das normas constitucionais.
A Constituição Federal de 1988 constitui o marco histórico de rompimento das concepções autoritárias até então vigentes no Brasil. Nesse momento a Carta Magna assume o centro do ordenamento jurídico, impondo-se, por conseguinte, a releitura dos institutos, por meio de uma nova interpretação constitucional. Irrefutável a colocação de que os métodos tradicionais de interpretação das normas jurídicas (BARROSO, 2005), por si só, não são capazes de revelar o conteúdo da norma inscrita sob a forma do artigo 144 da Constituição Federal.
Como pondera Luís Roberto Barroso, a interpretação das normas constitucionais demanda a observância de um elenco próprio de princípios (BARROSO, 2005).
Não se pretende afirmar aqui que esteja superada a interpretação jurídica clássica, até porque considerável parcela das controvérsias continuará a ser solucionada por meio destes elementos (BARROSO, 2005). Contudo, as normas constitucionais reclamam uma análise em consonância com a pauta axiológica que enfeixa o sistema normativo, especialmente o texto constitucional.
Carlos Maximiliano já advertia da inconveniência de se analisarem os textos jurídicos unicamente sob o aspecto gramatical, por meio de uma interpretação desprovida de qualquer senso crítico (MAXIMILIANO, 2011, p. 96).
Essa foi inclusive a orientação acolhida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n. 89.837. Em sua manifestação, o relator do processo, Ministro Celso de Mello, consignou que não encontra respaldo a tese segundo a qual a Constituição Federal atribuiu com exclusividade as atividades de investigação à Polícia Judiciária, citando ainda a competência das Comissões Parlamentares de Inquérito para apurar infrações penais.
Prosseguindo no seu voto, anota que é imprescindível observar-se a mudança de paradigma ocasionada pela promulgação da Constituição de 1988.
Daí a conclusão do próprio Celso de Mello de que “a função atribuída ao Ministério Público pela Constituição Federal […] não pode ser aferida a partir de uma analise literal, acrítica e autômata de meros textos normativos” (BRASIL, 2009).
Os enunciados contidos na lei fundamental do Estado não devem ser interpretados isoladamente, mas em conformidade com a unidade do texto constitucional. É preciso que o aplicador busque a máxima eficácia de cada norma constitucional, sem que este processo importe em sacrifício de um bem jurídico constitucionalmente tutelado em favor de outro provido de idêntica tutela (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 132-144).
A segurança pública é, antes de tudo, direito e responsabilidade de todos, tanto dos órgãos do Estado, como dos próprios cidadãos. Trata-se de garantia fundamental, de elemento intrínseco do Estado Democrático de Direito. Não fosse assim, seria diversa a opção do constituinte, relegando a matéria à legislação infraconstitucional, e não a guindando “ao status de política pública prioritária, merecendo do Estado brasileiro o mesmo nível de importância reservado a outras áreas essenciais, tais como a saúde e a educação” (FELIPETO; DIAS, [2005?]) É uma questão que afeta a todos e não se circunscreve ao âmbito policial. (SILVA, 2005, p. 779).
Daí se afirmar que o poder de investigação do Ministério Público decorre do próprio texto constitucional (BULOS, 2010, p. 1385), ou seja, da análise do próprio artigo 144 em cotejo com os incisos I, II, VI, VII, VIII e IX do artigo 129 da Constituição Federal.
4.1.1 Inexistência de cláusula de exclusividade em matéria de investigação preliminar criminal
Sem prejuízo destas premissas, existem aqueles mais enérgicos que sustentam a inviabilidade dos membros do Ministério Público levarem a cabo investigações criminais com fundamento nesta tendência hermenêutica. Sustentam que tal ilegitimidade decorre da leitura do próprio texto constitucional, especificamente do §1º, IV, e do §4º, ambos do artigo 144 da Lei maior, conjugado com o artigo 129 do mesmo diploma.
Uma primeira concepção entende que a matéria prescinde maiores aprofundamentos ou mesmo modificação do texto constitucional. Justifica que o Título IV da Carta Magna expressamente diferencia as atividades de polícia judiciária da função de acusação e de defesa, além de acometer a primeira de forma exclusiva às polícias. Uma segunda tendência sustenta a inexistência de qualquer elemento que autorize ao Ministério Público empreender investigações na seara criminal, aduzindo que este entendimento advém da própria Assembleia Constituinte Nacional, sendo que o texto promulgado em momento algum mencionou tal possibilidade.
O primeiro argumento é da lavra de Ives Gandra da Silva Martins e foi manifestado em parecer exarado a pedido do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo – SINDPESP. A segunda tese foi defendida por José Afonso da Silva em parecer formulado após consulta do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCcrim.
A primeira premissa não se sustenta porquanto pretenda ver no texto constitucional, especificamente naqueles dispositivos mencionados alhures, uma cláusula de exclusividade que inibe a atividade de investigação pelo parquet.
Deveras consta do texto constitucional a expressão exclusividade. Contudo, como esclarece Eugênio Pacelli de Oliveira, tal vocábulo cinge-se a esclarecer que o desempenho das atividades de polícia judiciária no âmbito da União ficará a cargo da polícia federal (OLIVEIRA, 20143, p. 85).
Lado outro, o argumento é desprovido de tecnicidade. Chega a confundir a fase de investigações preliminares com o processo penal propriamente dito, identificando naquela fase (pré-processual) a presença da figura das partes. Como já registrado, a investigação preliminar criminal é de natureza administrativa. Há, de fato, uma autoridade responsável por colher os elementos de prova que irão embasar posterior ação penal e o indiciado, não partes como alegado. A presença das partes – acusação, defesa e juiz – está restrita ao processo.
Também não prevalece o argumento de que a competência exclusiva das polícias na condução de investigação criminais está implícita no texto constitucional. Fosse assim, qual a necessidade de se aprovar uma Emenda Constitucional com este fim? Qual a necessidade de acrescentar um §10 ao artigo 144 da Lei Maior?
Com efeito, o que se pretende é suprimir o poder investigatório que foi conferido pela Constituição Federal de 1988 ao Ministério Público, e não deixar o óbvio mais óbvio como sustenta Ives Gandra da Silva Martins.
Estes argumentos somente legitimam a afirmação de que o parquet possui poderes próprios de investigação criminal.
No que concerne à segunda concepção, de lavra de José Afonso da Silva, necessário traçar algumas considerações.
Em seu pronunciamento, José Afonso da Silva discorre sobre diversos aspectos que, segundo ele, demonstram a ausência de poder investigatório por parte do Ministério Público. Prefacialmente assegura que sua manifestação não levará em conta questões de conveniência ou de oportunidade, analisando a questão unicamente à luz do texto constitucional, por se tratar de uma discussão de lege lata, e não de lege ferenda.
Inicia sua argumentação afirmando que não há na Constituição uma palavra que atribua ao Ministério Público poderes para promover diretamente investigações criminais. Contextualizando a explanação, revela que no Anteprojeto da Comissão da Organização dos Poderes e Sistemas de Governo havia a proposta do artigo 137, V, que incluía entre as funções do parquet, além da competência para “requisitar atos investigatórios” a faculdade de “promover ou requisitar a autoridade competente a instauração de inquéritos necessários às ações públicas que lhe incumbem, podendo avocá-los para suprir omissões”, proposta que foi rejeita. Demais, adverte que não há no texto vigente semelhante disposição.
Lênio Luiz Streck contesta a posição acima. Assevera que o argumento ora assume uma feição subjetivista – extraindo o sentido da norma de uma pretensa vontade do legislador constitucional, enraizada no processo de formação da norma -, ora contornos objetivistas, discorrendo sobre a intencionalidade das normas constitucionais. (STRECK, 2013)
Não se concebe em uma sociedade que se denomina democrática a existência de conceitos como mens legis ou mens legislatoris (vontade da lei ou vontade do legislador) como instrumentos aptos a revelar o real sentido dos textos jurídicos. O processo de interpretação é atividade criativa, e não reprodutiva. Não se limita simplesmente a declarar uma vontade (do legislador ou da norma) que antecede ao próprio enunciado normativo (STRECK, 1999, p. 185-189).
Outra crítica prudente é a de que, aparentemente, os contendores não estão analisando o problema com a devida cautela. José Afonso da Silva, por exemplo, defendeu a constitucionalidade de questão que, à semelhança da controvérsia posta, foi objeto de rejeição durante o processo constituinte (impossibilidade de discriminação dos casais homoafetivos).
Realmente a polêmica ganhou contornos que transcendem o próprio discurso jurídico. A disputa assume feição corporativista, ora pelos próprios membros do Ministério Público, ora pelas polícias judiciárias.
Os opositores já não se preocupam em empreender uma análise da questão à luz do texto constitucional, mas levando em conta argumentos que provocam grande impacto na sociedade, que influem na concepção dos demais cidadãos. Não se valem mais exclusivamente da argumentação jurídica, mas do apelo social, com o que o presente trabalho não pode coadunar. Tão pouco ampliam a discussão, o que é censurável.
Peter Härbele opunha-se a tal prática, até porque a “interpretação constitucional não é um ‘evento exclusivamente estatal’, seja do ponto de vista teórico, seja do ponto de vista prático” (HÄBERLE, 1997, p. 23).
É preciso que a matéria seja devidamente tratada, expondo-se os argumentos jurídicos por meio dos quais se pretende afirmar o refutar a atuação do parquet nas investigações.
4.1.2 A teoria dos poderes implícitos
Retomando a análise em termos técnicos, volta-se afirmar que a legitimidade do Ministério Público para presidir investigações criminais decorre do próprio texto constitucional.
Aqui, merece destaque a teoria dos poderes implícitos, de plena aplicação ao direito pátrio (MORAES, 2009, p. 610), segundo a qual “a Constituição ao conceder uma atividade-fim a determinado órgão ou instituição, culmina por, implícita e simultaneamente, a ele também conceder todos os meios necessários para a consecução daquele objetivo” (FELIPETO, 2003).
A questão pode ser sintetizada sob a ótica da relevância dos interesses e bens jurídicos amparados no campo penal. Decerto, constituiria demasiado desatino ver-se com bons olhos a investigação direta pelo Ministério Público na esfera cível e não na criminal (FELIPETO; DIAS, [2005?]).
José Afonso da Silva contrapõe tal afirmação. Aduz que não há relação de meio e fim entre as investigações preliminares e a ação penal, pois a finalidade do inquérito é a apuração da autoria e materialidade do delito, e não a ação penal.
Equivocada a colocação. Como exposto alhures a investigação criminal constitui procedimento administrativo preparatório da ação penal. Embora peça meramente informativa e dispensável em algumas situações, tal somente se justifica quando o parquet, destinatário último da investigação, entender que dispõe de elementos suficientes para o ajuizamento da ação penal (TOURINHO FILHO, 2012, p. 114-115). Daí a relação de meio-fim entre a investigação preliminar e a ação penal. Sua finalidade precípua é, pois, formar a opinio delicti do titular da ação penal, que é o próprio Ministério Público.
Não satisfeito, José Afonso da Silva sugere que a teoria dos poderes implícitos não se aplica ao direito interno. Anota que a Constituição Federal expressamente conferiu exclusividade à polícia judiciária na apuração de infrações penais.
Ainda que a carta seja silente quanto aos poderes investigatórios, é nítida a compatibilidade entre estes e as funções institucionais do Ministério Público. O próprio texto constitucional possibilitou ao parquet expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los (Artigo 129, VI). Não fez diferenciação entre procedimento cível ou criminal. Demais, atribuiu ao Ministério Público o controle externo da atividade policial (Artigo 129, VII). Previu ainda a possibilidade de requisitar à autoridade policial, quando entender necessária, diligência investigatória ou instauração de inquérito policial (Artigo 129, VIII).
Oportuno resgate do significado do vocábulo requisitar, que é o ato de exigir legalmente (TOURINHO FILHO, 2012, p. 121-122). Logo, estaria a autoridade policial obrigada a empreender as diligências requisitadas pelos membros do Ministério Público.
Este era o argumento mais vigoroso entre aqueles que refutam o poder de investigação do Ministério Público. Entretanto, com a aprovação do Projeto de Lei da Câmara n. 132/2012, retira-se, em princípio, tal imposição, pois, segundo a redação do artigo 2º, §3º, os delegados de polícia passariam a conduzir “a investigação criminal de acordo com seu livre convencimento técnico-jurídico, com isenção e imparcialidade” (Artigo 2º, §3º).
Sem embargo, parece que o dispositivo legal padece de vício de inconstitucionalidade. À evidência, a disposição infraconstitucional em apreço não possui força para revogar o artigo 129, VIII, da Lei Maior.
Deste modo, indubitável a legitimação do Ministério Público para empreender investigações preliminares criminais. Não se trata da aplicação indiscriminada do adágio quem pode o mais, pode o menos, como sustentado por alguns setores. O que legitima sua atuação é a razoabilidade de que o titular da ação penal disponha também dos meios necessários para formar seu convencimento acerca de eventual ajuizamento da ação penal pública, especialmente quando entender contrariamente ao relatório final da autoridade policial.
A apuração de ilícitos penais não se exaure no âmbito policial ou ministerial. No Brasil, são vários os órgãos estaduais que investigam. Citem-se como exemplo as Comissões Parlamentares de Inquérito, a Comissão de Valores Mobiliários, o Banco Central do Brasil, o Instituto Nacional do Seguro Social.
Não se pretende também a substituição da polícia judiciária pelo parquet. Em momento algum é esta a bandeira hasteada pela própria instituição. Contrariamente, requer-se, sim, a concorrência na atividade de investigação, mormente à vista dos interesses em disputa. É o que alguns denominam de democratização da investigação.
4.2 A (in)conveniência da Proposta de Emenda à Constituição n. 37/2011
“[…] o Brasil parece querer dar um passo atrás na questão da investigação criminal e da gestão da prova […]” (STRECK, 2013).
Parece ser esta a frase que melhor se adequa à apresentação da Proposta de Emenda à Constituição n. 37/2011.
Trata-se de um projeto que não foi antecedido de estudo meticuloso acerca de suas causas e efeitos. O Congresso Nacional não voltou a devida atenção a pontos mais relevantes do atual sistema penal vigente.
Como é de conhecimento, o Código de Processo Penal brasileiro optou pelo sistema de investigação preliminar policial, no qual incumbe à polícia judiciária, em princípio, chefia todos os atos a serem realizados para a apuração de eventual infração penal (LOPES JR., 2001, p. 57).
São severas as críticas a esse sistema, mormente por se tratar de um sistema arcaico, que não mais atende à realidade brasileira. Chega-se inclusive a afirmar que se trata de um sistema em crise (LOPES JR., 2001, p. 57-58).
Embora em 1941, data da promulgação do Código de Processo Penal, tenha prevalecido a tese de que o sistema de investigação policial era o que melhor se adequava ao contexto, hodiernamente não se justifica a manutenção do mesmo, tampouco o absurdo de se conferir exclusividade à polícia judiciária na condução das investigações criminais (LOPES JR., 2001, p. 58-59).
Os agentes policiais, em razão do seu baixo nível cultural e econômico, estão mais suscetíveis a influências externas, por parte dos meios de comunicação social, do poder político e da própria sociedade, que exige uma resposta ágil aos dos delitos praticados, principalmente aqueles veiculados na mídia. Em decorrência, a corporação está mais vulnerável à prática de atos abusivos (violação a direitos fundamentais dos suspeitos e indiciados) e corrupção (não são raras as notícias de tais atos por partes de agentes das polícias judiciárias). Estas circunstâncias inclusive colocam em cheque a atuação da polícia e, consequentemente, o valor probatório dos elementos colhidos ao longo das investigações preliminares criminais, o que exige sua repetição em juízo. Por fim, neste sistema há evidente prejuízo à defesa do investigado, dada a ampla discricionariedade conferida à autoridade policial que nega qualquer possibilidade daquela participar das investigações, seja indeferindo diligências solicitadas ou mesmo acesso aos autos do inquérito (LOPES JR., 2001, 62-63).
Daí a tendência naquelas nações denominadas avançadas e democráticas – Estados Unidos, França, Alemanha, Espanha – em não se adotar tal modelo.
Pelo que demonstra a história, apenas três países, excluído o Brasil, ainda hoje apresentam sistema no qual a policia detém exclusividade nas atividades de investigação. São eles, Uganda, Indonésia e Quênia (MENDRONI, 2006).
Deveríamos então abandonar a adoração brasileira pelos sistemas europeu e norte-americano e alinharmo-nos ao sistema como os dos países citados? Deveríamos permanecer, ou pior, retroceder com os nossos métodos de apuração das infrações penais tão (in)eficientes, como pretendem nossos representantes?
Embora seja considerável a parcela daqueles que entendem impraticável entre nós o sistema de investigação preliminar a cargo do Ministério Público (promotor investigador), parece mais coerente a posição de Aury Lopes Júnior, que, ao defender este sistema, anota que suas vantagens sobrepõem os inconvenientes, sendo plenamente possível sua admissão no direito interno (LOPES JR., p. 80-81).
Ainda que se perfilhe a tese de que neste sistema é visível a disparidade de armas entre as partes ou que haja parcialidade do órgão de acusação, as mesmas não se sustentam.
O Ministério Público, seja na condição de órgão interveniente (custos legis), seja como órgão de acusação (parte), sempre atua com imparcialidade. Tanto que, “verificando ser o réu inocente, ou não havendo provas seguras de que a condenação deva ser prolatada, deve […] postular pela sua absolvição” (RANGEL, 2012, p. 165). O interesse que defende em juízo não é privado, mas o interesse público (MAZZILLI, 2011).
E ainda que assim não fosse, é de se indagar: há hoje, na fase processual, paridade de armas entre o Ministério Público e a defesa? Ou, na fase pré-processual, entre o delegado de polícia e a defesa?
Ilustra bem o fato a existência de prazos processuais impróprios destinados aos delegados de polícia (CPP. Artigo 10, caput) e aos promotores de Justiça (CPP. Artigo 586). Demais, a autoridade policial, não raras vezes, indefere arbitrariamente diligências reputadas essenciais para a defesa (TOURINHO FILHO, 2012, p. 121-123).
Assiste razão a Lenio Luiz Streck quando afirma que realmente necessitamos de uma Proposta de Emenda à Constituição em matéria de investigação preliminar (STRECK, 2013). Não uma que iniba a atuação do parquet, mas que explicite a opção por um sistema mais eficaz.
Não se estará, ao contrário do que apregoam algumas vozes, atestando a presença de poderes irrestritos aos membros do Ministério Público.
Toda a atividade estatal submete-se, primordialmente, ao princípio da legalidade – não mais compreendido em uma acepção restrita, de submissão apenas à lei formal, mas de vinculação dos agentes aos ideais de justiça (DI PIETRO, 2012, p. 29-30) –. E, especificamente em matéria criminal aos princípios do promotor natural, do ônus da prova na ação penal condenatória e da inadmissibilidade provas obtidas por meios ilícitos (RANGEL, 2012, p. 41-92).
Não bastasse a presença destes mecanismos, o Ministério Público submete-se a controle perante outros órgãos e setores da sociedade, como o Conselho Nacional do Ministério Público (CF. Artigo 130-A, §2º), o Poder Judiciário e a própria sociedade.
Merece destaque o voto-vista proferido pelo Ministro Cezar Peluso no Recurso Extraordinário n. 593.727/MG, pendente de julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal.
Embora tenha consignado em sua manifestação que a investigação criminal pelo Ministério Público não encontra, segundo ele, respaldo na ordem legal vigente, expôs algumas situações excepcionais e taxativas em que poderia o parquet conduzir diretamente as investigações[4].
Sobressai também o Substitutivo à Proposta de Emenda à Constituição n. 37-A, de 2011, de relatoria do deputado federal Fábio Trad, que acrescenta o §10 ao artigo 144 da Constituição Federal e o artigo 98 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Conforme o substitutivo, a modificação do texto constitucional não incluirá a investigação criminal como atividade exclusiva das polícias judiciárias, ressalvando a competência para apuração de infrações a cargo do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, das Assembleias Legislativas ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, das Comissões Parlamentares de Inquérito, do Próprio Ministério Público e dos Tribunais:
Desta forma, consagra-se a primazia da polícia na apuração das infrações penais comuns, mas não a exclusividade da atividade, atendendo, ao menos em juízo perfunctório, exigências dos delegados de polícia e dos membros do Ministério Público.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, em conclusão, tem-se o seguinte:
-
- O Ministério Público passou por profundas mudanças em sua estrutura, possuindo, atualmente, posição de destaque no cenário nacional.
- Essa onipresença do parquet tem despertado repulsa por parte de alguns setores da sociedade, especialmente dos delegados de polícias e parlamentares, sendo que a apresentação da Proposta de Emenda à Constituição n. 37/2011 e sua recente aprovação em duas Comissões da Câmara dos Deputados acirrou o debate.
- Os argumentos utilizados na disputa travada desbordam dos limites jurídicos, assumindo feição meramente política, seja pela utilização de expressão como “PEC da Impunidade” ou “PEC da Legalidade”, por meio das quais se pretende alcançar uma maioria desprovida do devido conhecimento acerca dos reais interesses postos em conflito, o que preocupa dada a proximidade da votação da mencionada Proposta de Emenda à Constituição.
- Sem prejuízo da propositura da mencionada PEC, a atual Constituição Federal plenamente legitima a investigação criminal a cargo do Ministério Público, e isto decorre da análise conjugada das disposições do artigo 144 c/c os artigos 127 e 129,todos da Constituição Federal.
- A segurança pública não é questão restrita às corporações policiais, mas matéria de interesse geral e responsabilidade de todos, inexistindo no texto constitucional cláusula de exclusividade em matéria de investigação criminal. Destaca-se nesse ponto a teoria dos poderes implícitos, plenamente aplicável ao direito brasileiro.
- A PEC n. 37/2011 indica um retrocesso na discussão acerca do modelo de investigação preliminar brasileiro, rebaixando o Brasil ao patamar de Países como Congo, Indonésia e Uganda, que ainda hoje adotam sistema no qual a investigação é exclusiva da polícia, afastando-se, de vez, das nações ditas desenvolvidas (Estados Unidos, Alemanha, Itália, Argentina, Colômbia etc.).
- Não se justifica a manutenção deste sistema, especialmente no direito pátrio, por se tratar de um sistema em crise. A polícia judiciária, em razão de seu reduzido nível cultural e econômico, encontra-se mais suscetível a influências externas, principalmente dos próprios órgãos do Estado, o que indica descrédito do material colhido nas investigações empreendidas por estas corporações não só perante o Poder Judiciário, mas perante a própria sociedade, sendo constantes as notícias de abusos e corrupção perpetrados por seus agentes.
- Uma solução em substituição ao defasado inquérito policial seria a adoção do sistema de investigação preliminar a cargo do Ministério Público (promotor investigador), ainda que se trate de uma questão de lege ferenda. Essa colocação não afasta o poder investigatório do Ministério Público, conferido pela Constituição da República; apenas propõe uma reflexão com relação ao atual sistema.
- Ao realizar atividades de investigação, o Ministério Público se submete a controle, ao revés do afirmado por algumas vozes. Durante a investigação seus membros devem observar os princípios constitucionais e demais normas jurídicas. Eventuais abusos estão sujeitos a controle pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Submete-se, ainda, a controle externo por parte dos diversos agentes sociais (movimentos sociais, mídia e população). À vista de uma possível mudança do sistema de investigação preliminar, seria prudente a instituição de um modelo de controle a cargo do Poder Judiciário.
- Não se está a defender uma forma de exclusividade do Ministério Público na condução de investigações preliminares criminais ou a submissão das polícias judiciárias a este órgão estatal. Não! O que se postula é a concorrência na investigação criminal. Não se desconhece a primazia da polícia na condução das investigações criminais. Entretanto, este fato não obsta a concorrência dos demais órgãos em matéria de investigação criminal
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NOTAS DE FIM
[1] Acadêmico do 10º período do Curso de Direito do Centro Universitário Newton Paiva.
[2] José Afonso da Silva (2005) anota que, teórica e tecnicamente, a Emenda Constitucional n. 1/69 outorgou nova Constituição, vez que o texto da Carta anterior foi completamente reformulado, a começar pela denominação que se deu ao documento, “Constituição da República Federativa do Brasil”, enquanto a Carta de 1967 se chamava apenas “Constituição do Brasil”.
[3] Caso aprovada a PEC n. 37, será incluído o §10 ao artigo 144 da Constituição Federal, com a seguinte redação: “A apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo, incumbem privativamente às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente”.
[4] Segundo Cezar Peluso, o Ministério Público poderia realizar, diretamente, atividades de investigação “desde que observadas certas condições e cautelas tendentes a preservar os direitos e garantias assegurados na cláusula do devido processo legal”. Dentre estas peculiaridades, destaca que a investigação deveria ocorrer (a) mediante procedimento regulado, por analogia, pelas normas concernentes ao inquérito policial e, por consequência, (b) supervisionado pelo Poder Judiciário.