A mente que se abre a uma nova idéia, jamais voltará ao seu tamanho original. Albert Einstein
Fernanda Rodrigues de Figueiredo Galhano1
Antônio Furiati2
RESUMO
Este artigo discorre sobre a importância da inclusão dos portadores de necessidades especiais no mercado de trabalho sob o viés da psicologia organizacional. A partir das discussões acerca da organização do trabalho pretende apontar as transformações e desafios da prática inclusiva e as contribuições da psicologia.
Palavras – chave: Inclusão. Portadores de necessidades especiais. Trabalho e psicologia.
“O processo de inclusão político-sócio-cultural demandado por diversos setores da sociedade tem acontecido, embora que ainda de forma bastante parcial. Isso demonstra a urgência de tratar a inclusão na contemporaneidade” (MARTINS, 2003).
(…) já é tempo da psicologia vir a contribuir no sentido de conhecer modos de pensar, apreciar e agir dos sujeitos acerca de temas emergentes da contemporaneidade, ao tomar contextos referentes ao mundo de trabalho que passa por reestruturações e renovações tecnológicas e sobre ele repousar um olhar que se caracterize ao mesmo tempo, crítico e criativo (GRISCI, 1999).
A partir desse contexto, o presente artigo embasa-se na psicologia (ciência voltada ao estudo do ser humano e facilitadora do seu desenvolvimento) e nas discutições ocorridas no estágio “Promoção de Saúde e Trabalho” sobre a organização do trabalho para analisar os impactos da inclusão dos portadores de necessidade especiais no mercado de trabalho. Para tal, é importante citar as considerações de Toledo (1986) sobre a Psicologia Organizacional:
É o estudo do fator humano na organização. Este estudo abrange a atração, retenção, treinamento e motivação dos recursos humanos na empresa, assim como a criação de condições organizacionais de trabalho e sistemas de recompensa (…) que auxiliem na criação de clima propício para que funcionários possam atingir suas metas de trabalho e desenvolvimento profissional. (…) A psicologia organizacional em seu contexto mais amplo, coloca ênfase nos aspectos grupais e organizacionais do trabalho.
Segundo Chiavenato (1999), na maioria das organizações o grande diferencial e a principal vantagem competitiva das empresas decorrem das pessoas que nelas trabalham. São as pessoas que geram e fortalecem a inovação e o que deverá vir a ser.
Existe uma tendência das organizações ampliarem seu papel, deixando de ser somente unidades de produção de bens e serviços; para se tornarem, também, espaços sociais em que os indivíduos, isolados ou em grupos, possam realizar aprendizagens mais significativas para o desenvolvimento de seus potenciais inexplorados; onde tenham oportunidade de usar seus talentos em prol do próprio desenvolvimento e do desenvolvimento da organização e da sociedade (MOSCOVICI 1994, p.73).
Para Morin (2001) os momentos de transformação organizacional constituem potencialmente uma oportunidade para reorganizar o trabalho de tal forma que a qualidade de vida e a eficácia organizacional sejam melhoradas; já que o trabalho representa um valor importante, exerce influência considerável sobre a motivação dos trabalhadores e também sobre sua satisfação e sua produtividade.
Nós trabalhamos porque precisamos do dinheiro para sobreviver. Mas também trabalhamos porque isto contribui para a nossa dignidade, nosso valor como pessoas. O trabalho nos dá mais controle sobre nossa vida e nos conecta com as outras pessoas. Sinto-me realmente privilegiado em ser remunerado pelo o que adoro fazer. Toda sociedade que exclui pessoas do trabalho, por qualquer motivo, sua deficiência ou sua cor ou seu gênero, está destruindo a esperança e ignorando talentos. Se fizermos isso, colocaremos em risco todo o futuro (ROBERT WHITE, apud SASSAKI, 1997, p.1).
Tendo em vista as considerações acima, Araujo e Schmidtn (2006) afirmam que a inclusão é um processo no qual a sociedade se adapta para permitir a participação das pessoas em todos os seus setores, inclusive daquelas pessoas com necessidades especiais, e essas, por sua vez, se preparam para assumir seus papéis na sociedade. Nota-se que o acesso ao mercado de trabalho é um dos aspectos do processo de inclusão; importante por proporcionar às pessoas condições para a satisfação de suas necessidades básicas, sua valorização e o desenvolvimento de suas potencialidades.
O Brasil conta com 24 milhões de pessoas com deficiência, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas pessoas, porém, não circulam nas ruas, nas escolas comuns, nos locais de lazer e cultura e muito menos têm acesso ao trabalho. É hora, portanto, de se reverter esse quadro.
Segundo Abranches (2000), aproximadamente desde 1990 é crescente a pressão social no sentido de que os direitos humanos dessas pessoas sejam respeitados dando cumprimento, entre outras coisas, à oferta de serviços de educação, reabilitação, saúde, transporte, emprego, etc.
A história de oferta de profissionalização para portadores de necessidade especial passou por diversas fases ao longo dos tempos. De acordo com Sassaki (1997), podem-se identificar diferentes momentos nos procedimentos de profissionalização adotados pela sociedade e direcionadas às pessoas portadoras de necessidades especiais, como por exemplo, a fase de exclusão social, de segregação institucional, da integração e da inclusão social.
Na fase de integração, diversas modalidades de trabalho eram oferecidas às portadoras de necessidades especiais – o trabalho plenamente integrado, no qual essas trabalhavam em setores de empresas públicas ou privadas sem que houvesse qualquer reestruturação ambiental ou cultural da própria empresa para receber tais funcionários; trabalho integrado, no qual as empresas se dispunham a fazer pequenas alterações em seu espaço físico ou nos postos de trabalho para favorecer a colocação desses funcionários; e o trabalho semi-integrado, em que eles trabalhavam em setores exclusivos das empresas, portanto segregativos, com ou sem alterações (SASSAKI, 1997).
Essas formas de integração favorecem que os funcionários com necessidades especiais tenham dificuldade em se envolver em programas de treinamento e desenvolvimento de recursos humanos, seja por dificuldades de acesso, seja por falta de integração social real com os demais participantes da empresa.
Na fase da inclusão, o que se pretende é que empregadores, instituições formadoras e os portadores de necessidades especiais enfrentem juntos os desafios da qualificação, da produtividade e da competitividade. No Brasil, a profissionalização dessas pessoas tem sido oferecida, prioritariamente, por instituições especializadas, por centros de reabilitação e por associações de pessoas deficientes. As modalidades de profissionalização oferecidas vão desde o treinamento para a colocação em emprego competitivo até o programa de emprego apoiado, passando por alternativas como o trabalho protegido (oficinas) ou programas de pré-profissionalização (SASSAKI, 1997).
A literatura atual tem se mostrado favorável a programas de emprego apoiado, como forma viável de inclusão de portadoras de necessidades especiais no mercado de trabalho, apesar de ainda ser uma modalidade pouco difundida entre as agências profissionalizantes (RAGAZZI, 2001; ARANHA, 2003)
Segundo Sassaki (2000), desde a Carta para o Terceiro Milênio, proclamada em 1999, a meta de todas as nações é de evoluírem para sociedades que protejam os direitos das pessoas com deficiência mediante o apoio ao pleno empoderamento e inclusão delas em todos os aspectos da vida.
No entanto, essa meta depara-se com alguns problemas, como por exemplo, da educação e da empregabilidade, em que se destaca o preparo profissional inadequado dos usuários de instituições especializadas e o despreparo atitudinal, arquitetônico e programático das empresas para receber trabalhadores com deficiência (SASSAKI, 2000)
Conforme Sassaki (2000), para uma efetiva educação profissional e colocação no mercado é preciso educar a sociedade para que ela adote a visão inclusivista na elaboração e prática das políticas públicas em torno dos direitos e necessidades de todos os segmentos populacionais. Assim é preciso estar atento para não perpetuar, nas novas políticas públicas, certas práticas geradas sob o paradigma da integração social, tais como: criação de subsistemas separados para pessoas com deficiência (escolas especiais, classes especiais, brinquedos separados em parques de diversões etc.). Tais práticas são segregativas, discriminatórias e reforçadoras de estigmas, entre outros aspectos negativos.
É preciso uma mudança de atitude que envolva a pessoa com deficiência, sua família, a instituição especializada e a comunidade, em especial o mercado de trabalho. A atualização das políticas públicas, assim como a elaboração de novas políticas públicas, deve passar, portanto, pelo prisma da inclusão social a fim de que possamos ter a garantia de que estamos no rumo certo diante das novas tendências mundiais no enfrentamento dos desafios da diversidade humana e das diferenças individuais em todos os campos de atividade humana. Também é importante que a sociedade, em especial as empresas, mude em termos de filosofia de contratação das pessoas deficientes; com a implementação de programas de prontidão simultânea para empregar pessoas com deficiência e das pessoas com deficiência para desenvolver sua empregabilidade; implementação de sistemas nacional e estaduais de educação profissional e colocação no mercado de trabalho; as escolas comuns e as escolas especiais devem tornar-se cada vez mais inclusivas. Por fim, o autor enfatiza a atualização das instituições especializadas em termos de filosofia de atendimento à pessoas com deficiência, oferecendo programas e serviços condizentes com o atual movimento de empoderamento e vida independente (SASSAKI, 2000)
A psicologia em geral, em especial a psicologia organizacional, tem, como um de seus papéis, a importância de favorecer a inclusão, orientando e formando profissionais dessa área com ênfase no ser humano, para permitir uma maior conscientização popular e acadêmica sobre esta temática, realçando o significado do trabalho na vida do homem, como espaço de realização pessoal e de formação de identidade, e o risco à saúde física e psíquica do trabalhador advindo da não-concretização destas vivências positivas (GRISCI, 1999).
O homem não é uma máquina. O homem tem emoções, sentimentos e necessidades que, muitas vezes, fogem à sua vontade. Cabe ao administrador e o psicólogo conhecer este ser cada vez mais para visualizá-lo em suas plenas potencialidades, seja ele portador de necessidades especiais ou não (GRISCI, 1999).
Portanto, incluir é reconstruir nossa subjetividade para termos as ferramentas que permitam a sobrevivência, a solidariedade e o convívio com as diferenças. “Só assim poderemos sustentar os quatro pilares da educação que fundamentarão o novo milênio: aprender a ser, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a conhecer” (MARTINS, 2003).
REFERÊNCIA
ARANHA, M.S.F. Trabalho e emprego: instrumento de construção da identidade pessoal e social. Brasília: Corde, 2003.
ARAUJO, Janine Plaça; SCHMIDT, Andréia. A inclusão de pessoas com necessidades especiais no trabalho: a visão de empresas e de instituições educacionais especiais na cidade de Curitiba. Rev. bras. educ. espec., Marília, v. 12, n. 2, ago. 2006. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S1413-65382006000200007&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em 11 out. 2009. doi: 10.1590/S1413-65382006000200007.
CHIAVENATO, Idalberto. Administração de recursos humanos: fundamentos básicos. 4.ed. São Paulo: Atlas, 1999.
Grisci, Carmem Lígia Iochins – Trabalho, Tempo e Subjetividade: Impactos da Reestruturação Produtiva e o Papel da Psicologia nas Organizações – in: Revista Psicologia, Ciência e Profissão, nº 1, ano 19, p. 02 – 13, Brasília, 1999.
MARTINS, Geraldo. Notas em per-curso: as faces da inclusão – do individual ao político-social. In__________ BETIM, Prefeitura Municipal – Secretária Municipal de Educação e Cultura. Coletânea de textos referentes à Jornada de Estudos dos Pedagogos: Dilemas, desafios e perspectivas no campo da prática. Betim, 2003. (mimeo) p.12-14.
MORIN, Estelle M. Os sentidos do trabalho. Revista de Administração de Empresas, São Paulo , v.41, n.3 , p. 8-19, jul./set. 2001.
MOSCOVICI, Fela. Equipes dão certo: a multiplicação do talento humano. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1994 239 pAraujo e Schmidtn (2006)
RAGAZZI, C.L.M. Emprego com apoio: alternativa viável para inserção de pessoas com deficiência mental no mercado de trabalho? 2001. Dissertação (Mestrado em Educação Especial – Educação do Indivíduo Especial) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos.
SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
____________, Implicações do paradigma da inclusão para o emprego d e pessoas com deficiência. In: ABRANCHES, Cristina e outros. Inclusão dá trabalho. Belo Horizonte: Armazém de Idéias, 2000, 83-112.
TOLEDO, F., Dicionário de Recursos Humanos. São Paulo: Atlas, 1986.
1 Acadêmica do curso de Psicologia, do Centro Universitário Newton Paiva.
2 Professor supervisor de estágio do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva