Ingryde Guedes[i]
Shirley de Oliveira Martins
Cláudia Neto[ii] 

RESUMO
Este trabalho tem como objetivo elucidar, num esboço inicial, as contribuições da Psicologia Sistêmica na terapia familiar por meio de uma breve exposição de conceitos teóricos, e um estudo de caso relacionado a esse campo. Busca, também, apontar como o comportamento de um membro da família altera o comportamento de outros no contexto familiar. 

Palavras-chaves: Psicologia. Terapia Sistêmica. Sintoma. Família.

  

A teoria da terapia familiar está fundada no pressuposto de que o homem não é um ser isolado, ele é um membro ativo e reativo de grupos sociais conforme Minuchin (1990) testa. A terapia familiar tem como foco o tratamento de todos os membros da família, e seu objetivo é tratar indivíduos pertencentes ao mesmo grupo. O indivíduo doente é entendido como o sintoma do sistema doente, e o problema do indivíduo como pertencente a um sistema maior, entendendo-se que o comportamento de um membro altera o comportamento de outros no contexto familiar.  

Nichols e Schwartz (1998) citam um estudo desenvolvido por Bateson (1956) com famílias que possuem membros esquizofrênicos. Esse estudo formula a hipótese de que a esquizofrenia possa ser resultado da interação familiar. Mais tarde, Jackson (1957) cria o conceito da homeostase familiar: é um estado não estático, dinâmico, que as famílias procuram manter ou restaurar, onde os membros da família atuam como governantes ativadas pelo erro (Haley, 1963; apud Nichols e Schwartz, 1998). Pode ocorrer que algum membro da família piore, quando outro tem uma melhora significativa.  

O impacto da melhora de um paciente sobre a família nem sempre é negativo. Fisher e Mendell (1958) relatam uma propagação de mudanças positivas dos pacientes para outros membros da família. Entretanto, a questão não é se o efeito da mudança do paciente sobre a família é positivo ou negativo. A questão é que a mudança em uma pessoa modifica o sistema. (Nichols Schwartz, 1998, p. 25).  

Algumas vezes a maneira familiar de se manter neste equilíbrio homeostático inclui um sintoma que é inaceitável para eles ou para a sociedade. Desta forma, a função do sintoma é o de manter a família em equilíbrio suportável para criar condição de convívio que pode ou não ser uma forma saudável para os membros envolvidos. Para exemplificar será apresentado um caso atendido na Clinica de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva.  

Clarice (esposa), nome fictício, procura a clínica com a queixa de ser acusada pelo marido de traição. Luiz (marido) é usuário de maconha há 35 anos e havia sido internado em um hospital de Belo Horizonte por ter tido uma crise na qual ficou muito agitado. Ficou internado por 15 dias e ao sair, não quis continuar com a medicação, alegando que o medicamento o fazia ficar tremulo e o seu trabalho exige muita atenção. Essa acusação é causa de muitas brigas e constantes investigações por parte do marido. Clarice apresenta-se muito deprimida, dizendo não saber o que fazer. Ângela, sua filha mais velha, com 18 anos, quer a separação do casal. Jéssica com 12 anos, não tem certeza ser quer a separação, espera que o pai melhore e volte a ser o pai “legal” que era. Laura com apenas 6 anos, quer que o pai pare de brigar com a mãe. As sessões eram feitas com a presença da mãe e das filhas mais novas, a filha mais velha compareceu a duas sessões. 

Após as entrevista iniciais, a condução do processo terapêutico ficou em torno de como Clarice iria tomar suas decisões e conduzir a vida da família, já que isso era tarefa do marido e esse não tinha condição para tal. A pressão de Ângela para Clarice se separar era muito grande. Ela dizia não suportar mais as brigas em casa e não aceitava a passividade de sua mãe. Ângela havia tentado suicídio por 2 vezes. As terapeutas que faziam o acompanhamento da família entraram em contado com a psicóloga que fazia atendimento na empresa que Luiz trabalha. Esta rede de apoio foi importante, pois ele não sabia das dificuldades da família e não tinham conhecimento do uso de drogas feito por Luiz. Após algumas sessões, Luiz teve uma nova crise no emprego e foi conduzido ao Hospital, onde foi medicado e aderiu ao tratamento, ficando afastado do emprego por um tempo. A relação familiar melhorou um pouco, Clarice voltou a ficar mais animada, mas Ângela voltou a tentar suicídio, passando a ter uma raiva muito grande do pai. Não queria ficar no mesmo lugar que o pai, não conversava com ele e se negava a ir à Clínica de Psicologia. As informações eram trazidas por Clarice.

O sintoma pode servir a funções diferentes, em épocas diferentes, para conjuntos diferentes de relação conforme Papp (1992) nos diz. Ângela se apresentava muito deprimida, falando que queria ir ao encontro de sua tia já falecida; algumas vezes falou ter visto esta tia. O pai, saindo da posição de paciente identificado, aquele que traz problemas, coloca a filha nesta posição: aquela que não consegue mais trabalhar e estudar, ter um convívio familiar, criando um clima constante de tensão como existente na época que o pai acusa a mãe de adultério.  

Desta forma, o equilíbrio doente da família permanece, ora elegendo o conflito do casal, ora a psicose do marido, ou a depressão da esposa, ora as tentativas de suicídio da filha. Como atestam os teóricos, a crise é o melhor momento para as mudanças, já que a família, pressionada pela circunstancias críticas e de sofrimento agudo, movimenta-se em direção à ruptura de sua patologia, colocando-se sob os cuidados de uma terapia. Neste caso, apesar de observarmos alguns passos significativos de mudanças; mesmo pressionada pela filha Clarice pensa em se separar, Luiz participa de duas sessões da terapia, volta ao psiquiatra e adere ao tratamento medicamentoso, Clarice se apresenta mais tranqüila; não se pode dizer que o equilíbrio disfuncional da família tenha sido de todo rompido. Pode-se dizer que a família ainda precisa desse ponto instável e conflituoso de ligação e não está pronta ainda a abrir mão disso em favor de novas formas de convivência. Nesse caso, a separação do casal. 


REFERENCIAS 

MINUCHIN, Salvador. Famílias: funcionamento & tratamento. Tradução de Jurema Alcides Cunha. Porto Alegre, Artes Médicas, 1982. 

NICHOLS, Michael P.; SCHWARTZ, Richard C. Terapia Familiar: Conceitos e Métodos. 3º. Ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.  

PAPP, Peggy. O processo de mudança: uma abordagem pratica a terapia sistêmica de família. Tradução de Maria Efigênia F.R. Maia e Claudine Kinsch. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.  


[i] Acadêmicas do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva 

[ii] Professora supervisora de estágio do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva

E2-25 O adoecimento da família