Déa Maria Moreira de Oliveira[i]
Geraldo Martins[ii] 

RESUMO
O artigo propõe uma discussão sobre as características negativas e positivas da atitude da Psicanálise e do ser humano diante da doença psíquica social, e a busca de um tratamento. Sugere ainda o olhar psicanalítico como sendo um modo cuidadoso de abordar a questão social, bem como refletir sobre o papel do psicólogo neste contexto, uma vez que é sabido que toda prática psíquica é pautada em um querer e buscar entender o que se passa com o “Individuo”.  

Palavras-chave:Psicanálise. Social. Individuo. 

 

HISTÓRICO

A Revolução Industrial e o Capitalismo mudaram definitivamente a forma de convívio em sociedade. A formação de riquezas e o acúmulo de capital proveniente do Sistema Capitalista produzem além do bem estar para muitos poucos, o seu contrário, a miséria para a avassaladora maioria, como bem advoga Rosdolski (2001).

A globalização nos tem imposto uma variedade de doenças “sintomas” gerados pelas desigualdades, brigas por poder, egoísmo, individualismo e descrença nunca antes vistos na história da humanidade. Sabemos hoje que a América Latina esta vivenciando a maior desigualdade social do planeta assim como a maior crise existencial do ser humano, o crescimento descontrolado das cidades, perversões, depressão, melancolia, provindas da do Mal-Estar sofrido pela humanidade.

Nesta modernidade, observa-se junto com os avanços tecnológicos, uma organização social que convive com a transgressão de normas elementares, abusos e corrupção generalizados, assim como a promoção, para muitos, da exclusão do acesso aos bens e aos modos de gozo imediatos próprios do modelo econômico. Esse modelo gera uma sensação de desproteção aliada a um crescente desamparo discursivo, caracterizado pela fragilização das estruturas discursivas que suportam o vínculo social, contribuindo assim, para os processos de exclusão social e o aparecimento das muitas doenças psicologias. 

Só é possível o enfrentamento a toda esta conjuntura (que se impõe aos sujeitos que se encontram em vulnerabilidade, entendida aqui como situação de baixa capacidade material, simbólica e comportamental) buscar na terapia enfrentar e superar os desafios com os quais se defrontam muitos indivíduos. Este enfrentamento deve acontecer através da implantação e implementação de políticas públicas de saúde mental e social. Um maior comprometimento e envolvimento dos profissionais da Psicologia com a questão social do individuo. 
 

Estas medidas seriam, portanto, um desdobramento da qualidade de vida psíquica. As doenças psíquicas, ou os sintomas sociais nascem hoje tendo como público alvo crianças, adolescentes, adultos e idosos vulnerabilizados pelo crescente Mal-Estar causado pelo crescimento desenfreado da tecnologia, conhecimento, desejo de adquirir e possuir, do gozo desenfreado. 

Sendo assim, a busca da cura ou tratamento deveria partir da iniciativa pessoal.  O indivíduo precisa se conscientizar que o caminho esta na busca do entendimento desse Mal-Estar, desse sintoma, através da terapia. 

A Psicanálise se alvitra a fortalecer e se propõem a buscar junto com o sujeito caminhos para ajudar na superação de problemas através do conhecimento pessoal, facilitando a sua interação com o social. Atuando até mesmo como um instrumento operacional para desenvolver ações dinâmicas, devidamente planejadas para devido fim, uma quase ação que leve o individuo a valorizar a se mesmo, o aprendizado mútuo, a troca de idéias de experiências, estimulando o desenvolvimento de postura crítica, investindo no desenvolvimento de relacionamentos interpessoais e o respeito às diferenças. Podendo assim, atingir as varias dimensões (lógica, cognitiva, reflexiva, afetiva, ética, estética e lúdica) nesse desenvolvimento integral do sujeito.

 

A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO SOCIAL SOB ORIENTAÇÃO DA PSICANÁLISE.  

Davidoff (1983) afirma ser a psicanálise uma das quatro visões atuais da psicologia moderna e que muitos psicólogos orientados psicanaliticamente desenvolvem suas práticas nas mais variadas atividades.
A psicanálise coloca que os objetos e as emoções humanas tornaram-se os produtos mais elaborados de uma cultura que se caracteriza pela criação contínua do lixo e do desperdício. (MRECH, 1999).
A possibilidade da intervenção psicológica de orientação psicanalítica no social pode achar alguma direção na contribuição que a psicanálise possibilita à educação.

Esta contribuição viável da psicanálise se faz no sentido da forma de participação do próprio sujeito na sociedade. Para a educação o discurso psicanalítico propõe que seria desejável que ela deveria se interessar pelo desejo do aprendiz, o que ele deseja saber e aprender é o primeiro passo, afinal o saber só é possível se houver o desejo em aprender. Se isto se faz possível, existe uma possibilidade de repetição com a atividade psíquica, social e educativa.

Para isso deve-se erguer um processo de construção de aprendizagem cidadã, o sujeito participa desde o início da arquitetura da própria atividade, logo, este primeiro processo de construção despertaria no indivíduo um desejo em aprender sobre ele mesmo e o que esta sendo edificado por ele mesmo. 

A psicanálise pode contribuir também para articular, ressignificar e transformar os elementos simbólicos e causadores de estresse de grupos que vivem as fragmentações da vida social e cultural contemporânea. 

Esta sociedade contemporânea é a sociedade do esteriótipo, das crenças prévias, de como as pessoas devem pensar e sentir, e por mais que esta forma de organização nos venda o saber e as imagens estereotipadas como verdadeiras fontes de saber, podemos através do saber de nós mesmos não acreditar nelas ou não nos encontrarmos por elas representados. 

Para a psicanálise, os estereótipos, as imagens, e os preconceitos são fenômenos essencialmente imaginários, ou seja, aquilo que em função de imagens o sujeito acredita e dá validade. 

Se o imaginário, para a psicanálise, é o registro daquilo que se congela da imagem fixada no espelho, é possível que o sujeito se perceba como não inserido nela, ou seja, podendo dela sair. Assim a psicanálise pode levar a compreensão dos estereótipos e da saída deles. 

O psicólogo pode alterar o que está posto, ou seja, ao que Lacan (1964) sugere como “o que estava lá há um bocado de tempo antes que viéssemos ao mundo, e cujas estruturas circulantes nos determinam como sujeito”. 

Assim, dentro de uma orientação psicanalítica, o psicólogo pode proporcionar dentro de um contexto social atividades que venham dar possibilidade ao sujeito de elaborar um saber a respeito do seu próprio processo, que possibilite a ele se localizar frente à lógica. 

A prática psicológica, independente da teoria que a dá suporte em questões sociais, ainda é relativamente nova, confundindo-se apenas com a escuta qualificada e acolhimento, fortalecimento, promoção de autoestima e superação de violência.  No geral, as atividades consideradas próprias e exclusivas deste profissional foram sempre aquelas essencialmente clínicas, individuais ou em grupo. 

Outro fato é que as diferentes compreensões sobre o que é próprio e específico do psicólogo também indicam indefinição do lugar deste profissional, e remetem à discussão sobre os limites e as possibilidades de intervenção deste.
O que é esperado do trabalho do psicólogo é que este vá ao encontro de produzir no sujeito participante um efeito estruturante e organizador das questões as quais está inserido o sujeito em vulnerabilidade social.
 

Assim, este fazer do psicólogo utilizando-se da orientação psicanalítica, no tocante à reconstrução deste lugar em que o sujeito esta inserido na sociedade, pode oferecer subsídios para a construção junto ao individuo social, novas possibilidades e espaços para o protagonismo social, auxiliando o sujeito a perceber a lógica em que se encontra engendrado e o caminho pelo qual este indivíduo poderá ressignificar sua vida pessoal, familiar e comunitária, consequentemente cidadã. Minimizando e aprendendo a lidar com este sintoma causado pelo Mal-Estar da civilização Moderna.

É obvio que outras vertentes teóricas podem auxiliar o trabalho do psicólogo nessa construção, mas é sempre muito importante ressaltar que, independente da escolha teórico-metodológica que o psicólogo lançará mão, o protagonismo social, a busca pela compreensão de se mesmo, a cidadania e a sensação de bem-estar sejam os objetivos finais destas atividades. 

As possibilidades de intervenção são inúmeras, principalmente neste âmbito de aprendizagem, e cabe aos profissionais envolvidos nestas reafirmarem sua postura, visando sempre o enfrentamento da vulnerabilidade social e pessoal do individuo em que estão inseridos neste fenômeno de Mal-Estar social desencadeado pela Modernidade.

 

REFERENCIAS 

FREUD, S. (1987b). O Mal-Estar na Civilização (Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. 21). Rio de Janeiro: Imago.

(Originalmente publicado em 1930[1929]).
DAVIDOFF, L. L.. Introdução à psicologia. São Paulo: McGraw-Hill. (1983)

DUPAS, M. A. Psicanálise e Educação: Construção do Vínculo e Desenvolvimento do Pensar. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2008;

LUCENA FILHO, E.L. Reflexões Sobre o Psicólogo no CRAS: A Possibilidade de Si Perceber. In Redepsi, Revista de Psicologia <http://www.redepsi.com.br/portal/modu … tion/item.php?itemid=1195.> 

MRECH, L.M. Psicanálise e Educação: Novos Operadores de Leitura. São Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2003.

PEDROSO, R. C. Violência e Cidadania no Brasil. São Paulo: Editora Ática, 2003;

ROSDOLSKI R.. Gênese e estrutura de O Capital de Karl Marx. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001;


[i] Acadêmica do Curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva 

[ii] Professor supervisor de estágio do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva

E2-10 A Importância da Psicanálise na Dinâmica Social do Indivíduo