Inara de Souza Moreira[i]
Raquel Neto[ii]
RESUMO
O presente artigo retrata a angústia que é própria da existência humana. Angústia que coloca o homem em ação, mas que também o paralisa e o determina. Determinismo que o leva ao desespero, à busca incansável por uma existência autêntica, autônoma, pensando em uma sincronicidade positiva entre o passado, presente e futuro.
Palavras-chave: Angústia. Tempo. Dívida. Culpa.
Tempo, espaço e coexistência são os pilares para a formação da existência. Portanto, entender o tempo é observar o Homem em sua maior contradição: a tensão entre permanência e transitoriedade, poder e impotência, vida e morte (AUGRAS, 1993).
Experimentamos o tempo como um fluir, um fluxo de momentos contínuos que se sucedem a partir de nossas experiências ou vivências. Assim, podemos entendê-lo como uma sucessão do passado/presente/futuro. A vivência do tempo biológico envolve, portanto, a de um presente que encerra as implicações passadas e futuras (AUGRAS, 1993).
Todo momento depressivo sintomático se instala em um passado vazio de sentido, congelando e petrificando a pessoa em um presente, que segundo Augras (1993), “é antes de qualquer coisa, o tempo da ação imediata”.
O tempo se apresenta como uma orientação significativa do ser. E é nesse tempo presente e de ações imediatas que a pessoa se perde, se desorganiza e se angustia.
Uma desorganização no tempo e no espaço prejudica a pessoa a se projetar. Quando ela não consegue se perceber no centro, uma desorganização no seu mundo acontece e isso a faz se perder e a encaminha para uma decadência.
Todas as aprendizagens e experiências somáticas fornecem ademais suporte para a vivência de um processo contínuo, de aquisição, mas também de despojo que, á medida que constrói o indivíduo, do mesmo modo o encaminha para a decadência. (AUGRAS, 1993)
O angustiar-se é inerente à condição Humana. A angústia existencial possibilita ao homem criar e concluir, transcender-se e compreender-se. É necessário que ele se compreenda e se projete em um poder-ser em função de sua própria presença.
Para Boss (1977), angústia e culpa são consideradas, em diversos lugares e de acordo com velhos provérbios, como aquilo que apreende o mundo no íntimo.
O ser humano é de possibilidades, de muitos caminhos e escolhas e, inevitavelmente, o decidir e o se posicionar frente a situações conflituosas ou não gera angústia.
Para Heidegger (1989), decisão diz: deixar-se proclamar no ser e estar em débito mais próprio. “A decisão se mostrou um existir originário e próprio a presença do ser fica indecisa, fechada em seu poder-ser fala mais próprio” (HEIDEGGER, 1989).
A fala e a reflexão são mecanismos para enfrentar a angústia. Para Augras (1993), a fala do indivíduo exprime a organização do seu mundo constantemente criado, questionado, ameaçado e construído.
O que de cada angústia é sempre um ataque lesivo à possibilidade do estar-aí ( Dasein) Humano, No fundo, cada angústia teme a extinção deste, ou seja, a possibilidade de um dia não estar mais aqui. O pelo que da angústia Humana é por isto, o próprio estar aí, na medida em que ela sempre se preocupa e zela só pela duração deste. (BOSS, 1977)
Porém, nem sempre sabemos lidar com nossa angústia de forma positiva, é aí que ela se torna vital, patológica, congelando o ser humano, impedindo a manifestação de seus desejos e a continuidade de sua obra.
Segundo Augras (1993), a significação da obra está dentro do espectador. A obra disputa nele este significado, porque a transformação do mundo que ele vem propor é, em última análise, a transformação do próprio espectador.
O homem é um ser de possibilidades, por isso a importância em acentuar a realização de suas necessidades, sendo elas vistas como um fator que compele o indivíduo na procura do objeto que satisfaça uma falta biológica ou motive suas realizações existenciais.
O ser humano que se constrói, lança e se engendra é um ser de processos e projetos. Para Augras (1993), “criar é um ato de liberdade, de revelação e transmutação. É linguagem além da fala, universo além do mundo”. Existir é transformar-se.
A existência sem projetos, sem sentido ou significado, pouco contribuirá para algo de expressivo em nossas vidas. Se não refletirmos a respeito do dia a dia e da vivência satisfatória de nossos desejos, cada vez mais obstáculos aparecerão.
Enquanto projeto, ele é em si mesmo essencialmente um nada. O nada mencionado pertence a presença enquanto o ser-livre para suas possibilidades existenciárias. A liberdade, porém, apenas se dá na escolha de uma possibilidade, ou seja, implica suportar não ter escolhido e não poder escolher outras. (BOSS, 1977)
Permitir que em um passado com falas e atitudes de outrem tome conta da existência, abrindo no tempo presente um vazio de sentidos, e a necessidade de estar sempre “cobrindo buracos” é viver uma existência inautêntica. É ser e viver por todos os outros.
A fala enuncia o encontro na medida em que o indivíduo se expressa. A sua intencionalidade e sempre comunicativa, a expressão implica a compreensão da coexistência (AUGRAS, 1993).
Para Boss (1977), culpa é aquilo que carece e falta. Ser e estar em débito tem ainda um significado mais amplo, o de ser responsável ou de “ser a ocasião de alguma coisa” (HEIDEGGER, 1989).
O conceito formal de estar em débito no sentido de tornar-se culpado com relação a outrem deixa-se formular do seguinte modo: ser-fundamento da falta na presença de um outro, de tal maneira que esse próprio ser-fundamento determina-se “ faltoso. Esta falta está em não se satisfazer uma exigência do ser com os outros existentes (AUGRAS, 1993)
O outro fornece um modelo para a construção da imagem de si. Por ser outro, contudo, ele também revela que a imagem de si comporta uma parte igual de alteridade.
Portanto, viver em débito, ter sempre dívidas, talvez possa ser entendido em um modo de ser–com-os-outros, em um não saber viver faltoso, em dizer não, é viver com uma sobrecarga em função dos outros.
Para Boss (1977), todos os sentimentos de culpa baseiam-se num ficar a dever. O ser humano deve sempre buscar apoio para identificar e aceitar a verdade pessoal.
REFERÊNCIAS
AUGRAS, Monique. O Ser da Compreensão: Fenomenologia da situação de psicodiagnóstico. (3a ed.). Petrópolis, Vozes, 1986.
BOSS, Merdad. Angústia, culpa e libertação. 2ª Ed. Livraria duas cidades, São Paulo, 1977.
HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. 2ª Ed. Petrópolis, Vozes, 1989.
[i]Acadêmica do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva
[ii]Professora supervisora de estágio do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva