Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva

Carlos Magalhães[2]

 

RESUMO: A partir da análise qualitativa de entrevistas em profundidade realizadas com pessoas presas em decorrência da prática de algum crime, o artigo investiga o modo pelo qual os próprios entrevistados fazem ou não referência à racionalidade, ao planejamento e à identificação de custos e benefícios relacionados às práticas criminosas. Constatou-se que aproximadamente metade dos 55 entrevistados falou sobre planejamento das ações e mencionou a incidência de custos e benefícios em suas ações. Mas não seria apropriado afirmar que os entrevistados têm uma visão estratégica de sua atividade e que avaliam cuidadosamente os custos e benefícios inerentes à conduta criminosa. Observou-se que, em momento algum, fizeram uma análise de sua própria ação tomando a ideia de “escolha racional ótima” como um pressuposto interpretativo. Concluiu-se que algumas análises que tomam a racionalidade como um princípio metodológico de interpretação da ação se equivocam quando supõem a existência de uma separação nítida entre o “antes” e o “depois” da opção pelo crime. Em seus relatos, os entrevistados partiram do pressuposto de que a decisão pela ação criminosa já estava tomada e, a partir dessa decisão, consideraram os riscos e benefícios do crime, em grande medida, como inevitáveis. 

 

PALAVRAS-CHAVE: Crime; racionalidade; custos; benefícios; escolha.

 

Área de Interesse: Criminologia; Sociologia Jurídica. 

 

1 INTRODUÇÃO

A criminologia e a sociologia do crime discutem se a ação criminosa é resultado de uma determinação (que pode ser biológica ou sociocultural) ou se é resultado da livre escolha do agente. No caso de o crime ser resultado da escolha, discute-se a possível racionalidade da opção e a ocorrência ou não de cálculo de custos e benefícios. As abordagens mais próximas dos estudos econômicos apresentariam um resultado artificial, na medida em que os agentes são entendidos como conhecedores de todas as informações relativas ao ambiente da ação. As pesquisas que se baseiam em entrevistas semi-estruturadas e em profundidade com criminosos (nas ruas ou na prisão) contribuíram para relativizar a ideia de cálculo racional (Cf. LETKEMANN, 1973; TUNNELL, 1992; WRIGHT & DECKER, 1994; 1997; CROMWELL, 1999). Um modelo “informal” de escolha racional (Cf. CLARKE e FELSON, 2004) seria mais apropriado para a compreensão de escolhas e decisões que ocorrem em condições de falta de informações e de condicionamentos cognitivos específicos. De fato, não é possível, especialmente no caso de criminosos que agem nas ruas e em condições precárias, o conhecimento de todas as informações necessárias para uma decisão racional. Além disso, mesmo quando têm consciência dos riscos, os criminosos podem usar certos recursos cognitivos de neutralização da percepção dos custos associados à prática do crime (Cf. TUNNEL, 1992; WRIGHT & DECKER, 1994; 1997).

Neste artigo, vamos analisar as falas de pessoas que se encontravam presas pela prática de algum crime e que passaram por entrevistas em profundidade cujas perguntas tinham como objetivo verificar os tipos de percepção relacionados aos possíveis riscos e benefícios da atividade criminosa[3]. Procuramos verificar como reagem às perguntas e se constroem ou não narrativas que tentam dar conta de questões como planejamento, estratégia e compensação. Isto significa que pretendemos verificar se e como os próprios entrevistados usam a noção de racionalidade na elaboração de seus relatos sobre as atividades criminosas. A racionalidade e as noções associadas de planejamento, riscos e benefícios do crime podem ou não estar presentes nos relatos elaborados pelos entrevistados. Pretendemos verificar se estão presentes e como essas noções são usadas na elaboração dos relatos. Isto é, não usamos a noção de racionalidade como um pressuposto analítico para determinar se as ações são ou não racionais (cf. GARFINKEL, 1967).

Vale lembrar que, de acordo com a natureza dos dados que utilizamos, só podemos avaliar a percepção dos entrevistados sobre o tema. Não temos a pretensão de chegar a alguma conclusão objetiva sobre a existência ou inexistência de ações criminosas estratégicas na realidade. Nosso interesse nessa questão está ligado ao fato de que, ao serem acusados, os agentes de práticas criminais são frequentemente rotulados a partir da presença ou ausência de racionalidade e planejamento em suas ações. Podem ser vistos como pessoas que agem por impulso ou como pessoas capazes de executar ações mais elaboradas e planejadas. Nosso objetivo é verificar como os próprios agentes de práticas criminais elaboram essas questões em suas entrevistas.

Dos 55 entrevistados, metade falou sobre planejamento ou demonstrou em suas falas algum tipo de preocupação com os custos, benefícios e compensações da atividade criminosa. A outra metade não apresentou nenhum tipo de consideração sobre esse tema. Todos foram perguntados sobre o tema, mas muitos simplesmente não demonstram interesse no assunto. O fato de terem falado sobre planejamento não significa necessariamente que agiram de forma estratégica. Significa apenas, na maior parte das vezes, que tinham algum tipo de consciência dos riscos que estavam correndo enquanto agiam e que foram capazes de tratar desse assunto de forma mais ou menos consistente nas entrevistas. São poucos os casos em que os relatos elaboram a percepção de algum tipo de estratégia consciente.

 

2 O RISCO INERENTE À ATIVIDADE CRIMINOSA

Mesmo quando a questão dos riscos e benefícios do crime é levada em conta pelos entrevistados, parece ser pensada de acordo com uma constatação anterior de que a opção pela vida de crimes envolve riscos dos quais não seria possível escapar. Essa constatação funciona como um pressuposto interpretativo que orienta e dá sentido aos relatos dos entrevistados. A partir do momento em que alguém se encontra “nessa vida do crime”, deve aceitar a sua lógica própria, diriam os nossos entrevistados. O fato é que mesmo quando a consciência sobre o risco existe, e mesmo que as precauções estejam mais ou menos presentes, existe uma percepção de que em algum ponto de uma vida de crimes alguma coisa não só pode como vai dar errado e, que, com o passar do tempo, a probabilidade de um fracasso torna-se cada vez maior. Os períodos de sucesso são percebidos e identificados, mas sempre está presente a noção de que aquele sucesso pode acabar a qualquer momento. Obviamente não podemos separar essa percepção do fato de que entrevistamos criminosos presos. É uma percepção que não se separa da experiência do encarceramento.

Esse tipo de constatação é apresentado de forma fatalista, como se fosse parte da natureza das coisas. É interessante notar que alguns entrevistados disseram que ao abordar a vítima anunciam: “perdeu, perdeu, entrega tudo”. Com a palavra “perdeu” pretendem informar à vítima que daquela vez ela está em desvantagem e que não pode fazer nada contra a situação. Informam à vítima que ela não deve reagir, pois já perdeu. A reação só poderia aumentar a perda que já teria acontecido. A vítima seria, assim, instada a aceitar o roubo, por exemplo, como um fato consumado. A vítima pode sentir dificuldade em aceitar a perda – e esboçar alguma reação – pois não está familiarizada com a condição de vida em que o momento do ganho e o momento da perda se alternam com frequência e de uma maneira relativamente aleatória. Talvez por esse motivo, os autores do roubo, como mostram Wright e Decker (1994; 1997), procurem amedrontar a vítima, de modo que ela se convença da “seriedade” da situação.

É curioso notar que a mesma palavra – perda – é usada pelos entrevistados para descrever o momento em que são detidos pela polícia. Nessa ocasião é o criminoso que se vê em desvantagem e sem saída. Dessa vez foi ele que perdeu. As formas pelas quais as duas situações são descritas nos levam a crer na existência de uma concepção de que a vida de crimes envolve o ganho e a perda, a vantagem e a desvantagem. Quem é “do crime”, com dizem, deve estar preparado para as duas situações porque elas acabam acontecendo mais cedo ou mais tarde. Mesmo aqueles que entendem que é preciso tomar certos cuidados acreditam que não é possível controlar todas as variáveis e que a atividade em que estão envolvidos apresenta certos riscos inevitáveis. As expressões de arrependimento pelo envolvimento com o crime, provocadas especialmente pela experiência da prisão, são razoavelmente frequentes, mas o arrependimento diz respeito ao envolvimento de um modo geral e é acompanhado de expressões como: “o crime é ilusão” ou “o crime já não é o mesmo de antes”. Os entrevistados não se arrependem por não terem tomado mais cuidado em uma ocasião específica. Normalmente pensam que tomaram o cuidado possível. A percepção é de que, ao se envolver com o crime, estão correndo o risco de perder, e esta perda acontecerá mais cedo ou mais tarde. Arrependem-se, na cadeia, da opção pelo crime, que seria uma ilusão.

Sandro narra a sua trajetória destacando a incerteza em relação ao resultado das ações.  

Com 15 ano já tava roubando. Roubava, é…, pagamento, pagamento de firma, entendeu? Pra usá droga. Alguém contava e a gente ia lá e metia a fita. A gente arrumava informação e tal. Aí costuma dá certo e costuma dá errado, costuma cê entrá em cana fragado, é embaçado. 

 O crime pode dar certo ou pode dar errado. O risco é visto como uma parte inseparável da atividade. Perguntado se pensava, antes da ação, na possibilidade de alguma coisa “dar errado”, respondeu: “Ah, isso aí com certeza, né? Mas tinha que fazer alguma coisa, né?” Sandro pensava que podia dar errado, mas isso não era motivo para deixar de praticar o crime, pois “tinha que fazer alguma coisa”. Neste caso, podemos notar a presença de uma pressuposição que ordena a percepção e o relato sobre os riscos. Dado que “é preciso fazer alguma coisa”, os riscos, se percebidos, deverão ser assumidos e administrados até onde for possível. 

Geraldo desenvolve argumentos interessantes que se colocam entre uma concepção mais fatalista que considera o risco como um aspecto intrínseco à atividade e uma concepção que envolve a preocupação com o risco desnecessário e a tomada de certos cuidados. “Nesse assalto que eu tô nele [pelo qual foi condenado] eu assaltei um taxista, tentei roubar o carro dele e ele reagiu, aí eu dei nele um tiro ainda”. Perguntado sobre por que tentou roubar um taxista, responde:  

Porque foi o único que passou na hora. Pra te falar procê a verdade, eu queria o carro dele, só precisava do carro. Porque com o carro eu roubaria outras coisa. Entendeu? Ia usar simplesmente o carro. É o que nós chama no crime ‘ pra avião’. Aí depois eu ia roubar uma joalheria. 

Sobre a preparação do roubo à joalheria, diz:  

O crime é o seguinte, aqui, ó, vão supô assim, a gente vai roubar, ocê tem que ir lá, olhar como é que é, assim, se eu fosse saí daqui eu ia roubar uma joalheria que tem numa cidade aí. Nem eu não moro lá. Minha mulher mora, minha ex-mulher. Só que é o seguinte: Cê olha direitinho, como que é a joalheria, o que que vai ter lá dentro, se vai compensá ocê roubá, mais ocê tem que roubar ou um carro ou uma moto com antecedência, entendeu? Leva, troca a praca, que chama cronagem, que eles falam. Porque aí cê troca a praca que cê vai andá normal com o carro. Então tudo isso é estudado. E tem outra coisa também é, vamo supô, eu vou lá no local que nós vamos roubar, eu estudo a fita, que nós chama de fita. Aí cada um depois vai dar a sua ideia, como que vai ser pêgo a parada. Como que vai fugir. Qual parada que vai pegá, se nós pega ela abrindo, se nós pega ela fechando, se nós pega no meio do dia. Cada um vai jogá uma ideia, cada um vai ter uma visão. 

 Neste caso fica evidente a existência de um “conhecimento” que seria colocado em prática no momento do planejamento do crime e é reproduzido no relato. Ao mesmo tempo, é claro que o planejamento é sempre precário, pois não é possível controlar todas as variáveis que podem intervir. Em algumas situações, a urgência pode fazer com que todo o conhecimento seja deixado de lado e o risco maior seja assumido. O roubo do táxi, mencionado por Sandro, seria uma dessas situações. Como disse o entrevistado, “foi o único que passou na hora”. Mais uma vez, do ponto de vista do agente, a necessidade é o pressuposto que dá sentido ao relato de porque assumiu um risco muito grande. Dado que o planejamento é sempre precário e considerando o fato de que às vezes é preciso agir com urgência, a chance de fracasso está sempre presente. Ao mesmo tempo em que a opção pelo risco excessivo e o consequente fracasso são explicados, ou ganham sentido, a partir do pressuposto de, em alguns casos, “é preciso fazer alguma coisa”, independente dos custos envolvidos. 

Geraldo explica que deixava de assaltar quando tinha dinheiro. Estaria correndo um risco desnecessário de ser preso. O seu raciocínio demonstra que considera a possibilidade de “perder”, de ser preso, como algo que faz parte necessariamente da atividade criminosa. A partir do momento em que está no crime, não tem como anular completamente o risco. Muitos entrevistados demonstraram conviver com essa ideia com certa tranquilidade.  Mais um trecho da entrevista do Geraldo: 

Se eu tiver com dinheiro na mão eu não assalto não. Porque senão você vai correr o risco, vamo supor assim, você vai assaltar um camarada ali, você pega 150 mil numa joalheria, tá eu e mais um, pega 150 mil na joalheria, aí eu sei que dá 75 mil pra cada um. Sempre nós troca em droga, em arma, essas parada, mas dá pra virá um dinheiro. Aí eu vou correr o risco de buscar mais 30 mil, dá 15 mil pra cada um, aí o que que acontece? Nós pode perder, pode ir pra cadeia. 

Geraldo resume bem a perspectiva segundo a qual, mesmo quando se tem algum cuidado ou planejamento, existe um risco fundamental, intrínseco à atividade, do qual não se pode afastar. Em relação a esse risco fundamental nada pode ser feito. É preciso contar com a sorte.

Apesar de já ter furtado em supermercado, Warley diz que o seu “negócio não é furto, meu negócio é mais mexer com a droga. Meu negócio é mais tráfico. Só tive passage pelas polícia, ida e volta, né, na delegacia, mas condenação mesmo foi aqui. Tô condenado a seis ano no 12”. Afirma que gosta da “gandaia”, mas que também investiu comprando lotes e casas. O investimento, de acordo com Warley, é necessário porque a vida de traficante é incerta. Pode estar muito bem em um momento e logo em seguida pode estar na cadeia.  

Meu negócio é gandaia, mas também investi, porque a gente que tá no crime tem que investi. Na balada, zôa pra tudo que é lugar, ir na boate. Toma uns doce, uns comprimido, loucura e zôa. Mas também pensando na frente. Comprá uns lote, umas casa, o negócio é investi, porque quem tá no tráfico pode tá num momento igual aqui tô eu, né? É porque hoje cê pode tá no alto, mas amanhã pode tá aqui no sufoco. Então se ocê investi o que que acontece? Você não vai perder o investimento, porque tá lá alugado, alguma coisa assim. 

 Apresenta-se a ideia de que por melhor que esteja em certo momento, a pessoa envolvida com o crime pode “perder” e enfrentar dificuldades. A possibilidade de ser preso é apresentada como algo que faz parte da atividade e não rende maiores elaborações. Ao mesmo tempo, a prisão, na fala de Warley, é vista como um “momento”, um período que vai terminar mais cedo ou mais tarde. Como fez os seus investimentos, espera encontrar uma situação minimamente estruturada quando sair.

 

3 PRECAUÇÕES, PLANEJAMENTO E FRACASSO 

As afirmações que apontam mais diretamente para a existência de algum tipo de cuidado são como a de Sidney: “Comecei com arrombamentos de casas, pela facilidade e falta de segurança”. Uns poucos, especialmente assaltantes de bancos ou estabelecimentos comerciais maiores, disseram fazer algum planejamento mais detalhado. Na prática, o que acontece com frequência no caso de roubos a estabelecimentos comerciais, de acordo com os entrevistados, é que as informações vêm de algum funcionário. Além disso, com exceção do assalto a banco, não há muita justificativa para planejamentos muito longos. A maioria dos criminosos age nos momentos em que estão sem dinheiro e não teriam, portanto, condições de planejar. Na maior parte das vezes, há um planejamento mínimo. Mas há casos em que não existe planejamento algum.

Olívio utilizava uma técnica para invadir casas e roubar: “É o seguinte, cê passa de manhã na rua, cê escolhe um bairro nobre, bate campainha. Insiste na campainha. Ninguém atendeu não, cê cai pra dentro.” Quanto aos dispositivos de segurança, disse não ser problema:  

Alarme não é problema não. Eu monto e desmonto qualquer um. O problema é você não dar de cara com a vítima. Eu tenho que resguardar a vítima, porque seu eu agredir a vítima ou qualquer coisa o juiz vai me dar a pena com agravante.  

O problema é encontrar a vítima, daí o cuidado de verificar antes se a casa está vazia. É curioso esse raciocínio. A possibilidade da prisão não é apresentada como algo que intimida, mas o entrevistado se preocupa em não agredir a vítima para que sua pena, em caso de prisão e condenação, não seja agravada. O fato é que a possibilidade da prisão representa o risco já assumido, inseparável da atividade. No entanto, alguns cuidados podem ser tomados para que, no caso de um fracasso, a pena não seja aumentada. Um elemento que ajuda a compreender esse aparente paradoxo é a sempre presente preocupação dos presos com a progressão do regime. Na verdade, pelo que foi possível observar nas entrevistas e conversas informais, os presos não pensam em suas penas pela quantidade total. Pensam sempre no mínimo que deverá ser cumprido para que sejam alcançados os benefícios que, em vez de resultado de merecimento, são vistos como uma espécie de “direito adquirido”. Tanto é assim que uma das principais reclamações ouvidas nas entrevistas é a de que a pena já se estendeu além do tempo em que deveria ser concedido o primeiro benefício. Nesses casos, os presos costumam desenvolver verdadeiras teorias sobre a não concessão. Uns acham que o benefício está travado porque a vítima era uma autoridade, outros acham que é perseguição da polícia ou dos agentes penitenciários. De uma forma ou de outra, estão sempre elaborando as razões que explicariam a não concessão do benefício no tempo esperado. 

É também curioso o fato, evidente nas entrevistas gravadas e nas conversas informais, de que boa parte dos presos não gozou totalmente do benefício obtido. Não são poucos os presos que depois de um tempo, que pode variar de meses a dias, voltam à prisão, como dizem, “recapturados”. Não temos dados quantitativos sobre essa realidade, mas a impressão formada a partir das entrevistas e conversas informais é de que boa parte dos presos acaba se acostumando com uma rotina de entradas e saídas, mais ou menos espaçadas, da cadeia.

Podemos concluir a partir não só da fala de Olívio, como também de conversas informais durante o trabalho de campo, que muitos entrevistados consideram as temporadas na prisão como uma parte “normal” e “natural” de suas experiências de vida. As pessoas que levam uma vida convencional têm dificuldade de compreender essa realidade. Os presos, no entanto, parecem considerar que “ser do crime” ou “entrar para o crime” é uma situação que envolve inevitavelmente a experiência do encarceramento. As expressões de arrependimento que são ouvidas com frequência estão relacionadas, muitas vezes, à “comprovação” ou documentação reflexiva (cf. GARFINKEL, 1967; HERITAGE, 1984) da ideia de que “ser do crime” significa passar pela prisão mais cedo ou mais tarde e mais ou menos vezes. As falas que mencionam a noção de que o crime não compensa ocorrem sempre dentro do contexto da experiência do encarceramento.

Mas a prisão não provoca apenas expressões de arrependimento. Provoca também expressões de satisfação, por mais estranha que essa ideia possa parecer aos membros convencionais da sociedade. O tempo de prisão pode ser narrado como um período de descanso, de calma em comparação com a “correria” da vida do lado de fora. Não foram poucos os que se referiram à prisão como o lugar em que se viram protegidos da possibilidade de estarem mortos ou aleijados, caso continuassem na vida de crimes. Alguns disseram que foram presos porque foi essa a maneira encontrada por Deus para protegê-los. Muito provavelmente, esse discurso sobre o “lado bom” da prisão só ocorre ao entrevistado quando ele está efetivamente preso. Não sabemos se os criminosos que estão na rua pensam conscientemente nas “vantagens” de estar na cadeia. Mas no momento em que se encontram presos, talvez até para amenizar a frustração, muitos desenvolvem essas ideias que tratam das vantagens de estar encarcerado.  

 

4 NOÇÕES DE AÇÃO ESTRATÉGICA 

Fabrício foi um dos que elaborou em sua entrevista uma noção de ação estratégica.  

A gente róba sempre no lugar mais movimentado. Só no centro da cidade. Na Afonso Pena. É muito mais fácil roubar no centro, sô. Pelo seguinte: o policial no centro ele só prende quem ele vê correndo, ele não prende quem ele vê andando não. Ele pega a pessoa muito pela roupa. Se você róba com uma blusa tira a blusa e coloca dentro da bolsa e sai com outra não tem porque ele te parar. Vai andando calmo no centro… nós sempre roubamos muito bem vestidos então eles nunca deu como suspeita. Achava que era office boy, alguma coisa, andando no centro da cidade. A gente no centro, robô, entrô no meio do povo, rapidim entrou dentro do carro. Pra casa. Tem problema nenhum. Tanto que eu rodei, fui preso num lugar que não é tão movimentado. O pessoal acha que roubar no centro é mais difícil, mas é mais fácil. 

 O entrevistado é capaz de elaborar um relato que apresenta o “conhecimento” relativo à situação em que age. No entanto, o conhecimento, ainda que exista e seja relatado, pode não ser utilizado em algum tipo de planejamento. Tanto que, apesar do “conhecimento”, o entrevistado praticou o roubo em um lugar que ele mesmo considerava inadequado e foi preso, “rodou”, nessa ocasião. Nesse caso, é possível perceber uma separação entre o relato retrospectivo sobre ações e o que acontece de fato no momento da ação. O fato é que a consciência dos riscos não significa necessariamente dissuasão. Mesmo tendo consciência dos riscos, muitos entrevistados, ainda assim, agiram. Como já foi constado em outras pesquisas (Cf. WIRGHT & DECKER, 1994; 1997), os criminosos, mesmo quando têm consciência dos riscos que estão correndo, parecem interromper esse tipo de pensamento a partir do momento em que decidem agir. Alguns chegam a dizer que o pensamento sobre o risco pode ser negativo e atrair a má sorte. O fato é que os criminosos apresentam uma compreensão bastante evidente do fato de que, por mais racionais que possam ser, essa racionalidade é severamente limitada pela falta de informações relativas ao contexto da ação. Por mais que avaliem a situação e considerem os custos e benefícios, a partir do momento em que começam a agir o inesperado pode acontecer. A vítima pode reagir, o estabelecimento comercial pode ter seguranças armados e até mesmo a polícia pode passar no exato momento em que o crime está em curso.  

A suposição de que pensar no risco pode ser perigoso aparece na fala de Olívio. O entrevistado conta a seguinte história:  

Nós fomos fazer o assalto, aí foi o seguinte, na hora lá nubrô, a polícia passô muito na área, aí o camarada que tava com a gente foi e cabrerô, ele cabrerô, eu falei ‘cê fica cabrêro eu já num vô na fita porque se não vai matá os outro, certo?’ Não vão mais, por causa disso aí nós não vamo mais. Aí fomo e voltamo.  

Nesse caso, o medo da polícia teria feito um dos participantes do assalto ficar desconfiado e temeroso. O entrevistado desistiu da ação porque pensou que o medo poderia fazer com que atirassem em alguma vítima durante o roubo. Mais uma vez, aparece a preocupação com a vítima na medida em que a agressão pode significar o aumento da pena. Na verdade, o pequeno trecho acima faz parte de uma entrevista longa e confusa em que o entrevistado narra a história da tentativa de assalto abortada, que acabou resultando em um sequestro mal sucedido. De acordo com o entrevistado, ao abandonarem o local do assalto, encontram uma mulher e tomaram a decisão de sequestra-la. A mulher era filha de um policial militar e, no final das contas, todo o grupo foi preso. O entrevistado procura narrar uma sequencia de desacertos que terminou com a sua prisão. O entendimento da sequencia desastrada foi construído a partir da ideia inicial de que o medo sentido pelo companheiro era um indício de que as coisas não caminhavam bem.

Fabrício, especialista em roubos a casas lotéricas, quando perguntado sobre o uso do dinheiro roubado, demonstrou não ter se preocupado em guardar. Disse que poderia ter uma boa situação se tivesse guardado dinheiro, já que teria chegado a obter R$ 15.000,00 em um único assalto.  

Alguma coisa a gente sempre guarda, mas não é nem a metade do que eu consegui, né? Se eu tivesse guardado mais um pouco teria muito dinheiro, porque eu tava roubando era toda semana. Várias lotéricas por semana. Acho que eu não sube aproveitar, né.”  

Fabrício constata, da forma pragmática que lhe é peculiar, que é fácil gastar dinheiro. “Gastá é fácil, achar amigo pra gastá é fácil. Vai aí de uma cidade pra outra. Duzentos, trezentos reais de táxi, é fácil. É interessante a maneira pragmática e direta como conclui seu raciocínio ao dizer: “Acho que eu não sube aproveitar, né”? Vale lembrar que esse entrevistado é o mesmo que disse de forma tão direta e sem subterfúgios que “droga, sair pro show, mulher, droga, bebida, farinha, roupa, celular, arma, relógio, moto, carro. “É isso aí que leva a gente a roubar, né”? A objetividade do relato apresentado por esse entrevistado nos mostra que até as agressões praticadas pela polícia podem ser percebidas como parte do jogo. De acordo com o entrevistado, em uma das vezes em que foi preso apanhou durante “uns 10 a 20 minutos porque eles queriam que eu falasse onde estavam os outros, mas eu não sabia e mesmo se soubesse não ia falar de jeito nenhum”.

Bruno, um estudante universitário, fala sobre os cuidados que tomava para não ser preso:  

O que que eu pensava? Pensava que quanto mais eu terceirizasse o negócio, menor seria o risco de eu cair. E eu tomava o maior cuidado com grampo telefônico, não conversava muito no telefone. Quando eu passei informação pro cara eu passei pessoalmente, só que quando ele foi repassar isso, falou pelo telefone, falou de produto de roubo pelo telefone. Quer dizer, eu achava que eu jamais ia chegar nisso. 

 Esse entrevistado é um caso à parte porque não participava diretamente dos roubos, apenas passava a informação sobre os dias em que o caixa da empresa estava cheio, nas vésperas de pagamento de funcionários. Talvez por esse motivo, por não conviver de perto com outros criminosos, não tenha adquirido a percepção de que a prisão é uma possibilidade muito real que acaba acontecendo, mais cedo ou mais tarde. Durante a entrevista, esse preso se mostrou perplexo com a situação que estava vivendo. Estar na prisão não era, de modo algum, uma experiência pela qual ele imaginou passar. No entanto, fez questão de mencionar várias vezes que o tratamento que estava recebendo dos demais presos era muito bom, que todos o apoiavam. Sempre que mencionava esse fato, procurava complementar dizendo que as pessoas “lá fora” têm uma visão distorcida sobre o ambiente carcerário.

 

5 AUSÊNCIA DE PLANEJAMENTO

Alberto nos apresenta uma narrativa em que não ocorre quase nenhuma menção a planejamento. O entrevistado afirma que escolheu assaltar uma mercearia porque assim poderia levar, além do dinheiro, alguns mantimentos.  

Foi de momento. A gente tava indo pra pegar o que aparecesse, né? Aí derrepentemente surgiu aquela mercearia, naquela hora, naquele momento, o dono tava abrino, tava mais fácil, tava mais prático, não tinha quase nada de movimento na rua aí só o dono que tava naquele momento abrindo o estabelecimento, foi isso. Aí decidiu ali naquele momento e mais rápido. Porque quanto mais rápido, melhor seria, pra gente fugir, pra gente ir embora.  

Embora não tenha falado de planejamento, podemos notar que o entrevistado elabora em seu relato um sentido de oportunidade. Os elementos que teriam atraído a sua atenção foram: o fato de a mercearia estar abrindo, o que indicaria o despreparo da vítima para reagir, o fato de o proprietário estar sozinho, a possibilidade de encontrar mantimentos e a facilidade de fuga. A possibilidade de encontrar mantimentos estaria ligada à falta de comida em casa, já que a citada mercearia ficava em um local relativamente próximo da residência do entrevistado.

 Curiosamente, na sequencia da entrevista, descobrimos que os assaltantes se equivocaram completamente. O comerciante não só estava preparado, como tinha um segurança armado dentro de seu estabelecimento. Com isso, houve troca de tiros entre os assaltantes e o segurança, a polícia chegou rapidamente e, no final das contas, Alberto foi preso em flagrante. Esse tipo de situação é mencionado com frequência nos relatos dos entrevistados. Boa parte dos presos já foi flagrada pela polícia. Esse tipo de ocorrência acaba por corroborar e documentar os relatos que elaboram a percepção de que a ação criminosa é fundamentalmente arriscada e que é preciso contar com a sorte para não “rodar”. 

Cláudio conta que a ideia do primeiro assalto surgiu de repente. Decidiram assaltar uma casa lotérica porque pensaram que haveria dinheiro. “Primeiro assalto? Foi uma casa lotérica. Não tava planejado não. Saímos mesmo, com as armas, né? Eu com uma arma e o colega com a outra e falamo: ‘Ah, vamo assaltá, a casa lotérica deve ter o dinheiro”. Perguntado se pensou sobre o risco de ser preso, disse: “Na época não. Que eu fui até preso na época, né? Não tinha muita maldade, né?” É interessante ressaltar o trecho: “a casa lotérica deve ter dinheiro”. As casas lotéricas são, sem dúvida, alvos bastante visados. Trabalham com dinheiro vivo, recebem pagamentos de contas de água, luz, telefone e carnês diversos. A segurança é precária. O entrevistado demonstra ter se sentido atraído pela possibilidade de encontrar dinheiro fácil. Acabou preso nessa tentativa de assalto, pois, como disse, “não tinha maldade”.  

Leandro contou que não olhava se tinha polícia e não escolhia o momento para fazer o roubo, pois agia “cheio de cerveja na mente”. Informou que só olhava se tinha polícia dentro do ônibus, “quer dizer, a Polícia Militar dá pra olhar, né? A Civil não dá, né? Porque eles usam roupa normal, né?”  Trata-se de uma situação típica vivida por jovens que bebem, usam drogas e assaltam motivados pelo desejo intenso de conseguir qualquer quantidade de dinheiro para continuar bebendo e usando drogas. Como conta, só olhava se havia polícia dentro do ônibus que pretendia roubar, isto é, não olhava nas imediações, na rua, em algum lugar em que o motorista pudesse parar o ônibus e entregá-lo. O próprio entrevistado ressalta que só dava para saber quando havia policiais militares, pois os civis não usam farda. Diante desse fato, mostra-se resignado. Já que não é possível saber, será preciso praticar o roubo sem essa informação, correndo o risco. A falta de cuidado seria provocada, de acordo com o relato do entrevistado, pela cerveja. A menção à cerveja pode ser vista como justificativa posterior e como técnica de neutralização da percepção do risco no momento da ação. Como justificativa, o entrevistado usa a cerveja para explicar, para si mesmo e para os outros, o porquê de não ter tomado certos cuidados indispensáveis. Como neutralização, como mostra Tunnel (1992), é comum a situação em que alguém que pretende praticar um crime faz uso de bebidas ou drogas para anular a própria percepção dos perigos da ação.

Quanto aos roubos, Leandro afirma que 

não é uma coisa boa não, né? Mas eu fazia por necessidade. Na hora ocê treme. Depois eu pensava no que eu fiz. No outro dia eu ficava pensando no trem. Nem queria sair na rua. Até que nesse último aí que eu fui preso, foi Deus mesmo que me pôs aqui dentro pra eu parar com esses trem.   

Leandro está entre aqueles que consideram a prática frequente do crime como uma espécie de vício, que não traz prazer, mas que é difícil de abandonar. A prisão não deixa de ser, de acordo com o seu relato, uma forma de se livrar, ainda que temporariamente, desse comportamento. Temos aqui um relato peculiar no qual o entrevistado conta que em vez de se sentir desestimulado para a prática do crime pelo medo da prisão, entende como positivo o fato de estar preso, pois assim não continuará praticando crimes.  

Júlio não pretende voltar a praticar crimes, pois acredita que o crime não compensa. O entrevistado afirmou que o dinheiro ganho com o crime é perdido facilmente. Como vários outros, parece acreditar que o que vem de uma forma “errada” não permanece.  

Não, pretendo não [voltar a praticar crimes] . Vi que cê pode até adquirir dinheiro nessa vida, mas com uma mão cê pega e com a outra vai. Você pode ficar 10 ano na rua roubando. Um dia ou outro vai dar errado. Cê vai dançá. O dinheiro todo que cê tem vai embora. 

 De certa maneira, tanto esse último entrevistado como o anterior, carregam uma espécie de culpa pelo que fazem, carregam um sentimento de que o crime é algo errado, e por isso pensam que, no final das contas, vão sair perdendo e que o crime não compensa. É possível perceber que enquanto uns acreditam que o fracasso é simplesmente uma parte inerente à atividade criminosa, outros enxergam no fracasso um sentido moral. De acordo com a interpretação de alguns dos entrevistados, o criminoso fracassaria sempre porque a atividade que ele pratica é moralmente errada. Outro aspecto importante relacionado à crença de que “o que vem fácil, vai fácil” é o fato de que essa situação pode, em muitos casos, corresponder ao estilo de vida mantido pelos entrevistados. Quando se vive a maior parte do tempo em uma espécie de festa (com bebidas, drogas, mulheres, viagens de táxi) que não termina nunca, qualquer quantidade de dinheiro acabará rapidamente. Como a manutenção desse estilo de vida é o principal objetivo de muitos entrevistados, a sua escolha não é colocada em questão. Em vez disso, desenvolvem a suposição de que “naturalmente” o que é conseguido facilmente é perdido com a mesma facilidade (cf. WRIGHT & DECKER, 1994 , 1997).

 

6 EXPRESSÕES DE ARREPENDIMENTO 

Como entrevistamos presos, naturalmente obtivemos muitas expressões de arrependimento e desilusão. Nesses casos é evidente que as considerações sobre o risco são posteriores ao ato. De acordo com Eliezer,  

depois que acontece que a gente vai pensar no que fez. Igual eu, não imaginaria que estaria preso. Depois de 20 minutos eu pensei:’ o que que eu fiz da minha vida?’ Porque na hora que cê chega no lugar cê tá naquela adrenalina. Depois, no outro dia, que cê pensa no que fez. 

 É interessante destacar nessa fala o uso da palavra “adrenalina”, que tem entre os entrevistados o sentido de excitação emocional, de exaltação. A palavra pode aparecer tanto em um sentido positivo como negativo. A adrenalina é uma coisa boa quando está ligada ao prazer, à aventura, à demonstração de coragem. Mas é uma coisa negativa quando está ligada ao medo, ao nervosismo. De uma forma ou de outra, conforme os relatos, um dos resultados da presença da adrenalina é uma visão centrada no presente imediato que não avalia os riscos envolvidos na situação. Da mesma forma que o álcool e as drogas, a menção à adrenalina estaria ligada tanto à justificativa de uma ação em que não foram tomados os devidos cuidados, como à neutralização da percepção dos riscos existentes. Nesse último aspecto, como mostra Tunnel (1992), nas conversas e nos preparativos que antecedem a ação, pode ocorrer uma antecipação mental dos resultados positivos, que funcionaria como uma espécie de ritual de encorajamento mútuo. As conversas preparatórias seriam assim, para usar a expressão de um dos entrevistados, “adrenalizantes” ou, como diria Tunnel (1992), neutralizadoras das sensações de perigo.

Outros entrevistados, quando falam sobre os possíveis benefícios do crime, elaboram uma percepção desalentada, como no caso de Teodoro, que disse:  

O caminho do 157 [assaltante] é só ou ele morre ou cadeia. Já ouviu falar de algum 157 que ganhou 500 mil Real? De 157 que tem fazenda, sítio? Tem nada. Não ganha nada não. Quando o cara assalta ele tá arriscando a vida. Hoje em dia não tá compensando é nada. Quem tá no crime tá perdendo é tempo.  

Nesse caso, aparece a ideia de que o crime envolve apenas riscos e o sentimento de que no passado as coisas eram melhores. Essa idealização aparece com frequência nas entrevistas. Mais uma vez, vale ressaltar, que formulações como a do trecho citado devem ser compreendidas como simultaneamente constituídas e constituintes do estoque de suposições relativas aos benefícios e custos do crime existentes no ambiente carcerário. É nesse ambiente específico e nas conversas quase ininterruptas que nele se desenrolam que se elabora e se sustenta a percepção coletiva de que o crime não compensa. Por esse motivo, não podemos tratar essas concepções colhidas durante as entrevistas como concepções dos criminosos em geral. São concepções dos criminosos presos. É bastante provável que os criminosos que estão nas ruas desenvolvam outras percepções.

André estava preso há 2 anos e 6 meses e disse já estar “com a cabeça feita. Não é igual antigamente. Antes eu era desnorteado. Para mim tudo era festa. Não tinha nada a perder. Agora eu quero construir a minha família, seguir a minha vida. Esse negócio de crime não presta não.” Esse tipo de discurso é frequente. Depois da prisão, o crime não compensa. A fala de Fabiano expõe esse pensamento com nitidez. Perguntado se o crime compensa, responde: “O crime não compensou porque eu tô preso, né? Nem o dinheiro hoje me põe na rua, né?” Para quem está preso é óbvio que o crime não deu bons resultados. É interessante observar que muitos entrevistados apresentam essa ideia com pragmatismo. Ou seja, em nenhum momento expressaram a ideia que o crime poderia ser algo legalmente ou moralmente errado, mas apenas uma alternativa que “deu errado”. As consequências negativas são percebidas como inerentes ao ato praticado e podem, inclusive, ser deduzidas pelo exame da situação. Não são percebidas como sanções correspondentes à quebra de uma regra ou lei (Cf. DURKHEIM, 1994: 67).

Quando estão cumprindo o período de pena, “pagando a cadeia”, como dizem, entregam-se a essas elaborações de que o crime não vale a pena ou que não compensa. Já teria sido bom no passado, mas agora já não é mais. Essa suposição de que o crime já não é bom como foi no passado, provavelmente uma idealização, é resultante dos relatos trocados dentro da cadeia. De qualquer forma, é uma suposição frequente. Muitos entrevistados ressaltaram que o crime não compensa na atualidade, embora já tenha compensado no passado.

Sidney conta que vai tentar trabalhar com os cunhados, porque “o crime é ilusão”.  

Com fé em Deus eu vou ver se eu trabalho com o meu cunhado. Tenho um cunhado que é caminhoneiro e outro que é mestre de obra. Eles mesmo já falaram com a minha esposa que quando eu sair, se eu quiser, eles me arrumam um emprego. E depois que eu sair eu não mexo com vida do crime mais não. O crime é pura ilusão. Acaba com a vida ficando preso, né? 

 O crime é ilusão porque o resultado mais frequente é a prisão, relata o entrevistado. Dessa forma é ilusória a ideia de que seria possível ganhar dinheiro facilmente e em grande quantidade. Mas esse é um típico relato de alguém que está cumprindo pena. Ou seja, a suposição de que o crime é ilusão é construída e ganha sentido no ambiente da prisão. A prisão, neste caso, exerce um efeito dissuasório sobre quem já se encontra preso, pois no ambiente carcerário se repetem os relatos que dizem e confirmam que o crime não compensa. Não podemos afirmar, no entanto, que a prisão tenha efeito dissuasório sobre quem não está preso, sobre os criminosos que estão nas ruas. Nesses casos, as suposições podem ser outras. São várias as técnicas de neutralização da percepção do risco (Tunnel, 1992). Uma delas é a crença, reportada com frequência, de que basta um grande acerto para que seja possível abandonar a alternativa do crime. As ações podem se repetir indefinidamente, mas cada uma delas pode ser vista como a última, “a boa”. Da mesma forma como as suposições e crenças dos presos são construídas coletivamente, as suposições e crenças dos que estão nas ruas também o são. O contexto dá sentido aos relatos, em contextos diferentes os relatos serão diferentes. No caso da nossa pesquisa, o contexto é o processo de acusação e incriminação no qual os entrevistados estavam incursos.

Contra a suposição das teorias (WILSON, 1983; WILSON e HERRNSTEIN, 1985) que consideram que os custos do crime – em especial a aplicação rápida e certa de penas privativas de liberdade – têm efeito dissuasório, a percepção dos riscos, ao invés dissuadir o indivíduo das alternativas criminosas ou de levar a uma maior precaução na prática do crime, pode provocar, como é possível notar em alguns relatos, um raciocínio curioso relacionado ao fatalismo mencionado anteriormente. Alguns entrevistados disseram que os riscos existem tanto para os pequenos crimes, quanto para os grandes. Considerando que a opção pelo crime é entendida como dada e não discutível, seria preferível praticar os crimes maiores, pois se os riscos são os mesmos, os benefícios, podem ser mais significativos. Como disse Diney,  

se eu me envolver de novo agora vou mexer com cascavel mesmo. Vou ficar roubando coletivo? A mesma condição que ele tem de pegar um táxi, um coletivo, pega um banco. Se for condenado, é a mesma cadeia, é a mesma adrenalina.   

Nesse aspecto, a fala de Alisson é interessante. Seu entendimento é de que o crime de roubo é preferido por ter uma pena “pequena”. Como os ladrões são, de acordo com o entrevistado, em sua maioria, viciados, buscam uma alternativa mais fácil.  Na visão do entrevistado, o crime é um tipo de trabalho:  

Tenho que trabalhar como qualquer um. Tem uns que trabalha no 12, igual outros que trabalha no 157, a cadeia do 157 é pequena, aí você vê que a maioria que você entrevista é 157. A maioria é 157. A maioria dos 157 é usuário de cocaína, de crack. 

Diney afirma que a maioria dos presos na cadeia é “157”, ou seja, a maioria é composta por ladrões. Supõe que seja assim porque “a cadeia do 157 é pequena” e, por esse motivo, muito seriam atraídos para essa atividade. Ao mesmo tempo afirma que “a maioria dos 157 é viciado em cocaína e crack”, dando a entender que são pessoas que buscam alternativas mais fáceis e que não são disciplinados. Isto fica claro se compararmos a sua percepção sobre o comportamento dos ladrões com a sua afirmação de que não gasta o que ganha com drogas, bebidas e mulher porque isso seria “ganhar na foice e perder no machado”. Ou seja, ganhar com dificuldade e perder por indisciplina.

É interessante observar que a percepção apresentada pelo entrevistado de que a “cadeia do 157” é pequena está ligada ao fato de que muitos presos, como já foi mencionado, costumam calcular a pena já tomando como certo o benefício que poderia ou não ser conseguido no futuro, dependendo de uma série de fatores relacionados ao seu cumprimento. Dessa forma, a pena já é contada como se fosse de 1/3 do total. No caso do tráfico, por causa da Lei dos Crimes Hediondos, o benefício é muito mais difícil de ser conseguido.

Antes de ser preso por tráfico, Alisson foi detido algumas vezes por porte ilegal de arma. Numa certa ocasião, ficou preso. Tinha  

um oitão e uma quadrada raspada. Se você for pego com um calibre pequeno, na cadeia mesmo lá, você entrando, a corrupção é grande por parte deles mesmo, aí você pagava um dinheiro e saía, só que porém a arma era raspada, e tava num dia que tava com um delegado que não era de conversa, aí eu tomei três anos de sursi.  

Há dois aspectos interessantes a destacar nessa fala. Um deles é que a percepção que parece ter o entrevistado de que a prisão é algo que pode vir a ocorrer de forma mais ou menos fortuita. O entrevistado já havia sido detido várias vezes e tinha saído. Fato que corrobora a ideia apresentada anteriormente de que a prisão não significa uma experiência drástica de ruptura na vida de muitos criminosos, pois se aproximam dessa possibilidade gradativamente. Primeiro acompanham a experiência de vizinhos, conhecidos, colegas. Passam também por apreensões ainda quando menores de idade. Quando acontece, a prisão já é uma situação quase que aguardada. No caso do Alisson, aconteceu que o delegado que estava em serviço na ocasião em que permaneceu preso “não era de conversa”. A percepção desse e de outros entrevistados é a de que esse tipo de acontecimento faz parte da atividade criminosa, pode ocorrer a qualquer momento. Naquela ocasião o entrevistado perdeu.

O segundo aspecto importante diz respeito a uma avaliação moral realizada pelo entrevistado quando afirma que aquele delegado “não era de conversa”. A própria expressão “não ser de conversa” envolve a noção de que o delegado não transige com a lei. Não faz parte de uma maioria que praticaria a corrupção.

Sandoval, estelionatário típico, conta que começou a sua “caminhada tortuosa no crime” quando recebeu – por causa de sua habilidade para imitar letras – a proposta de um amigo para falsificar um cheque. Com essa falsificação, descobriu que poderia ganhar dinheiro sem ter um emprego regular.  

O amigo tinha sido mandado embora do emprego e tinha um cheque do acerto. Estava se sentindo injustiçado e queria se vingar da proprietária. Teve a ideia de alterar o cheque para sacar um valor maior. 

Conheceu um senhor que teria sido, nas palavras do entrevistado,  

um dos maiores estelionatários que Minas Gerais já teve. Comecei a ficar totalmente ligado com esse tipo de coisa. Porque era muito gostoso de trabalhar. Era muito bom entrar na loja, ser muito bem atendido e pagar com cartão de crédito clonado. Sentia prazer.  

Sandoval conta que fazia compras que chegavam a 15 mil reais. Ficava com parte dos produtos e vendia alguns para conseguir dinheiro. A atividade dava prazer ao entrevistado, mas exigia alguma dedicação. Como ele disse, “é preciso ter uma rede de contatos para distribuir as mercadorias.” Aparentemente, começou a construir essa rede quando conheceu o já mencionado estelionatário mais velho, já “aposentado”.

 De acordo com Sandoval, os parceiros o viam como alguém “muito peitudo”, que encarava tudo e chegava às lojas “como se fosse uma pessoa muito importante”. Comprava muito, com toda a tranquilidade. O entrevistado contou que tinha essa condição porque se preparava bem para a prática do crime: “Fazia uma retaguarda legal. Deixava um telefone preparado pra contato, essas coisas da sistemática do negócio”.

Perguntado se pensava sobre o risco de ser preso, Sandoval se expressa de uma maneira que confirma a ideia, sugerida anteriormente, de que a excitação funciona como um neutralizador da percepção do risco:  

Eu guardava uma parte da minha consciência bem pequena para esse lado. Pra essa preservação. Pra ter esse medo. Porque é tão adrenalizante, subia tanto cê entrar numa loja e três quatro ali por conta de te atender e você sabendo que era golpe, com consciência do que tava fazendo. É como se fosse um teatro, entendeu? Me sentia como se fosse um ator.

 

7 RACIONALIDADE E VIDA COTIDIANA 

Podemos concluir que boa parte de nossos entrevistados percebem a existência de riscos na atividade criminosa e, de uma forma ou de outra, lidam com isso em suas falas. A perspectiva fatalista desenvolvida por alguns não deixa de ser o resultado de uma combinação da percepção dos riscos e perigos próprios da ação criminosa com o pressuposto, do qual a maioria parte, de que a opção pela alternativa do crime é algo que não está em questão.

Ao mesmo tempo, não seria de modo algum apropriado afirmar que os entrevistados têm uma visão estratégica de sua atividade, que avaliam cuidadosamente os custos da conduta criminosa e que desistem quando são muito altos. Uma visão estratégica seria, na verdade, impossível. Por maiores que sejam as informações conhecidas por uma pessoa ou grupo sobre um ambiente relacionado a uma ação qualquer – e em especial a criminosa –, nunca serão suficientes para o controle total da situação. Podemos dizer que a percepção de que a coleta de informações deve ser interrompida em um dado momento é bastante razoável. Afinal, de outra maneira, a ação não aconteceria.

A sensação do perigo é muitas vezes suplantada pela esperança de um lucro relevante que vai dar um fim à vida de crimes. Não foram poucos os entrevistados que se referiram ao pensamento de que, na ocasião em que foram presos, estariam praticando o último crime que permitiria a abertura de um negócio próprio. Um dos entrevistados referiu-se, inclusive, a uma meta. Pretendia, com a venda de drogas, acumular 50 mil reais para viver “de renda”, sem precisar trabalhar ou continuar a praticar crimes. Esses, juntamente com a bebida, as drogas e as conversas preparatórias, são alguns dos subterfúgios usados para neutralizar o medo e a percepção dos riscos (WRIGHT & DECKER, 1994, 1997; TUNNEL, 1992).

Quando utilizam esses recursos, os entrevistados estão agindo como todos os membros da sociedade, criminosos ou não. Como mostra Garfinkel (1967: p. 272), a partir das ideias de Alfred Schutz, a “atitude da vida cotidiana” é fundamentalmente diferente da “atitude da teorização científica”. No primeiro caso, em seu dia-a-dia, o “teórico prático”, ou membro leigo da sociedade, ao realizar um ordenamento dos eventos com os quais se relaciona tem como objetivo reter e aprovar a suposição de que os objetos do mundo são o que parecem ser. Aquele que lida com questões cotidianas, busca “suspender a dúvida” e, até mesmo, suspender a regra interpretativa que diz que alguém pode suspeitar de que os objetos do mundo não sejam como parecem ser. No segundo caso, da “atitude científica”, o procedimento interpretativo é exatamente o oposto. O objetivo é “suspender a crença” que diz que os objetos do mundo são como parecem ser. A “dúvida” torna-se um ideal, em princípio ilimitado. Os nossos entrevistados estão, obviamente, entre os “membros leigos” da sociedade. Mesmo quando provocados pelo entrevistador não se interessam pelas perguntas ao modo da “atitude científica”. Procuram, sim, se livrar das questões, especialmente das mais embaraçosas. Dessa maneira, sustentar uma percepção convencionalmente aceita como normal da realidade é muito mais importante do que encarar a dúvida e examinar as situações em busca de respostas.

Quando tratamos neste artigo das elaborações dos entrevistados sobre os custos e benefícios do crime, procuramos não produzir uma análise dos relatos e das ações de que tratam a partir da noção de “escolha racional ótima”. Seria o mesmo que impor à realidade um modelo de ação racional que diz respeito apenas à “atitude científica” e não à “atitude da vida cotidiana”. O resultado, de acordo com Garfinkel (1967: p. 280), seria o desenvolvimento de uma comparação irônica que estabelece as “distinções familiares entre condutas racionais, não-racionais, irracionais e a-racionais”.

Deixando de lado o uso do conceito de racionalidade como um critério interpretativo básico, nos vemos livres, de saída, das comparações entre condutas racionais, irracionais, não-racionais e a-racionais. Mas o maior ganho seria a ampliação das possibilidades de análise, de tal forma que poderíamos buscar uma compreensão mais profunda do que as pessoas fazem e do que elas querem em suas condutas diárias. O que elas fazem é produzir e reproduzir continuamente o contexto social sobre o qual e a partir do qual agem. O que elas querem é que este contexto seja razoavelmente estável e igual a si mesmo ao longo do tempo, no sentido daquilo que Giddens (1989) chama de “segurança ontológica”. A racionalidade, como faculdade cognitiva própria dos seres humanos, está evidentemente presente no processo de produção e reprodução de contextos sociais e mais ainda na elaboração de relatos sobre esse contexto, que têm com objetivo exatamente a sua estabilização. Mas deve ser vista como um dado e tratada como material empírico a ser analisado e não como um princípio metodológico de interpretação da ação (cf. GARFINKEL, 1967: 282).

 

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Os entrevistados elaboraram em seus relatos as noções de racionalidade, de planejamento, de riscos e benefícios da atividade criminosa. No entanto, em momento algum, fizeram uma análise de sua própria ação tomando a ideia de “escolha racional ótima” como um pressuposto interpretativo. O fato é que essa possibilidade não estava presente nas situações em que agiram. Não haveria motivo prático, portanto, para a sua utilização. Em seus relatos, partem do pressuposto de que a decisão pela ação criminosa já está tomada e, a partir dessa decisão, consideram questões como riscos e benefícios do crime. Os riscos podem ser diminuídos, algumas precauções podem ser tomadas, algum planejamento pode ser feito, mas apenas na medida do possível. Não avançaríamos muito na compreensão dos relatos e das ações dos nossos entrevistados concluindo que não têm autocontrole (cf. GOTTFREDSON e HIRSCHI, 1990) ou que não calculam adequadamente os custos e benefícios do crime e do não-crime (cf. WILSON e HERRNSTEIN, 1985). Os entrevistados sabem dos riscos que correm, mas entendem que são, a partir de certo ponto, inevitáveis dado que optaram pela (ou acabaram por se encontrar na) prática do crime. Algumas análises que tomam a racionalidade como um princípio metodológico de interpretação da ação se equivocam quando supõem a existência de uma separação nítida entre o “antes” e o “depois” da opção pelo crime. Na verdade, não é apropriado falar em um “antes” e um “depois” na medida em que as considerações sobre riscos e benefícios e a opção pela alternativa do crime são contemporâneas. Dessa forma, as considerações sobre riscos e benefícios e, especialmente, sobre a inevitabilidade dos riscos, fazem sentido quando entendidas como considerações que partem da premissa de que a opção pela alternativa criminosa já foi feita. calculam adequadamente os custos e benef riscos e benefnclusive ser antecipadas pelo exame dde presente ou na146146146146146146146146146146146146146146146146146146

 

REFERÊNCIAS 

CLARKE, R. V e FELSON, M. “Introduction: criminology, routine activity, and  rational choice”. In: Clarke, R. V e Felson, M. Routine activity, and  rational choice. New Brunswick: Transaction, 2004.

CROMWELL, P. (ed.) In their own words: criminals on crime. Los Angeles: Roxbury, 1999.

DURKHEIM, E. Sociologia e Filosofia. São Paulo: Ícone, 1994.

GARFINKEL, Harold. Studies in Ethnomethodology. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1967.

GIDDENS, Anthony. A constituição da sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

GOTTFREDSON, M. R. e HIRSCHI, T. A general theory of crime. Stanford: Stanford University Press, 1990.

HERITAGE, John. Garfinkel and ethnomethodology. Cambrige: Polity Press, 1984.

LETKEMANN, P. Crime as work. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1973.

MILLER, W. “The lower class culture as a generating milieu of gang delinquency”. In: Wolfgang, M. e Ferracuti, F. (orgs) The sociology of crime and delinquency. New York, John Wiley Sons, inc., 1970. (351-63)

TUNNEL, K. D. Choosing crime: the criminal calculus of property offenders. Chicago: Nelson Hall, 1992.

WILSON, J. Q. Thinking about crime. New York: Vintage Books, 1985.

WILSON, J. Q. e HERRNSTEIN, R. Crime and human nature: the definitive study of the causes of crime. New York: Simon and Schuster, inc., 1985.

WRIGHT, R. T. & DECKER, S. H. Burglars on  the job. Boston: Northeastern University Press, 1994.

 

WRIGHT, R. T. e DECKER, S. H. Armed robbers in action. Boston: Northeastern University Press, 1997.

 


NOTAS DE FIM 

[1]Este artigo é uma versão ligeiramente modificada de um capítulo da tese de doutorado “O Crime segundo o criminoso: um estudo de relatos sobre a experiência da sujeição criminal“, defendida no ano de 2006 no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para informações completas sobre a pesquisa, consultar a tese que está disponível em: http://teses.ufrj.br/IFCS_D/CarlosAugustoTeixeiraMagalhaes.pdf. 

[2] Professor do Centro Universitário Newton. Doutor em Sociologia pelo IFCS/UFRJ. 

[3]As entrevistas foram feitas a partir de um roteiro, mas frequentemente seguiam por caminhos não planejados. Foram gravadas e posteriormente transcritas. Procuramos reproduzir o modo de falar dos entrevistados de modo a possibilitar o reconhecimento de sua condição social.