Antônio Carlos Canhestro [i]

 

O caso ilustrado trata da questão da timidez como uma das barreiras para o sucesso pessoal diante das dificuldades para a inserção social, fator complicador para se viver bem nos tempos atuais.

Convive-se diariamente com um universo de pessoas, que, em primeira instância, são estranhas ou distantes nas relações pessoais. Isso exige um esforço que varia de pessoa para pessoa para que a inércia da comunicação seja vencida.

Experiências que estabeleceram medo do fracasso na relação com o outro levam a comportamentos de esquiva. Esse comportamento é reforçado pela sensação da homeostase corporal diante da eliminação do risco, porém esse isolamento dificulta o progresso pessoal e acarreta sofrimento psíquico.

Essa constatação pode ser feita por meio do caso de Aurora (nome fictício), de 30 anos, que procurou a Clínica de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva, apresentando como demanda a questão da timidez. Apresentava dificuldades em progredir nas relações sociais, com reflexo no desenvolvimento intelectual e profissional.

A cliente relata seus problemas no ciclo familiar, nos relacionamentos de namoro, nos estudos e no trabalho. Aurora mora em Belo Horizonte, e seus pais em uma cidade do interior do estado. Descreve muitas dificuldades na relação com o pai, que é alcoólatra, com o irmão e com as irmãs. Foi responsável por cuidar dos mais novos, ainda por volta dos oito anos de idade, sendo cobrada com severidade pela mãe, que se ausentava para trabalhar. Já o pai a ignorava, e quando havia alguma manifestação, geralmente, o fazia de maneira agressiva.

A não aceitação da cliente em relação ao pai fazia com que ela evitasse uma aproximação maior, até mesmo com o restante da família, na qual o ambiente era sempre conflituoso. Esses conflitos acabavam por gerar um processo de afastamento ainda maior em resposta às condições aversivas desses encontros. Tal processo reduzia cada vez mais as condições de aproximação e, por conseqüência, provocava reflexos nos poucos relacionamentos de Aurora, uma vez que não era possível se aproximar do seu ciclo familiar. Essa situação também refletia no ambiente de trabalho e bloqueava seu retorno aos estudos.

Segundo Alberti e Emmons (1978), muitas pessoas passam a vida cheias de inibições, cedendo à vontade alheia, guardando seus desejos dentro de si, ou, ao contrário, destruindo os outros a fim de atingir seus objetivos, seu sentimento de autovalor está baixo.

Pesquisas demonstram que o aprendizado de respostas assertivas inibirá ou enfraquecerá a ansiedade previamente experimentada em relações interpessoais específicas. Quando a pessoa se torna capaz de afirmar-se e a fazer coisas por iniciativa própria, ela reduz apreciavelmente sua ansiedade ou tensão anterior em situações críticas e aumenta seu senso de valor como pessoa. Este mesmo senso de valor está geralmente ausente na pessoa agressiva, cuja agressividade pode mascarar sentimentos de culpa e de insegurança. (ALBERTI; EMMONS, 1978, p.18).

Para aplicação no processo terapêutico, tornou-se importante abordar questões relativas ao conteúdo. A agressão anti-social não se limita ao insulto verbal, ela está presente nos pequenos gestos e nas transgressões no cotidiano, conduzindo a situações cada vez mais difíceis de relacionamento.

Alberti e Emmons (1978) consideram que a pessoa não-assertiva tende a pensar na resposta apropriada depois que a oportunidade passou. A pessoa agressiva pode responder muito vigorosamente, causando uma forte impressão negativa e mais tarde arrepender-se disso.

Foram trabalhadas com Aurora questões sobre comportamentos agressivos, não-assertivos e assertivos. Foi proposto à cliente que considerasse as alternativas de comportamentos nas suas relações familiares, e qual ofereceria o resultado que pretendia, uma vez que trazia essas desavenças como uma queixa, desde o início do tratamento. Então, a partir daí passasse a observar e analisar o que tais comportamentos lhes trariam em termos de satisfação ou insatisfação, para si e para os demais.

Para Villani (2002), proporcionar melhoria na qualidade de vida do terapeutizando é objetivo primordial da prática terapêutica comportamentalista, para isso utiliza a Análise Funcional de Contingências. O cliente deverá aprender acerca das contingências de controle de seu comportamento. Esse tipo de terapia tem um caráter essencialmente educativo. 

Na sessão seguinte, Aurora traz questões relacionadas às desavenças com as irmãs, mencionando que, no final de semana, na casa dos pais, resolveu conversar com a irmã, com a qual havia se desentendido na semana anterior. Conta que refletiu e achou melhor tentar a reconciliação, o que foi aceito sem problema. Falaram sobre roupas e sobre a festa de casamento prevista para o sábado seguinte.

Assim a cliente escolhe como agir, experimentando um sentimento de auto-apreciação. Um sentimento positivo a respeito de si, a partir da emissão de um comportamento assertivo e a obtenção de uma resposta assertiva por parte da irmã.

Para Alberti e Emmons (1978), no comportamento assertivo, nenhuma pessoa é prejudicada e, a menos que os objetivos desejados sejam totalmente conflitantes, ambos podem se sair bem.

Na sessão após o sábado do evento previsto, a cliente diz ter sido uma das melhores festas que já presenciou, fazendo comentários para salientar a satisfação. Foi perguntado se ela fazia alguma ligação de ter obtido uma excelente festa, com o fato de ter reatado a relação com a irmã. Afirma que estava na companhia da irmã e que, sem dúvida, isso contribuiu muito para que se sentisse melhor em relação àquela experiência. Lembra da sessão anterior com relação a se comportar de modo assertivo e que se não tivesse se comportado assim, a festa poderia não ter tido o mesmo significado.

Diante do que foi relatado pela cliente nesta e nas sessões seguintes, foram feitas intervenções por meio de pontuações, buscando reforçar e aumentar o repertório de comportamentos assertivos.

No decorrer do processo terapêutico, a cliente demonstra significativo progresso. Retorna aos estudos, afirma uma maior disposição e facilidade para estar se relacionando com o pai, com as irmãs e com irmão. Convida o irmão para morar com ela, com uma proposta de ajuda mútua, com fins de estudos preparativos para concursos públicos. Matricula-se numa academia de dança, onde relata conseguir reconhecimento pelo êxito e isso a faz se sentir estimulada, passando a estabelecer como objetivo chegar à posição de instrutora.

Com o desdobramento desse propósito de tratar o comportamento da timidez por meio da conscientização de conceitos fundamentais básicos de assertividade, não assertividade e agressividade, buscou-se , na base teórica, fundamentos técnicos da teoria comportamental para aplicação da prática simples de estimular comportamentos assertivos.

Assim foi possível encontrar saídas para um contexto de um ambiente agressivo prevalente, gerador da (esquiva ou fuga) timidez, para um contexto socializável, o que possibilitou à cliente romper com esta barreira demandada no início do processo terapêutico.

 

REFERÊNCIAS

ALBERTI, Robert E.; EMMONS, Michael. L. Comportamento Assertivo: um guia de auto-expressão. Tradução de Jane Maria Correa. Belo Horizonte: Interlivros, 1978. 147 p.

 

VILLANI, Maria Cristina Seixas. Considerações sobre o desempenho do terapeuta comportamental. In: TEIXEIRA, A.M.S (Org). et al. Ciência do comportamento: conhecer e avançar. São Paulo: ESETec Editores Associados, 2002. cap. 4, p. 27-33.

 

NOTA DE RODAPÉ


[i] Aluno do curso de Psicologia do Centro universitário Newton Paiva do estágio supervisionado pela professora Maria Regina.

E1- 25 VENCENDO A TIMIDEZ

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