Sandra Siani Passos Novais[i]
Geraldo Majela Martins[ii]
RESUMO
Este artigo pretende articular, a partir da teoria freudiana sobre o feminino e a sexualidade feminina, a escolha de mulheres por homens que elas mesmas descrevem como fracassados e qual a ligação desta escolha com seus objetos de amor infantil. Tema trazido com muita frequência nos relatos da supervisão de estágio da Clínica Psicanalítica.
Palavras – chave: Objeto amoroso, Feminino, Psicanálise.
Houve uma mudança patente nas relações amorosas da contemporaneidade. Nos dias de hoje, este ainda se constitui como um dos temas mais levados à clínica, os impasses da vida amorosa, nos quais os sujeitos encontram grande dificuldade em fazer laços afetivos, sem que haja uma grande explosão de conflitos. Atribuímos grande parte desse impasse a alteração do papel da mulher, que outrora tinha um marido que mantinha a família, na condição de provedor. E hoje, além de ser mãe, tem a responsabilidade de prover, papel que no passado era desempenhado pelo masculino.
O panorama atual das relações amorosas nos orientou para uma interrogação surgida nos relatos dos colegas durante a supervisão de estágio e suscitada também em nossa própria experiência nos estágios de orientação psicanalítica. Muitas mulheres estão trazendo a seguinte queixa: “não sei porque estou com ele, ele é um fracasso, um zero à esquerda”. Isso nos faz pensar que conteúdo psíquico está presente na história pregressa dessas mulheres para fazerem tal escolha e sustentá-la com tanto vigor.
Então nos remetemos a Freud e o que ele diz sobre o feminino.
…para a menina , assim como o menino, o seu primeiro objeto de amor é a mãe (e as figuras de babá e da nutriz que nela se fundem)…na situação edipiana a menina tem seu pai como objeto amoroso, e espera-se que no curso normal do desenvolvimento ela haverá de passar desse objeto para sua escolha objetal definitiva (Freud,1932, p. 143).
Como as coisas não são simples assim, essas passagens normalmente ocorrem com muita luta para a menina, já que ela diferentemente do menino terá que trocar de objeto de amor, da mãe para o pai, e ainda de zona genital, do clitóris para a vagina. Freud (1932) ainda defende que teria de levar em conta a possibilidade de muitas mulheres permanecerem ligadas ao objeto original, a mãe, e nunca alcançarem a mudança em direção aos homens. Deduzimos que essa ligação com a mãe é de extrema importância para a constituição de seus vínculos afetivos, e que esta fixação é um prejuízo imenso para a mulher.
Observamos na clínica a queixa normalmente voltada para o homem com quem esta mulher se relaciona conjugalmente, fazendo uma analogia inconsciente com a forma como se relacionava com o pai, um pai ausente, agressivo, que não lhe dava atenção, carinho. Podemos ser tentados a defender a ideia de que esta mulher repete a relação que tinha com o pai, mas em contato com a literatura de Freud (1932), percebemos que, na verdade, o que ela repete é o mau relacionamento com a mãe, o qual é o original. Essa mãe que enquanto função diz que este pai é ausente, tornando isso no imaginário desta criança. Lacan (1999) defende que o pai esteja presente mesmo quando não está.
Nos relatos da supervisão, as falas das clientes normalmente fazem menção à relação com o pai como difícil, excluindo a sua relação com a mãe, mesmo havendo intervenção a respeito. Suspeitamos, de acordo com os nossos estudos e com as observações feitas pelo Mestre Geraldo Martins, que essa dificuldade em se relacionar com o pai é remetida à transferência de objeto de amor da mãe para o pai e que este pai, que da mesma forma que a mãe é castrado, que não pode lhe dar o que ela tanto quer, impossibilitado também, pois todos os pais são castrados. Isso é o que será endereçado ao outro, procurado nas suas relações afetivas. Será uma repetição, como o pai os homens nada podem fazer por ela, são fracassados, impotentes. É uma forma, segundo observações do Professor Geraldo Martins, de confrontar com a impotência do outro.
REFERÊNCIAS
FREUD, Sigmund. (1931). Sexualidade feminina. In: _____. O futuro de uma ilusão, o mal-estar na civilização e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1980. p. 257-279. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 21).
FREUD, Sigmund. (1932). Conferência XXXIII. Feminilidade. In: _____. Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1980. p.139-165. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 22).
LACAN, J. A metáfora paterna. In: O seminário, livro 5: as formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar, 1999, p. 166-184.
[i] Acadêmica do 10º período do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva
[ii] Professor supervisor de estágio do curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva