Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva

Tarso Duarte de Tassis[1]
Leonardo Dias Saraiva
[2]

 

RESUMO: O presente estudo tece algumas considerações acerca do pleno exercício de direitos políticos pelos cidadãos, seus conceitos, bem como a possibilidade de perda ou suspensão desses direitos – efetuando uma diferenciação entre perda e suspensão de direitos políticos –. Elencou-se cada uma das hipóteses constitucionais, bem como buscou-se algumas questões específicas com relação à cada uma delas. Mais especificamente, pretendeu-se abordar, no que tange à cada uma das previsões constitucionais de perda e suspensão de direitos políticos, as questões controvertidas no âmbito do Poder Judiciário, as divergências doutrinárias sobre o tema, os efeitos , a incidência, além de suas implicações relativas ao direito de ser votado (ius honorum)

 

PALAVRAS CHAVE: Condição de Elegibilidade. Direitos Políticos. Perda. Suspensão

 

Área de Interesse: Direito Constitucional; Direito Eleitoral.

 

1 INTRODUÇÃO

Condições de elegibilidade são os requisitos constitucionais ou legais que qualquer pessoa deve satisfazer para obter o registro de candidatura. Desta feita, com muita propriedade, PEDRO HENRIQUE TÁVORA NIESS[3] destacou a impropriedade terminológica do art. 14, §3° da CF/88 (São condições de elegibilidade, na forma da lei), do termo condições de “elegibilidade”, previsto também no art. 3° do Código Eleitoral.

Ora, se definimos condições de elegibilidade como satisfação de requisitos para ter direito ao registro de candidatura, o termo correto conforme apontado pelo eminente jurista seria efetivamente condições de “registrabilidade”. O candidato tem direito ao registro e não de ser eleito, haja vista que para ser “eleito” o candidato depende da manifestação democrática do voto favorável. O registro garante apenas o direito de ser votado (ius honorum).         

Desconsiderando o tecnicismo gramatical, JOSÉ JAIRO GOMES[4] define elegibilidade como “aptidão de ser eleito ou elegido”.

Alguns autores fazem distinção qualitativa das condições de elegibilidade. ADRIANO SOARES DA COSTA[5] as divide em próprias (previstas no §3° do art. 14 da CF/88) e impróprias (previstas em outras normas constitucionais ou infraconstitucionais). MARCOS RAMAYANA[6] utiliza a mesma terminologia acima, porém faz distinção em relação à sua classificação, chamando de próprias todas as condições constitucionais e impróprias as condições infra-constitucionais de elegibilidade.

O que nos interessa é saber diferenciar e destacar as condições de elegibilidade bem como as inelegibilidades que sejam constitucionais das que sejam infra-constitucionais, independente de sua nomenclatura ou divisão terminológica. A importância do tema é consagrada com o disposto no art. 259 do Código Eleitoral, que assim dispõe: “São preclusivos os prazos para interposição de recurso, salvo quando neste se discutir matéria constitucional. Parágrafo único. O recurso em que se discutir matéria constitucional não poderá ser interposto fora do prazo. Perdido o prazo numa fase própria, só em outra que se apresentar poderá ser interposto”.

Isto porque existem no ordenamento legal pátrio somente dois instrumentos jurídicos processuais eleitorais capazes de conhecer de matérias referentes às inelegibilidades e incompatibilidades no período eleitoral, a saber: Ação de impugnação ao Registro de Candidatura – AIRC (art. 3º e segs. da LC 64/90) e Recurso Contra Expedição de Diploma – RCED (art. 262 e segs. do Código Eleitoral).

Portanto, o que se conclui é que o momento oportuno para se argüir ausência de condições de elegibilidade e inelegibilidade ambas de natureza eminentemente infraconstitucional é em sede própria no processo de registro (o que inclui sua eventual impugnação através de AIRC). Uma vez transitado em julgado o deferimento do registro, a matéria infraconstitucional não alegada resta preclusa e não poderá ser argüida em outro momento (a exceção é para caso de fato superveniente ao registro e anterior às eleições ou à diplomação).

 

2 CONDIÇÕES CONSTITUCIONAIS DE ELEGIBILIDADE

As condições constitucionais de elegibilidade estão previstas no art. 14 da CF/88 (A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante (…)). Inicia-se com o disposto em seu §3° (§ 3º. São condições de elegibilidade, na forma da lei).

O que se extrai inicialmente do disposto no §3° é o seguinte termo: “na forma da lei”. JOEL JOSÉ CÂNDIDO[7] afirma que a Constituição Federal depois de enumerar as condições de elegibilidade remete-as à lei, que no caso deve-se entender como ordinária e não necessariamente Lei Complementar. Este também é o posicionamento do STF (ADI-MC n° 1.063/DF[8]), afastando a necessidade de edição de Lei Complementar, conforme hipótese prevista no §9° do art. 14, que fica reservada para edição legislativa referente à inelegibilidade, não se aplicando à condições de elegibilidade.

Assim, é importante destacar que a legislação infraconstitucional pode ao mesmo tempo regular uma condição constitucional de elegibilidade (ex. prazo de filiação mínima e de domicilio eleitoral) ou até mesmo criar a referida condição.

JOSÉ CRETELLA JÚNIOR[9], ao comentar o referido dispositivo constitucional, apresenta interessante crítica no que se refere à repetição de condições de elegibilidade, como condições de alistamento eleitoral, afirmando que à exceção dos incisos V e VI da CF/88, os demais requisitos são os mesmos para que a pessoa aliste-se como eleitor. Data vênia, entendemos que a repetição constitucional de tais condições, mesmo que idênticas àquelas referentes ao alistamento eleitoral, permite-se a averiguação no processo de registro de tais requisitos. Se assim não fosse, todas as questões estariam preclusas quando do processo de inscrição e transferência no corpo de eleitores, impedidas de serem debatidas autonomamente no momento de pedido de registro de candidatura.

 

3 PLENO EXERCÍCIO DOS DIREITOS POLÍTICOS (ART. 14, § 3º, II da CF/88)

Inicialmente cumpre destacar que somente a própria Constituição Federal poderá criar as hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos. Atualmente tais situações estão limitadas aos incisos I a V do art. 15 da CF/88.

Por interpretação sistêmica da CF/88, devemos considerar ainda pelo menos outras quatro hipóteses não referidas expressamente no art. 15 da própria Constituição como causas de perda ou suspensão dos direitos políticos, a saber: renúncia voluntária da nacionalidade brasileira; opção de exercício dos direitos políticos em Portugal, com base no Estatuto de Igualdade; o período de conscrição previsto no art. 14, §2° da CF/88 bem como a aplicação da medida de segurança. A duas primeiras exceções serão tratadas quando da análise individual do inciso I do art. 15 da CF/88 feita abaixo.

No que se refere ao período de conscrição como causa de suspensão temporária dos direitos políticos, apesar de não ser situação tratada nos incisos do art. 15 da CF/88, é de ser reconhecida como causa de suspensão dos direitos políticos, haja vista que art. 14, §2° da CF/88 veda aos conscritos no período do serviço militar obrigatório o direito ao alistamento eleitoral, ou seja, o direito de inscrever-se no corpo de eleitores, sendo que tal vedação o resulta nas mesmas conseqüências da suspensão dos direitos políticos.

A legislação brasileira já cuidou de conceituar o que seriam direitos políticos[10], definindo-os como, precipuamente, o direito de votar e ser votado (Lei 818/49, art. 38 – São direitos políticos aqueles que a Constituição e as Leis atribuem a brasileiros, precipuamente o de votar e ser votado). Este porém não é o melhor conceito. Em uma análise restritiva da norma acima poderia-se chamar de direitos políticos apenas como o direito de votar (ius sufraggi) decorrente do direito de alistar-se no corpo de eleitores, haja vista que tal condição (art. 14, §3° da CF/88 e art. 3° do CE) é requisito ao direito de ser votado (ius honorum).

PONTES DE MIRANDA[11] define direitos políticos como direito de participar da organização e funcionamento do Estado. Tal conceito explica o fato de que além de ser uma condição de elegibilidade, o pleno exercício dos direitos políticos é também uma condição para o exercício do mandato eletivo[12].

Mas deve-se distinguir ambas situações, no que interessa ao estudo do direito eleitoral. Na primeira, aquele que em período eleitoral esteja com os direitos políticos suspensos ou os tenha perdido, não satisfaz condição de elegibilidade e, portanto, não pode participar do pleito.

Já quem teve os direitos políticos suspensos ou cassados no curso do mandato eletivo, fora do período eleitoral, perde o cargo para o qual foi eleito, sendo que tal matéria foge da seara do direito eleitoral, sendo da seara eminentemente do direito constitucional, administrativo e até penal.

A definição de PONTES DE MIRANDA, deveria ser complementada como “direito de participar da organização, funcionamento e vida política do Estado” uma vez que a participação em atividades políticos partidárias inclusive comícios e atos de propaganda demandam o gozo dos direitos políticos, sob pena de tipificação do crime eleitoral do art. 337[13] do CE.

JOSÉ CRETELLA JÚNIOR[14] critica o termo “pleno” da redação constitucional. Afirma que “Ou a pessoa tem direitos políticos, ou não os tem”.

A presente condição de elegibilidade deve também ser interpretada com o disposto no inciso III e V do art. 14, § 3º da CF/88, pois tanto o alistamento eleitoral  (vide art. 71, II do Código Eleitoral) quanto a filiação partidária (vide art. 22, II da Lei 9.096/95) também exigem o pleno exercício dos direitos políticos para o seu exercício.

Fora da seara eleitoral, o pleno gozo dos direitos políticos também é requisito para: legitimação ativa em ação popular (art. 5° LXXIII da CF/88); subscrever projeto de lei de iniciativa popular (art. 61, §2° da CF/88); investidura em cargo público mesmo que não eletivo (art. 5°, II da Lei 8.112/90 e art. 87, 89, VII, 101, 131, §1° da CF/88); exercer cargo administrativo ou de representação econômica ou profissional em entidade sindical (art. 530, V da CLT); ocupar cargo de diretor ou redator chefe de jornal ou periódico (art. 7°, §1° da Lei 5.250/67) e também para exercer a função de jurado do Tribunal do Júri (art. 434 do CPP).

Assim, quando se fala em suspensão ou perda dos direitos políticos, deve-se analisar isoladamente todos os incisos do art. 15 da CF/88, a saber:

 

3.1 Cancelamento da Naturalização dor Sentença Transitada em Julgado

Primeiro cumpre destacar que a presente hipótese é a única (dentre as que literalmente estão previstas no art. 15 da CF/88) que acarreta a perda dos direitos políticos. Os demais incisos do art. 15 da CF/88 são todos causas de suspensão e não perda dos direitos políticos. A única hipótese controversa acerca de se tratar de perda ou suspensão é a do inciso IV do art. 15 da CF/88. ALEXANDRE DE MORAES[15], em sua obra (Direito Constitucional, 10ª ed. p. 251) trata da escusa de consciência como causa de perda dos direitos políticos. Não comungamos de tal opinião, haja vista que uma vez cumprida a prestação alternativa voltará o interessado a gozar de seus direitos políticos que estavam suspensos. É inclusive a disposição expressa da legislação infraconstitucional sobre a matéria, prevista no art. 4°, §2°[16] da Lei 8.239/91.

O inciso acima deve ser analisado em conjunto com o art. 12, §4° da CF/88, bem como a legislação ordinária da Lei 818 de 1949. Inicialmente cumpre destacar que a referida lei ordinária encontra-se parcialmente revogada pelo Estatuto do Estrangeiro e foi parcialmente não recepcionada pela CF/88, devendo ser analisada com cautela.

Quando se fala em cancelamento da naturalização, está se contemplando apenas a hipótese do inciso I do §4° do art. 12 da CF/88, que se refere à chamada de perda-punição da nacionalidade (MORAES: 2002, 527), que é direcionada exclusivamente ao brasileiro naturalizado. Neste caso, somente a Justiça Federal (art. 109, X[17] da CF/88) é que poderá cancelar a naturalização decretando a perda dos direitos políticos, retornando o indivíduo à condição de estrangeiro. Os efeitos de tal decisão são ex nunc, contados somente a partir do trânsito em julgado.

ALEXANDRE DE MORAES[18] afirma que uma vez perdida a nacionalidade o estrangeiro que se tornou indigno ao estado brasileiro, por praticar atividade nociva ao interesse nacional, somente poderá readquirir a nacionalidade brasileira através de ação rescisória. ADRIANO SOARES DA COSTA[19] reafirma a referida impossibilidade, mas não de forma tão taxativa, afirmando que na hipótese de êxito em uma nova naturalização, o estrangeiro desnaturalizado não irá retroagir os efeitos da anterior condição de nacional, iniciando-se a partir da nova naturalização a aquisição dos direitos políticos.

Ocorre que o art. 15, I da CF/88, em sua redação não contempla literalmente a hipótese do inciso II do §4° do art. 12 também da CF/88, que se refere à perda da nacionalidade em razão de ato voluntário de brasileiro, também chamada de perda-mudança da nacionalidade. Sabemos que o art. 15 da CF/88 é taxativo e suas hipóteses são numerus clausus, mas é óbvio concluir que mesmo não estando inserida nas hipóteses de tal dispositivo constitucional, a perda da nacionalidade brasileira decorrente da aquisição de outra nacionalidade fora das exceções constitucionais é hipótese de perda dos direitos políticos pois é incompatível que um estrangeiro ostente tais prerrogativas.

Lado outro, o brasileiro que tenha optado, nos termos do art. 12 do Estatuto Especial de Igualdade (que no Brasil é identificado pelo Decreto n° 70.436/72), em exercer seus direitos políticos em Portugal, tratar-se-á de hipótese de suspensão dos direitos políticos, e não de perda. Desta feita será outra hipótese que atinge diretamente os direitos políticos mesmo que não explicitamente disposta nas situações numerus clausus do art. 15 da CF/88.

A decretação da perda da nacionalidade prevista no inciso II do §4° do art. 12 da CF/88 independe de ato jurisdicional, uma vez que a lei 818/49, em seu art. 23[20] reclama apenas a existência de um processo administrativo com oitiva do interessado, determinada em Decreto a ser expedido pelo Presidente da República.

        

3.2 Incapacidade Civil Absoluta

A capacidade civil regulada pelo Código Civil Brasileiro não deve ser confundida com capacidade de direitos, uma vez que esta surge com o nascimento e é decorrente da personalidade jurídica. PABLO STOLZE GAGLIANO e RODOLFO PAMPLONA FILHO afirmam que “todo ser humano tem, assim, capacidade de direito, pelo fato de que a personalidade jurídica é atributo inerente a sua condição”[21].

Assim, pode-se definir como incapacidade civil absoluta como uma situação de fato que impossibilite a pessoa de manifestar sua real e jurídica vontade. Tais hipóteses foram reguladas pelo CC de 1916 em seu art. 5°[22]. O CC de 2002 em seu art. 3° é a regulamentação legislativa atual da matéria:

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I – os menores de dezesseis anos;

II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

O inciso I (os menores de dezesseis anos) do art. 3° do CC de 2002 estabelece uma situação jurídica de fato na qual a pessoa não está habilitada a exprimir sua vontade validamente. A idade de 16 anos foi o limite etário determinando pelo legislador para a validade jurídica, mesmo que relativa, dos atos praticados pela pessoa.

É interessantíssimo destacar que o menor de 16 anos pode ser portador de título de eleitor, mas nem por isso estará no gozo dos direitos políticos. Isto ocorre devido ao fato que a verificação da idade para exercício da capacidade eleitoral ativa facultativa de 16 anos é feita até a data das eleições. Ocorre que a Justiça Eleitoral somente recebe o pedido de inscrição eleitoral até 150 dias antes do pleito (art. 91 da Lei 9.504/97). Então, o eleitor que completar 16 anos durante este 150 dias antes do pleito, tem o direito de obter um título eleitoral, sob a condição suspensiva do implemento etário. Tal situação encontra-se regulada pelo TSE através do art. 14[23], §§1° e 2° da Resolução 21.538 de 14 de Setembro de 2006.

Os incisos II (os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos) e III (os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade) do referido dispositivo consagram um estado permanente ou temporário de incapacidade para exprimir vontade. Se a pessoa é incapaz dos atos da vida civil, é imprescindível que os atos referentes ao exercício da cidadania sejam-lhe também vedados, em especial aqueles ligados à capacidade eleitoral ativa (ius sufragii) e capacidade eleitoral passiva (ius honorum).

A verificação de incapacidade civil absoluta, no que se refere à suspensão[24] dos direitos políticos, pode se dar a qualquer tempo, seja durante o pedido de registro ou após a expedição do diploma e até mesmo no curso de mandato eletivo, desde que observados os princípios da ampla defesa e do contraditório (art. 5°, LV da CF/88).

Questão interessante é saber qual o marco inicial da suspensão dos direitos políticos decorrentes da incapacidade civil absoluta. Se é da data da causa incapacitante ou da sentença que interditar o interesssado?

Por se tratar efeito automático da incapacidade civil absoluta, a mesma somente poderá ser observada após o regular processo de interdição (STF, RE n° 92.776 e 92.040), passando a vigorar com a interdição e independente do trânsito em julgado, nos termos do art. 1184 do CPC. A necessidade do processo de interdição já foi reconhecida inclusive pelo TSE[25].

 

3.3 Condenação Criminal Transitada em Julgado, Enquanto Durarem seus Efeitos

Entende-se por condenação criminal transitada em julgado a presença de uma sentença penal procedente, que não poder ser alterada seja porque se esgotaram as vias recursais, seja porque restaram preclusos os prazos para interposição de recurso visando sua reforma. TOURINHO FILHO[26] faz uma distinção entre coisa julgada e coisa soberanamente julgada. Afirma que no caso da sentença penal condenatória, enquanto existir a viabilidade da revisão criminal, a mesma não pode ser considerada como coisa “soberanamente” julgada.

JOEL JOSÉ CÂNDIDO[27] ao analisar o inciso III do art. 15 da CF/88 afirma que o termo “condenação criminal” foi utilizado como gênero, incluindo qualquer infração penal. Assim, o objeto da referida decisão judicial penal pode ser referente a contravenção (TSE, Ac. 13.293[28]); delitos culposos (TSE, Ac. 13.027[29]) inclusive pena de multa.

A aplicação do efeito automático[30] de suspensão dos direitos políticos decorrente da condenação criminal deve ser analisado diante do preceito constitucional sobre o lapso temporal dos efeitos da condenação.

Portanto, no caso da sentença penal transitada em julgado haver condenado o réu unicamente â pena de multa, os direitos políticos estarão suspensos enquanto a multa não for integralmente quitada, nos termos do art. 164 e segs da Lei de Execução Penal, momento em que cessam seus efeitos.

No caso de pena privativa de liberdade ou penas alternativas, os direitos políticos do réu estarão suspensos enquanto estiverem no cumprimento da pena. Não se consideram para fins de suspensão dos direitos políticos os efeitos secundários da condenação, previstos no art. 91 e 92 do CP. Destaca-se o enunciado da súmula 09 do TSE: “A suspensão dos direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos”. Ainda neste sentido (TSE, Ac. 12.931).

No que se refere ao condenado beneficiado pelo instituto do sursis, suspendendo a pena de forma condicional (art. 77 do CP), é de se impor a suspensão dos direitos políticos. Isto porque na suspensão condicional da pena estão presentes os dois requisitos previstos no referido inciso constitucional, quais sejam: condenação criminal transitada em julgado e efeitos da referida condenação. Esta estará apenas suspensa em sua execução de privação de liberdade determinada pela condenação, de forma temporária e somente restabelecerá o condenado no gozo de deus direitos políticos na hipótese do art. art. 82 do CP.

Sobre o tema, destaca-se a lição de TORQUATO JARDIM[31]: “Exige (o art. 15, III da CF/88) que, remetendo-se à legislação penal, a condenação continue produzindo efeitos penais ou extrapenais. Assim, os institutos jurídicos de política criminal, visando à suspensão de aplicação da pena privativa da liberdade (sursis) ou antecipação provisória da liberdade (livramento condicional), não autorizam a cessação dos efeitos da suspensão dos direitos políticos”. No mesmo sentido é a orientação do TSE (Ac. 250 e 16.432)[32].

Conforme Leciona FREDERICO MARQUES[33]“a suspensão de direitos políticos já não se limita, hoje, aos casos em que a condenação era em pena privativa de liberdade”:

“O sursis e o livramento condicional em nada influem na suspensão de direitos políticos, uma vez que os efeitos da condenação continuam existentes. Aliás, já que está devidamente superada a controvérsia que de início surgiu,sendo pacífico, atualmente, que a concessão de qualquer daqueles benefícios em nada afeta a pena acessória que a Constituição prevê”.

Lado outro é quando se trata da suspensão condicional do processo prevista no art. 89[34] e a transação penal prevista no art. 76, ambos dispositivos da Lei 9.099/95. Nestes casos, por não estar presente o requisito da sentença penal condenatória, não há que se falar em suspensão dos direitos políticos.

Deve-se destacar a particularidade deste dispositivo constitucional (art. 15, III) com o disposto no art. 55, VI c/c §2° da CF/88, que assim dispõe:

 Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador: (…)

VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado. (…)

§ 2º. Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

Inicialmente cumpre esclarecer que tal exceção é limitada aos deputados[35] e senadores, não se estendendo aos demais cargos eletivos.

Tal norma, igualmente constitucional, é considerada uma exceção[36] à auto-aplicabilidade do inciso III do art. 15 da CF/88. Entendo de forma parcialmente diversa, no sentido de que não podemos tratar a situação prevista no art. 55, §2° da CF/88 como uma exceção total mas sim parcial à auto aplicabilidade do inciso III do art. 15 da CF/88. Isto porque a prévia autorização da Casa Legislativa para decretação da perda do mandato, apenas irá garantir ao interessado a condição de poder exercer o mandato para o qual foi eleito, mesmo em situação de condenando criminalmente em definitivo.

A perda do cargo eletivo é apenas uma das conseqüências da suspensão dos direitos políticos, mas não a única. Desta forma, trata-se de uma hipótese que excepcionaliza apenas uma das conseqüências da suspensão dos direitos políticos, referente à continuidade no mandato e quiçá a da filiação partidária.

Não obstante, no que se refere à pleitos futuros, no momento do pedido do registro de candidatura, o congressista que esteja no cargo pautado na garantia do §2° do art. 55 da CF/88, não satisfará o requisito constitucional previsto na alínea “b” do §3° do art. 14 da CF/88. Isto porque o mandato protegido pela referida norma constitucional é aquele no qual se verificou o trânsito em julgado da condenação. A decisão legislativa colegiada tem o condão de apenas suspender uma das conseqüências da decisão penal condenatória transitada em julgada mas não todos os efeitos da suspensão dos direitos políticos automaticamente decorrentes da condenação criminal definitiva, garantindo ao congressista o término daquele mandato, mas não poderá ser utilizada como um salvo conduto para nova candidatura.

Tratar-se-á de uma situação única. ALEXANDRE DE MORAES[37] afirma que “A constituição outorga ao Parlamento a possibilidade da emissão de um juízo político da conveniência sobre a perda do mandato”. Ou seja, o que se garante é o exercício ou não do mandato, mas não a suspensão total dos efeitos da condenação criminal transitada em julgado, em especial o pleno gozo dos direitos políticos como condição de elegibilidade para uma nova legislatura.

No que se refere aos direitos políticos negativos, os princípios que instruem a edição legislativa, referentes às inelegibilidades (não confundir com condição de elegibilidade) estão previstos no art. 14, §9° da CF/88 e visam “proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato” situação incompatível com a possibilidade de suspender plenamente os efeitos decorrentes do inciso III do art. 15 da CF/88.

Vale inferir que “da própria decisão condenatória irrecorrível, independentemente de declaração expressa, exsurge a afetação das prerrogativas inerentes à cidadania política — capacidade eleitoral ativa (jus sufragi,) e passiva (jus honorum) -, em face da autoaplicabilidade do mencionado dispositivo constitucional”[38][39].

Do mesmo modo é a decisão que impõe medida de segurança posto que, embora não  ostente natureza condenatória, enseja suspensão de direitos políticos, tendo que tais medidas atribuem sanção de natureza penal[40]. A incidência da suspensão de direitos políticos, nesses casos, vigora, tendo em vista que o fundamento para a suspensão dos direitos políticos é ético, e como tal, deve incidir aos condenados por sanção de natureza penal.

 

3.4  A Recusa de Cumprir Obrigação a todos Imposta ou Prestação Alternativa, nos Termos do Artigo 5º, VIII, CF

Para analisar o presente dispositivo, deve-se trazer à baila o conteúdo do art. 5°, VIII da CF/88 que assim dispõe: “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”. É imprescindível também a leitura do art. 142 §§ 1° e 2° da CF/88.

CELSO RIBEIRO BASTOS[41], ao analisar originalmente o referido dispositivo, limitou a sua aplicabilidade para os deveres do cidadão com o serviço militar obrigatório: “É verdade que o Texto fala em ´eximir-se de obrigação legal a todos imposta´ e não especificamente em ´serviço militar´. É fácil verificar-se, contudo, que a hipótese ampla e genérica do Texto dificilmente se concretizará em outras situações senão aquelas relacionadas com os deveres marciais do cidadão”.

Esta porém não é a melhor leitura do texto constitucional. Podemos entender que o conceito de obrigação a todos imposta já previsto no ordenamento jurídico pátrio, além do serviço militar obrigatório, pode ser aplicada também a outras obrigações, tais como o dever de alistamento eleitoral aos maiores de 18 anos bem como o dever de votar. Deve-se ainda considerar à obrigatoriedade do júri e da convocação para mesário nas eleições[42].

No que se refere ao serviço militar obrigatório, a chamada “escusa de consciência” implica na prestação alternativa que se entende pelo exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, em substituição às atividades de caráter essencialmente militar (art. 3°, §2° da Lei 8.239/91).

Ocorre que a suspensão sine die dos direitos políticos no caso vertente não é automática. O art. 4° da Lei 8.239/91 estabelece que:

Art. 4º. Ao final do período de atividades previsto no § 2º do artigo 3º desta Lei, será conferido Certificado de Prestação Alternativa ao Serviço Militar Obrigatório, com os mesmos efeitos jurídicos do Certificado de Reservista.

§ 1º. A recusa ou o cumprimento incompleto do Serviço Alternativo, sob qualquer pretexto, por motivo de responsabilidade pessoal do convocado, implicará o não-fornecimento do Certificado correspondente, pelo prazo de dois anos após o vencimento do período estabelecido.

§ 2º. Findo o prazo previsto no parágrafo anterior, o Certificado só será emitido após a decretação, pela autoridade competente, da suspensão dos direitos políticos do inadimplente, que poderá, a qualquer tempo, regularizar sua situação mediante cumprimento das obrigações devidas.

Desta feita, a suspensão dos direitos políticos deve ser decretada pela autoridade competente somente dois anos após a recusa ou o cumprimento incompleto da prestação alternativa, podendo a qualquer tempo o inadimplente regularizar sua situação mediante o cumprimento das obrigações devidas, restabelecendo neste momento seus direitos políticos.

No que se refere à convocação para a função de jurado no Tribunal do Júri, sua recusa pautada em motivação religiosa, filosófica ou política, nos termos do art. 435[43] do CPP importa na “perda dos direitos políticos”. O interessante no caso vertente é que a legislação prevê que a recusa desmotivada à convocação para função de jurado não acarreta a perda dos direitos políticos, mas sim a multa prevista no art. 443 do CPP.

TOURINHO FILHO[44] ao analisar o referido art. 435 do CPP entendeu como norma auto-aplicável em razão do art. 15, IV da CF/88. Não comungamos de tal opinião. Não obstante a norma não ser revestida de discricionariedade (afirmando que “importará a perda dos direitos políticos”) entendo que, se recepcionado pela CF/88 for o art. 435 do CPP, a melhor solução dada à espécie foi afirmada por MIRABETE[45], nos seguintes termos: “Como não há prestação alternativa para o caso de jurado, o juiz presidente do Júri deve comunicar a recusa ao presidente do Tribunal de Justiça para que este providencie o encaminhamento ao Ministro da Justiça, a quem cabe declarar a perda dos direitos políticos”.

Em nossa opinião, ambas soluções acima estão equivocadas. Entendemos que o art. 435 do CPP não foi recepcionado CF/88. Por mais que a disposição do art. 15, IV da CF/88 possa ser aplicada na hipótese vertente in tese[46] (ou seja, recusa no ao exercício da função de jurado), a forma prescrita no referido dispositivo do CPP colide com elementos essenciais da CF/88, a saber: quebra do princípio da proporcionalidade e isonomia (no momento em que a recusa desmotivada para a função de jurado gera apenas a pena de multa e as motivadas nos termos do art. 435 geram a suspensão dos direitos políticos); atualmente o art. 15, IV da CF/88 é causa de suspensão e não de perda dos direitos políticos[47], devendo existir uma forma do inadimplente recuperar os referidos direitos mediante a implementação de uma conduta; conflito aparente entre as normas do art. 5°, VIII, pois nesta se exige que a recusa seja tanto na obrigação a todos imposta quanto na prestação alternativa, dando a idéia de que é indispensável a previsão de uma prestação alternativa[48] (inexistente no caso art. 435 do CPP) com o inciso IV do art. 15 que fala que a recusa pode ser ou na obrigação a todos imposta (dando uma idéia isolada do conceito) ou na prestação alternativa.

Mesmo que considerada recepcionada pela CF/88 a referida norma do CPP, entendo que pelo menos a multa prevista no art. 443 do CPP deve ser aplicada e aceita como prestação alternativa no caso da recusa da função de jurado fundada em razões de cunho político, filosófico ou religioso adequando-se a proporcionalidade das sanções. Entendo ainda que se tratará de hipótese de suspensão dos direitos políticos, a ser decretada pela Autoridade Competente até o implemento da referida multa pelo inadimplente.

Nas duas hipóteses tratadas acima ainda reside uma dúvida, no sentido de quem seria a autoridade competente para decretar a suspensão dos direitos políticos. A anterior Constituição Federal (1967) em seu art. 144, §2° declinava como competência do Presidente da República a decretação da presente sanção. A atual Constituição não repetiu a norma, silenciando-se a respeito.

ALEXANDRE DE MORAES[49] aderindo ao entendimento de FÁVILA RIBEIRO interpreta a omissão constitucional como autorizativo para edição legislativa privativa da União na matéria em comento, como forma de se opor a opinião de JOSÉ AFONSO DA SILVA[50] no sentido de que tal competência restaria por eliminação ao Poder Judiciário.

JULIO FABRINI MIRABETE em trecho já citado neste capítulo, afirmou tratar ser tal competência do Ministro da Justiça e comungamos da referida opinião, inclusive após analise do art. 51, §3°[51] da Resolução 21.538 do TSE que faz referência direta a tal competência.

No que se refere à obrigação do alistamento eleitoral aos maiores de 18 anos (art. 14, §1°, I da CF/88), o resultado prático do descumprimento da referida norma se equivale ao mesmo que sanção a suspensão ou perda dos direitos políticos, pois sem o referido alistamento não exercerá a pessoa nem o direito de votar (ius sufraggi) nem o direito de ser votada (ius honorum) não podendo também participar da vida política do país.

Já no caso de descumprimento da obrigação de votar (art. 14, §1°, I da CF/88), a mesma deve ser analisada em relação aos dispositivos dos arts. 7° e 8° do Código Eleitoral.

O fato de não ter votado nas últimas eleições e não ter justificado ou regularizado a situação perante a Justiça Eleitoral impede ao eleitor receber a quitação eleitoral que, conforme dispõe o art. 7°, §1°, I do CE, é vedação ao direito de investir-se e empossar de cargo ou função pública. A norma ganha contornos práticos idênticos ao de suspensão dos direitos políticos na hipótese prevista no §3° do art. 7° do CE: “§ 3º. Realizado o alistamento eleitoral pelo processo eletrônico de dados, será cancelada a inscrição do eleitor que não votar em 3 (três) eleições consecutivas, não pagar a multa ou não se justificar no prazo de 6 (seis) meses, a contar da data da última eleição a que deveria ter comparecido”. Como cancelamento do título, cancela-se o alistamento eleitoral e logicamente impede-se o exercício efetivo dos direitos políticos.

Resumindo, a suspensão dos direitos políticos decorrentes do presente inciso IV do art. 15 da CF/88 não é automático em nenhuma hipótese. A recusa na obrigação a todos imposta ou a prestação alternativa, para autorizar a suspensão dos direitos políticos deve ser regulada por lei infraconstitucional.

 

3.5. Improbidade Administrativa, nos Termos do Artigo 37, § 4º da CF

Por fim, estabelece a Constituição Federal que a suspensão dos direitos políticos se daria em razão de improbidade administrativa, nos termos do art. 37, 4º, segundo o qual “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

Da redação do dispositivo em comento, extrai-se, no que toca à aplicação da sanção, cuidar-se de norma de eficácia limitada, tendo o legislador ordinário, por meio da Lei nº 8.429/92, elencado não apenas as hipóteses de improbidade administrativa, mas suas sanções e gradações, tendo sido adotada a suspensão de direitos políticos, como uma das mais graves penas por ato de improbidade administrativa.

Tendo em vista a necessidade Constitucional e legal de se graduar e fundamentar a aplicação de cada uma das sanções[52], diferentemente do que ocorre na condenação criminal, imperioso que conste da sentença condenatória por ato de improbidade administrativa expressamente a declaração da perda dos direitos políticos e o prazo de fluência da sanção.

Conforme destaca ADRIANO SOARES DA COSTA “a procedência de ação popular ou da ação civil pública contra pré-candidato ou candidato, não enseja a suspensão dos direitos políticos, e como corolário a inelegibilidade[53], se não houver expressa disposição nesse sentido”[54].

Tal circunstância decorre do teor do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, as “penas do art. 12 da Lei 8.429/92 não são aplicadas necessariamente de forma cumulativa, do que decorre a necessidade de se fundamentar o porquê da escolha das penas aplicadas, bem como da sua cumulação, de acordo com fatos e provas abstraídos”.[55]

É pertinente esclarecer que a possibilidade de perda de direitos políticos, decorrente da Lei de Improbidade Administrativa somente se efetiva com o trânsito em julgado da decisão[56], sendo que tal sanção não se confunde com a descrita da Lei Complementar nº 64/90, alterada pela Lei Complementar nº 135/2010 que trata de hipótese de inelegibilidade e não sob a ótica do pleno exercício dos direitos políticos como condição de elegibilidade.

Nesse contexto, o cidadão condenado por improbidade administrativa se torna inelegível pela Lei Complementar nº 64/90, desde a condenação por órgão colegiado[57] – salvo se suspensa a condenação pelo órgão colegiado a qual se direciona o Recurso, nos termos do art. 26-C da LC 64/90 –, pelo prazo de 8 (oito) anos, nos moldes descritos na alínea “i” do inciso I, do art. 1º do citado diploma legal, bem como pelo período compreendido na condenação, desde o trânsito em julgado, momento a partir do qual, estaria também sem o “pleno exercício” dos direitos políticos conforme o já citado art. 20 da Lei 8.429/92.

 

4. CONCLUSÃO

O presente artigo se limita à hipótese do pleno exercício dos direitos políticos apenas sob a ótica da condição de elegibilidade, não se verificando a extensão do tema quanto a outros institutos legais diversos como inelegibilidade. O estudo da perda da capacidade eleitoral passiva se traduz de relevância impar, na medida em que é inerente à própria cidadania, tendo reflexo direto na soberania popular, em especial o controle indireto desta.

Nessa linha de idéias, pôde-se constatar a limitação posta pela Constituição Federal ao elencar a restrição de direitos políticos, sendo o termo “só se dará” descrito no art. 15 da Carta Política, reflexo dessa preocupação constitucional de evitar a restrição de direitos políticos, sendo certo que a maior limitação ao exercício de cargos públicos deve advir da vontade popular, não cabendo à Justiça Eleitoral o substituir, salvo em hipóteses excepcionais.

Adriano Soares da Costa, com propriedade, destacou que “estimula-se na opinião pública uma postura hipócrita de destituição da legitimidade do parlamento e da classe política tout cort, apontando-se para solução heterodoxas da degradação moral, entre elas o fechamento puro e simples de acesso a maus políticos à disputa dos mandatos. Como o eleitor – e é justamente isso que está à base dessa postura – não teria condições de escolher os seus representantes, que outros façam isso por ele, excluindo de antemão os possíveis candidatos, através de critérios objetivos”.

Pelo ora apresentado, não parece ser esse o objetivo expressado na Constituição Federal, sendo pertinente o aprofundamento e conhecimento sobre a incidência das hipóteses da perda e suspensão dos direitos políticos, em especial no que se refere ao exercício do ius honorum sendo que a jurisprudência alcance hipótese não reconhecidas pela literalidade da norma constitucional, a exemplo da perda mudança de nacionalidade; aplicação de medida de segurança ou mesmo o período de conscrição.

 

REFERÊNCIAS

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NOTAS DE FIM

[1] Mestre em Direito. Doutorando em Direito. Advogado. Sócio do escritório Santos Rodrigues Advogados Associados. Professor de Direito Processual Eleitoral pelo IEC-PUC/MG 

[2] Especialista em Direito Público pelo IEC-PUC/MG. Advogado. Membro do escritório Santos Rodrigues Advogados Associados.

[3] In Direitos Políticos – condições de elegibilidade, inelegibilidade e ações eleitorais. 2ª ed. Edipro: 2000, p. 28.

[4] In Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 115.

[5] In Instituições de Direito Eleitoral. 6ª ed., Del Rey: 2006. p. 95.

[6] Além de próprias e impróprias, classifica as elegibilidades em plena, na qual todo eleitor pode disputar qualquer cargo ou limitada, na qual os cargos são restritos à específicas condições. (in Direito Eleitoral. Impetus: 2004, p. 102).

[7]In Direito Eleitoral Brasileiro. Edipro:2006, p. 118.

[8] PRESSUPOSTOS DE ELEGIBILIDADE: O domicílio eleitoral na circunscrição e a filiação partidária, constituindo condições de elegibilidade (CF, art. 14, § 3º), revelam-se passíveis de válida disciplinação mediante simples lei ordinária. Os requisitos de elegibilidade não se confundem, no plano jurídico-conceitual, com as hipóteses de inelegibilidade, cuja definição – além das situações já previstas diretamente pelo próprio texto constitucional (CF, art. 14, §§ 5º a 8º) – só pode derivar de norma inscrita em lei complementar (CF, art. 14, § 9º). STF, Tribunal Pleno, rel. Min. Celso de Mello, DJ de 27/04/2001.

[9] In Comentários à Constituição de 1988. Forense Universitária: 1989, v. II, p. 1101.

[10] DELOSMAR MENDONÇA JR. fazendo referência a ROBERTO AMARAL, qualifica os direitos políticos como também uma manifestação dos chamados “direitos humanos”. (in Manual de Direito Eleitoral. Editora Podivm: 2006, p. 27)

[11] in Comentários à Constituição de 1967. Forense: 1987, v. 4, p. 573.

[12] Única exceção está prevista no art. 55, IV, §2° da CF/88.

[13] Vide art. 337 do CE: “Participar, o estrangeiro ou brasileiro que não estiver no gozo dos seus direitos políticos, de atividades partidárias, inclusive comícios e atos de propaganda em recintos fechados ou abertos: Pena – detenção até seis meses e pagamento de 90 a 120 dias-multa.”

[14] In Comentários à Constituição de 1988. Forense Universitária: 1989, v. II, p. 1100.

[15] In Direito Constitucional. 10ª ed. Atlas: 2001, p. 251.

[16] Art. 4º. Ao final do período de atividades previsto no § 2º do artigo 3º desta Lei, será conferido Certificado de Prestação Alternativa ao Serviço Militar Obrigatório, com os mesmos efeitos jurídicos do Certificado de Reservista.

§ 1º. A recusa ou o cumprimento incompleto do Serviço Alternativo, sob qualquer pretexto, por motivo de responsabilidade pessoal do convocado, implicará o não-fornecimento do Certificado correspondente, pelo prazo de dois anos após o vencimento do período estabelecido.

§ 2º. Findo o prazo previsto no parágrafo anterior, o Certificado só será emitido após a decretação, pela autoridade competente, da suspensão dos direitos políticos do inadimplente, que poderá, a qualquer tempo, regularizar sua situação mediante cumprimento das obrigações devidas.

[17] Que não recepcionou o §3° do art. 112 da Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro).

[18] Op Cit. p. 527.

[19] Op Cit. p. 103.

[20] Art. 23. A perda da nacionalidade, nos casos do artigo 22, I e II, será decretada pelo Presidente da República, apuradas as causas em processo que, iniciado de ofício, ou mediante representação fundamentada, correrá no Ministério da Justiça e Negócios Interiores, ouvido sempre o interessado.

[21] In Novo Curso de Direito Civil – parte geral. Saraiva: 2005, p. 98

[22] Art. 5º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I – Os menores de 16 anos.

II – Os loucos de todo o gênero.

III – Os surdos-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade.

IV – Os ausentes, declarados tais por ato do juiz.

[23]Art. 14. É facultado o alistamento, no ano em que se realizarem eleições, do menor que completar 16 anos até a data do pleito, inclusive.
§ 1º O alistamento de que trata o caput poderá ser solicitado até o encerramento do prazo fixado para requerimento de inscrição eleitoral ou transferência.

§ 2º O título emitido nas condições deste artigo somente surtirá efeitos com o implemento da idade de 16 anos (Res./TSE nº 19.465, de 12.3.96).

[24] Ressalvado o entendimento de JOEL JOSÉ CANDIDO, que entende que tal hipótese é de perda e não suspensão dos direitos políticos. (in Direito Eleitoral Brasileiro. Edipro: 2006, p. 120).

[25] “INCAPACIDADE CIVIL ABSOLUTA. NECESSIDADE DE DECLARACAO JUDICIAL NO PROCEDIMENTO REGULAR DE INTERDICAO OU PERANTE A JUSTICA ELEITORAL. AMPLA DEFESA DO INTERESSADO”. (RESPE n° 7.028 (Ac. 9262). Rel. Min. Roberto Ferreira Rosas. Pub. no BEL – Boletim Eleitoral, Volume 450, Tomo 1, Página 15. julgado em 04/10/1988).

[26] in Processo Penal. Saraiva: 1990, 12ª ed., 4° vol., p. 223.

[27] Op. Cit. p. 120/121

[28] “RECURSO ESPECIAL. CANDIDATO CONDENADO PELA PRATICA DE CONTRAVENCAO PENAL. CONSTITUICAO FEDERAL, ART. 15, INCISO III. A DISPOSICAO CONSTITUCIONAL, PREVENDO ASUSPENSAO DOS DIREITOS POLITICOS, AO REFERIR-SE A CONDENACAO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO, ABRANGE NAO SO AQUELA DECORRENTE DA PRATICA DE CRIME, MAS TAMBEM A DE CONTRAVENCAO PENAL” (TSE, Respe n° 13.293, rel. Min. Eduardo Ribeiro, p. 07/11/96)

[29]INELEGIBILIDADE. CONDENACAO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO (CONSTITUICAO, ARTS. 14, PARAGRAFO 3, INCISO II E 15, INCISO III). CRIME CULPOSO. E IRRELEVANTE A ESPECIE DE CRIME, BEM ASSIM A NATUREZA DA PENA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (TSE, Respe n° 13.027, rel. Min. Nilson Naves, p. 18/09/96)

[30] O STF considera a suspensão dos direitos políticos como efeito automático do trânsito em julgado da condenação criminal. Vide RE 179.502, p. 8.9.85, reiterado no julgamento do RE 418.876, p. 4.6.2004. Esta discussão já foi de grande relevo conforme destacado por ADRIANO SOARES DA COSTA (in Instituições de Direito Eleitoral. 6ª ed., Del Rey: 2006, p. 119) que levou inclusive ao TSE a proferir o seguinte entendimento, hoje superado: “NAO E AUTO-APLICAVEL O PRECEITO CONSTITUCIONAL DO ART. 15, III, QUE DEPENDE DE LEI ESPECIFICA A INDICAR AS HIPOTESES EM QUE OCORRE A SUSPENSAO DOS DIREITOS POLITICOS EM RAZAO DE CONDENACAO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO”. (TSE, Ac. 12.043, Min. Cid Flaquer Scartezzini, RJTSE – Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 6, Tomo 4, Página 133)

[31] in Direito Eleitoral Positivo. 2ª ed. Jurídica: 1998, p. 75

[32]Inelegibilidade. Condenação criminal. O sursis não afasta a conseqüência da condenação, consistente na suspensão dos direitos políticos. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral.” (TSE, Ac. n° 250, de 2.9.98, rel. Min. Eduardo Ribeiro).

Registro de candidatura. Condenação criminal com trânsito em julgado. Concessão de sursis. Suspensão dos direitos políticos. Estando em curso o período de suspensão condicional da pena, continuam suspensos os direitos políticos, a inviabilizar o registro da candidatura.” (TSE, RESpe n° 16.432, de 22.8.2000, rel. Min. Garcia Vieira.)

[33] In Tratado de Direito Penal, vol. III, 21 ed., ps. 1611162, Saraiva, São Paulo, 1966

[34] DIREITO ELEITORAL – RECURSO ORDINÁRIO – REGISTRO – CONDENAÇÃO CRIMINAL – SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO – LEI Nº 9.099/95 – INELEGIBILIDADE – NÃO-OCORRÊNCIA – PRECEDENTES – RECURSO PROVIDO – I – A suspensão condicional do processo, nos moldes do art. 89 da Lei nº 9.099/95, não implica reconhecimento de culpabilidade e aplicação de pena. II – A suspensão dos direitos políticos e a conseqüente inelegibilidade somente ocorrem com o trânsito em julgado de sentença condenatória. (TSE – RO 546 – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – DJU 11.09.2002)

[35] Inclusive os estaduais e distritais por força do art. 27, §1° e 32, §3° da CF/88.

[36] “Da suspensão de direitos políticos, efeito da condenação criminal transitada em julgado, ressalvada a hipótese excepcional do art. 55, § , da Constituição, resulta por si mesma a perda do mandato eletivo ou do cargo do agente político.” (STF, RE 418.876,  Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 04/06/04) 

[37] In Constituição do Brasil Interpretada e legislação constitucional. Atlas: 2002, p. 256

[38] TSE, Processo Administrativo nº519-20.2010, Rel. Min. Felix Fisher, DJ de 23.03.2010

[39] No mesmo sentido, TSE, AgR-REspe n° 32.6771MS, DJe de 19.3.2009, rei. Mm. Marcelo Ribeiro

[40] MEDIDA DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO DE DIREITOS POLITICOS. NATUREZA CONDENATÓRIA. POSSIBILIDADE. Não obstante tratar-se de sentença absolutória imprópria, a decisão que impõe medida de segurança ostenta natureza condenatória, atribuindo sanção penal, razão por que enseja suspensão de direitos políticos nos termos do art. 15, III, da Constituição Federal. (PA n° 19.297/PR, DJ de 9.6.2006, rei. Mm. Francisco Peçanha Martins); 

[41] BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva: 1989, p. 56.

[42] A obrigação para prestação de serviço de mesário é apenas uma hipótese que poderia gerar a suspensão dos direitos políticos, caso a legislação infra-constitucional assim dispusesse. Não é o caso. Aquele que não cumprir com as obrigações de mesário está sujeito apenas às sanções previstas no art. 124 do CE, que não incluem a suspensão dos direitos políticos.

[43] Art. 435. A recusa ao serviço do júri, motivada por convicção religiosa, filosófica ou política, importará a perda dos direitos políticos.

[44] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 12ª ed., Saraiva: 1990, 3° vol., p. 58.

[45] MIRABETE, Júlio Fabrini. Processo Penal. 9ª ed.., Atlas: 1999, p. 510.

[46] Pode-se implementar uma legislação infra-constitucional adequada para o fim de estabelecer uma prestação alternativa bem como forma de restabelecer os referidos direitos antes de aplicar a sanção de suspensão dos direitos políticos no caso em tela.

[47] A CF/67 em seu art. 144, II “b” tratava ser a hipótese aproximada como causa de perda e não suspensão dos direitos políticos, daí porque o art. 435 do CPP à época havia sido recepcionado completamente. ALEXANDRE DE MORAES (in Direito Constitucional: p. 251) afirmou tratar-se ainda de hipótese de perda dos direitos políticos. Ocorre que a Lei 8.239/91 que regulou o referido inciso no que se refere à negativa de prestação ao serviço militar obrigatório, reconheceu ser a referida hipótese como “suspensão dos direitos políticos” (§2° do art. 4°) devendo tal conotação ser seguida pelas edições legislativas posteriores.

[48] “… caso não tenha sido editada a lei regulamentando a prestação alternativa, não há possibilidade do cidadão ser afetado em seus direitos políticos por inércia estatal. Dessa forma, ficará aguardando a edição legislativa”. (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 10ª ed. Atlas: 2001, p. 251). Ou seja, a Lei Infraconstitucional deverá prever a prestação alternativa para o caso de recusa.

[49] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 10ª ed. Atlas: 2001, p. 252.

[50] SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17ª ed. Melhoramentos: 1999, p. 387.

[51] § 3º Comunicada a perda de direitos políticos pelo Ministério da Justiça, a Corregedoria-Geral providenciará a imediata atualização da situação das inscrições no cadastro e na Base de Perda e Suspensão de Direitos Políticos.

[52] “a pena de suspensão de direitos políticos, além de não estar fundamentada e, conseqüentemente, sem graduação, é desproporcional ao ato praticado. A fundamentação de penalidade tão grave a um membro do Poder Executivo exige que sejam conhecidos os motivos que determinaram ao julgador optar por punição de tão grave conseqüência” (STJ, REsp nº 758.639/PB, Rel. Min. José Delgado, D.J.U. 15.05.2006).

[53] Na verdade o termo correto no contexto da frase seria “condição de elegibilidade” e não inelegibilidade. Até porque a inelegibilidade decorrente de condenação por improbidade administrativa veio somente com a LC 135/2010 que é posterior à edição da obra citada.

[54] In, Instituições de Direito Eleitoral, 8ª edição, Editora Lumen Juris, fl. 84

[55] STJ – 2ª Turma – REsp 658389/MG – Ministra Eliana Calmon – 03/08/2007

[56] Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.

[57] Ainda se encontra pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal a análise da Constitucionalidade das alíneas da Lei do Ficha Lima que adotam o início da inelegibilidade a partir da decisão colegiada, em razão de possível violação ao princípio presunção de inocência (art. 5º, LVII da CF/88).